Receba por email.
Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Novo livro sobre o cantor e compositor humaniza o ídolo ao explorar a sua complexidade
Hagamenon Brito
Publicado em 19 de agosto de 2017 às 06:30
- Atualizado há um ano
As eternas dúvidas de personalidade. Levamos uma vida a ser quem os outros querem que sejamos, ou melhor, o que os outros pensam que somos. Acontece que na vida dos pobres mortais amanhã é outro dia e a vida, com todas as suas contas a pagar, afetos e contradições de mesas de bar e, agora, redes sociais, continua a nos chamar.
Bem diferente e infinitamente mais complexa é a situação de um mega star como o cantor e compositor inglês Paul McCartney, 75 anos, uma das maiores referências da música e da cultura popular desde os tempos dos Beatles, nos anos 1960. E aí chovem linhas, promovem-se mentiras e contam-se histórias nem sempre confortáveis - e isso muito antes do surgimento da internet.
A tênue linha de (des)entendimento de Paul e John Lennon, por exemplo, nos foi revelada, também, pela mão do grande e premiado jornalista Philip Norman, 74, no livro Shout! The Beatles in Their Generation, em 1981. Episódio importante para entender melhor Paul McCartney - A Biografia (Cia das Letras | R$ 89,90/papel | R$ 44,90/e-book | 824 páginas).
[[galeria]]
Redenção do autor
Inédito até hoje no mercado editorial brasileiro, Shout! começava - talvez seja melhor dizer dava continuidade - a essa luta de intelectos e personalidades que sempre dividiram os Beatles, entre Paul e John.
Na biografia sobre a banda, um passional Philip Norman descrevia os Beatles como resultado da genialidade musical de Lennon (“John Lennon era três quartos dos Beatles”), enquanto McCartney era considerado o homem das circunstâncias, pseudo porta-voz dos Beatles, mas que não passava de uma estrela pop de talento razoável.
Tais afirmações não caíram bem a McCartney, claro, numa digestão que se adivinharia adversa a qualquer mortal. Por isso, o próprio Norman, autor de livros também sobre John Lennon, Rolling Stones, Mick Jagger e Elton John, ficou surpreso quando pediu a McCartney autorização para escreveu a sua biografia e este não lhe esticou o dedo do meio.
Daí a achar que Sir James Paul McCartney - que faz show dia 20 de outubro, na Arena Fonte Nova -, iria estender a mão, esperar que Philip Norman apertasse o play do gravador e lhe contasse a vida toda vai uma distância. Seria bom-mocismo demais, convenhamos.
O que o músico fez foi autorizar e não colaborar diretamente, ou seja, o escritor teve que recorrer a amigos e familiares do biografado para recolher testemunhos.
Em certa medida, Paul McCartney - A Biografia é uma espécie de redenção de Norman, onde ele aponta o espelho para um homem maior, cujo caráter mediano, sempre seguro em seus atos e com “talento pop razoável”, são coisas do passado, equívocos do próprio autor. McCartney agora aparece em toda a sua plenitude e complexidade - de artista de enorme talento musical a homem de família e empresário, com a dor de aguentar a morte da mãe enquanto jovem, superada por um pai que o atirou para o mundo onde, afinal, se revelaria dono e senhor.
Também se aborda a quase morte de Paul na África, os nove dias de prisão em Tóquio, em 1980, por porte de maconha (com medo de ser estuprado, ele cantava seus hits para ganhar a amizade dos outros presos) e a complicada relação com Lennon.
Maconha e avareza
A humanização do biografado é uma das maiores qualidades da obra. Tido como um eterno bom-moço, Paul é tão fascinante quanto complexo e Norman aborda os traços fortes de autoritarismo e autopromoção na personalidade do artista, bem como o sexismo dos Beatles e a avareza do mais célebre dos seus sobrevivente. Fã de maconha, Paul fumou até depois dos 60 anos (Foto:Divulgação) Se é verdade que ele e Yoko Ono até hoje se detestam, mais curioso é saber que Paul fumou maconha diariamente até depois dos 60 anos. Parou para não dar mau exemplo à filha pequena, Beatrice, hoje com 13 anos. E saber também que a união de três décadas com Linda (1941-1998), sua mulher mais famosa, não era um mar de rosas como se imaginava. Paul, por exemplo, interrompeu um projeto de autobiografia de Linda com o argumento de que na família só existia uma estrela: ele. Foi mesquinho, no mínimo.
Mas, como diria o filósolo alemão Friedrich Nietzsche, tudo é humano, demasiadamente humano. Paul McCartney, senhores, merece todo o respeito e admiração. Capa da nova biografia de Paul FICHA
Livro: Paul McCartney - A Biografia
Autor: Philip Norman
Tradução: Claudio Carina e Rogério W. Galindo
Editora: Cia das Letras
Preço: R$ 89,90/papel e R$ 44,90/e-book (824 páginas)
Trajetória solo de Paul reafirmou sua excelência
No livro Paul McCartney - A Biografia, o Philip Norman conta que o músico foi tomado por uma grande insegurança nos anos seguintes à separação dos Beatles, chegando mesmo a ficar depressivo. Nessa fase, em que contou com o apoio fundamental da esposa e companheira da banda Wings, Linda, ele acreditava que não conseguiria fazer sucesso sem John Lennon, Ringo Starr e George Harrison. Logo, ao estrear solo, ele veria que estava errado, algo que o tempo, os fãs e a crítica reforçariam diante da qualidade pop de canções como Another Day, My Love, Jet, Live and Let Die, Mrs. Vandebilt e Let’em In. Todas elas presentes na ótima coletânea Pure McCartney, de 2016, com 67 canções da carreira do ex-Beatle desde seu álbum de estreia solo, editado em 1970, e escolhidas pessoalmente por ele. “Surgiu a ideia, minha e da minha equipe, de reunir uma coleção das minhas gravações tendo somente em mente ter algo divertido para escutar”, disse o cantor sobre este projeto. Entraram também gravações recentes de Paul, Save Us, do ótimo álbum New, de 2013; o remix de 2015 de Say Say Say (sua parceria com Michael Jackson); e Hope for the Future, de 2014, incluída no videogame Destiny. “Fico satisfeito, e frequentemente me surpreendo, que tenha me envolvido na composição e gravação de tantas canções, cada uma delas tão diferentes das outras”, acrescentou McCartney após analisar seu repertório. Juntando Beatles e sua carreira solo, estima-se que Paul já vendeu 700 milhões de álbuns.