Adeus a uma dama de fé

Familiares e amigos se unem na despedida para Dona Arlette Magalhães

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  • Alexandre Lyrio

Publicado em 7 de outubro de 2017 às 22:32

- Atualizado há um ano

. Crédito: Betto Jr//CORREIO

O neto, o tempo inteiro do lado do caixão, destacou. O filho, muito abalado, mas firme, mencionou. O político, visivelmente emocionado, exaltou. A funcionária de décadas, leve e até risonha, lembrou. A amiga da igreja, arrasada, não poderia esquecer. Todos, absolutamente todos, entre elogios, lembranças e saudades, apontaram uma característica que se destacava mais do que qualquer outra em Arlette Maron de Magalhães: a fé.

Neste sábado, 07, durante o velório, a missa e o sepultamento de seu corpo, no Campo Santo, nada ficou mais evidente nos depoimentos de familiares, amigos e admiradores que sua crença em Deus. Era nela que se apegava para realizar trabalhos sociais e enfrentar adversidades, como a morte de dois dos quatro filhos e do marido. Para além da elegância e da gentileza, Dona Arlette, viúva de Antonio Carlos Magalhães e ex-primeira-dama da Bahia, era uma dama de fé.

“Quem conhece nossa família sabe que minha avó foi um dos nossos esteios, ela sempre nos trouxe exemplos sobretudo de muita fé”, destacou o prefeito ACM Neto. Quantas vezes ela não entrou na Igreja da Vitória e saiu de lá revigorada por uma palavra do padre Gaspar Sadoc, amigo que faleceu em setembro do ano passado aos 100 anos? Os mesmos cânticos católicos que ela entoava nas missas foram ouvidos neste sábado em sua homenagem. Dona Arlette foi sepultada no mausoléu da família, no Campo Santo (Fotos: Betto Jr./CORREIO) “A fé dela era seu grande impulso, o grande motor na vida de Dona Arlette”, disse o arcebispo de Salvador e primaz do Brasil, dom Murilo Krieger. Vítima de AVC, Dona Arlette morreu, aos 86 anos, no dia de Nossa Senhora do Rosário, a quem dedicava orações com frequência. 

Sua fé não era só em Deus ou nos santos. Ela também acreditava profundamente na força da família e no poder da caridade. “O grande público não sabe, mas era uma pessoa preocupada com as comunidades, com os mais pobres e fazia caridade sem aparecer. Fazia o bem de forma absolutamente discreta”, disse o presidente da Rede Bahia,  Antonio Carlos Júnior, filho de Dona Arlette.

Tanto que, no velório, além da família, unida na dor, havia todo tipo de gente. Do comerciante Clarindo Silva ao ex-banqueiro Ângelo Calmon de Sá, passando pelo deputado federal Benito Gama e o ex-ministro Waldeck Ornelas. Mas havia também muitos desconhecidos. Pessoas que, em silêncio, Dona Arlette ajudou de alguma forma. Quando estava grávida, a funcionária pública Gleide Mamede encontrava sempre com ela nas missas na Vitória. 

Um belo dia, a servidora foi presenteada por ela com um enxoval completo. A partir de então, um grande laço de amizade se criou. “Muita simplicidade, bondade e fé. Enquanto minha própria mãe não aceitava minha gravidez, ela me acolheu”, lembra Gleide. Missa de corpo presente foi celebrada pelo arcebispo D. Murilo Krieger Cuidadora 

De repente, uma mulher com dificuldade de locomoção surgiu na porta da capela do Campo Santo. Com a ajuda de um andador, a aposentada Lucia de Oliveira Souza, 95 anos, se aproximou vagarosamente do caixão. A família inteira fez questão de cumprimentá-la. Quem seria essa mulher simples que despertou a atenção de todos?

Quase dez anos mais velha que Dona Arlette, Lucia contou que trabalhou por décadas cuidando das roupas dela e do marido ACM . Na verdade, cuidou da menina Arlette antes mesmo de ela se casar. “Era como uma filha para mim. Quando eu cheguei tinha 15 anos. Cuidei dela e depois de todos aí”, contou.      

Primeira-dama 

Enquanto o caixão carregado pelos netos e o filho era levado para o mausoléu da família Magalhães, políticos que tinham proximidade com a família destacaram, além da fé e da caridade, traços da Arlette primeira-dama. “Participou da vida de um homem que teve tanto poder durante décadas e, no entanto, ninguém nunca viu uma circunstância em que tivesse alterado a sua forma de ser e de tratar as pessoas”, elogiou o ex-governador Paulo Souto, secretário municipal da Fazenda. “Ela soube exatamente qual era o seu papel dentro do contexto da família e da política”, completou.  Os filhos e netos de Dona Arlette prestaram suas últimas homenagens à matriarca “Era um ponto de referência familiar, mas ultrapassou o recinto de casa e passou a ser respeitada pela sociedade baiana. Uma perda das mais sentidas ultimamente”, observou o ex-prefeito de Salvador Manoel Castro. “Uma grande figura. Não só como dona de casa e mãe de família, mas como primeira-dama que foi por três vezes. Trabalhou muito pelos menos favorecidos. Lembro que ela marcou época entre as Voluntárias Sociais”, disse o ex-governador César Borges.

“Além de uma grande mãe, Dona Arlette teve um papel fundamental para a sociedade”, disse o presidente da Assembleia Legislativa, deputado Ângelo Coronel. O próprio ACM Neto lembrou da importância da avó nas campanhas políticas. 

“Interessante que, apesar de ser uma pessoa discreta, ainda assim ela acompanhava tudo, opinava, fazia as críticas dela. Pedia voto da forma dela, com as cartinhas que escrevia aos amigos”, lembrou o prefeito. Em nota, o governador Rui Costa prestou solidariedade nas redes sociais. “Meus sentimentos aos familiares e amigos. Que Deus conforte o coração de todos”. 

Além de Antonio Carlos Júnior e do prefeito ACM Neto, estiveram presentes no adeus a Dona Arlette a filha Tereza Mata Pires, os netos Luís Eduardo Magalhães Filho, Paula e Carol Magalhães, Renata Correia, Caio Mata Pires, Fernanda Morari e Cesar Mata Pires Filho e bisnetos, todos bastante emocionados - assim como a multidão de anônimos que lotou o Campo Santo para se despedir da mão amiga com quem sempre contaram nas horas mais difíceis.