A mobilidade deve estar no centro do planejamento das cidades sustentáveis

No futuro, trabalho, lazer e moradia devem estar próximos, defende especialista

  • Foto do(a) author(a) Carol Aquino
  • Carol Aquino

Publicado em 4 de setembro de 2017 às 14:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Evandro Veiga/CORREIO

A cidade do futuro tem de ser mais compacta e os bairros precisam concentrar emprego, acesso à saúde e educação próximos às residências, evitando assim q ue os moradores façam grandes deslocamentos. Essa é a sugestão de Clarisse Linke para um porvir mais sustentável.

A diretora executiva do Instituto de Políticas de Transporte e Desenvolvimento, em sua palestra no seminário Cidades, do fórum Agenda Bahia 2017, defendeu que a solução para um trânsito melhor está em repensar os modais de transporte e também os modelos de cidade. 

"A cidade de fato está em poucas localidades. Esse é o cerne do problema da mobilidade", afirmou, referindo-se aos núcleos urbanos onde estão concentradas as oportunidades de educação e de saúde atualmente, bem como os investimentos públicos. 

Segundo Clarisse, o modelo de ocupação espraiada dos centros urbanos da América Latina, que estabelece as noções de centro e periferia, leva as pessoas a fazerem longas viagens. "Temos de questionar a forma como se provê acesso a essa cidade", pontuou. 

Ela também aponta o aumento do tempo diário das viagens e o prejuízo decorrente disso. Em Salvador, em 2004, 10% da população levava mais de uma hora no deslocamento até o trabalho. Em 2014, o  número cresceu para 16% dos soteropolitanos.

“As áreas mais distantes das cidades das regiões metropolitanas são onde a gente tem menos desenvolvimento urbano, consequentemente menos equipamentos, menos oportunidades, fazendo com que as pessoas precisem ir até os centros dos municípios”, cita a especialista. 

Ela lembra que nas linhas de discussões globais sobre mobilidade e planejamento urbano, se aponta a necessidade das cidades do futuro serem inclusivas, com discussões horizontalizadas, menos segregadas e desiguais.

Eixo central 

Segundo Clarisse, a solução é desenvolver a cidade ao longo das linhas de transporte e oferecer serviços, equipamentos de lazer e moradia a distâncias caminháveis. 

“O transporte é a coluna vertebral da cidade, como diz o Carlos Cadena Gaitán. A gente deveria promover desenvolvimento ao longo desse ativo. Por meio dele que acessamos as oportunidades e a busca por educação, saúde, serviços e desenvolvimento econômico”.

Outra urgência, diz a especialista, é abandonar o modelo do carro individual como objeto de desejo. Além de mudar o foco dos investimentos de trânsito e tráfego do transporte individual para o coletivo. “O espaço dedicado ao carro é muito maior do que aquele dedicado a todos os outros modais e usuários das vias. O nosso maior ativo é a rua, mas ela não é pensada para o pedestre, é feita para priorizar completamente o carro”. 

Ela cita que outras metrópoles mostram que é possível mudar essa ocupação, como Nova York e Buenos Aires, ou mesmo Salvador, que criou áreas de piso compartilhado no Rio Vermelho.

Clarisse Linke lembra que o futuro do planejamento urbano é priorizar os pedestres e que uma pergunta precisa ser feita na hora de projetar novos bairros: “Estamos criando lugares com oportunidades de emprego ou criando só um bairro dormitório?”.

Nesse sentido, Salvador caminha bem. A cidade está construindo o seu Plano de Mobilidade, realizou o Salvador 500 e a reforma do PDDU. Enquanto o primeiro planeja a cidade  até 2049, quando completará 500 anos de fundação, o segundo  propõe estimular a vocação da capítal para um desenvolvimento urbano e social mais sustentáveis.

A mudança talvez, não esteja só em olhar para o futuro, mas para o passado. A estrutura mais voltada para os pedestres está presente em várias áreas do centro histórico da capital baiana. Na opinião da especialista, a saída é a adaptação das estruturas já existentes, valorizando ativos e lhes dando novos usos, assim como foi feito com as cidades históricas europeias.  

“Inovar não é só tecnologia. É pensar a estrutura física e de serviços que temos e que novos usos podemos fazer deles. Entender que há benefícios econômicos para todos. Pensar numa escala de cidade que seja segura para todos”, resume.

O Fórum Agenda Bahia 2017 é uma realização do CORREIO, com apoio institucional da Prefeitura Municipal de Salvador (PMS), Federação das Indústrias da Bahia (Fieb) e Rede Bahia; patrocínio da Braskem, Coelba e Odebrecht; e apoio da Revita. 

Principais destaques da palestra

Carros. O modelo do carro individual não se sustenta mais, diz Clarisse Linke, para quem o transporte público precisa ser estimulado

Transporte ativo.  Planos de mobilidade devem incluir projetos para ciclistas e pedestres

Distâncias.  Os serviços, trabalho, lazer e educação precisam estar acessíveis próximos aos bairros

Tecnologia.  Para além dos aplicativos, as cidades do futuro devem incentivar a interação entre as pessoas e privilegiar o conforto e a segurança de seus moradores

Segurança.  Para Clarisse Linke, a rua segura não é aquela murada e com guaritas em cada esquina, mas a que tem movimento de pessoas

Educação.  “A cidade não pode ser inteligente se o cidadão não for inteligente. A Smart Citi do futuro precisa de um Smart Citizen”, afirma Linke.