Cadê o laudo? Um ano após acidente no Centro de Convenções, perícia não foi divulgada

CORREIO procurou diversas pastas do governo do estado, mas não recebeu respostas

Publicado em 22 de setembro de 2017 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Marina Silva/Arquivo CORREIO

Amanhã faz um ano do desabamento parcial do Centro de Convenções da Bahia (CCB), ocorrido no dia 23 de setembro de 2016, mas o laudo técnico, que analisa a causa do acidente e a situação da estrutura do equipamento, ainda não foi divulgado. Sequer sabe-se o resultado do inquérito policial aberto na 9ª Delegacia (Boca do Rio).

O laudo feito pelo Departamento de Polícia Técnica (DPT) no mesmo mês do acidente só ficou pronto oito meses depois, em maio deste ano. O prazo seria de 10 dias, prorrogáveis por mais 30 repetidas vezes. Segundo o órgão, a demora na conclusão se deu porque havia risco para a equipe de peritos.

Pelo caminho legal, o laudo é encaminhado para a delegacia, que tem o prazo de 30 dias, podendo ser prorrogado outras vezes pelo mesmo período, para concluir o inquérito. E é aí que a resposta para o que provocou o acidente vira um mistério: não há informações sobre o que o laudo técnico indicou para a delegada responsável, muito menos se os responsáveis  foram ouvidos e se houve uma conclusão para o caso.

O CORREIO procurou por dois dias a delegada responsável pelo inquérito, que não atendeu à reportagem, assim como a Polícia Civil, que encaminhou a demanda à Secretaria da Segurança Pública (SSP-BA) e a repassou para a Secretaria de Comunicação (Secom), que não respondeu aos pedidos de informação.

13 anos sem reparos Diante da negativa de acesso dos órgãos do governo do estado ao laudo técnico do acidente, o CORREIO entrou em contato com o engenheiro responsável pelo projeto original do Centro de Convenções, da década de 1970, Carlos Strauch.

Ele acompanhou os peritos do DPT que trabalharam na produção do laudo e afirmou que a causa do acidente foi falta de manutenção. “O laudo diz o que eu já tinha apontado para o governo: a causa do acidente foi falta de manutenção. Foram 13 anos em que o Centro de Convenções não recebia reparos na estrutura. Eles só faziam intervenções no aparelho de apoio”, disse Strauch.

O engenheiro ainda ressaltou que ele e os peritos do DPT flagraram que a peça que quebrou – o tirante – diminuiu de tamanho em 70% por conta da falta de manutenção. “Eu subi com o perito nas plataformas, medimos o tirante e tinha apenas 3mm de tirante, enquanto o normal é 10mm. Não tem condições de um tirante de 3mm suportar aquela estrutura”, explicou.

O engenheiro também defende que o prédio do Centro de Convenções ainda pode ser utilizado, caso uma manutenção seja realizada. “É claro que dá para utilizar. Precisa-se fazer a manutenção no resto do prédio e construir uma nova estrutura na parte que houve o desabamento”, defendeu Strauch, que ressalta que ainda há risco do prédio desabar.

Sem notícias Apesar do que diz o engenheiro responsável pelo projeto, nem mesmo o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia da Bahia (Crea-BA) e o Instituto de Arquitetos do Brasil – Bahia (IAB-BA) conhecem o conteúdo do laudo oficial. Não há obrigatoriedade de que as duas entidades sejam comunicadas sobre o resultado, mas, ainda assim, o próprio Crea solicitou que o governo emitisse um laudo.

O coordenador da Câmara de Engenharia Civil do Crea-BA, Leonel Borba, atesta que também não teve contato com o laudo: “Nós fizemos um relatório próprio em outubro em que percebemos que a causa do acidente foi falta de manutenção. O que houve foi um rompimento do tirante, que estava enferrujado e, no momento da troca, acabou caindo. Como a peça era grande e sustentava outras vigas, uma peça foi puxando a outra”.

Na época do desabamento, o CORREIO noticiou que a empresa Metro Engenharia e Consultoria realizava reparos na estrutura do CCB de forma irregular, sem autorização da Secretaria Municipal de Urbanismo (Sucom), o que foi levantado como um dos fatores responsáveis pelo desabamento.

Justiça do Trabalho  Se na área cível e criminal nada se sabe, o assunto tem andado na Justiça do Trabalho, por conta de uma dívida trabalhista de R$ 50 milhões da Bahiatursa, empresa pública que administrava o Centro de Convenções e era ligada ao governo do estado, pela Setur.

No último dia 6, uma audiência foi realizada pela 34ª Vara do Trabalho de Salvador, responsável por determinar a penhora do imóvel e por suspender obras no local em novembro de 2016. Com isso, o leilão do atual terreno, anunciado pelo governo do estado, não pode acontecer.

Como resultado, a audiência abriu a possibilidade de o governo poder voltar a realizar obras de reparo na estrutura. O perito nomeado para verificar se manter o imóvel sem obras poderia comprometer a estrutura ou se havia risco de desabamento, Helder Araújo Andrade, pediu destituição do caso.

Ele afirmou que buscou contratar um especialista na área de estruturas metálicas, alicerce utilizado no Centro de Convenções, para que o profissional acompanhasse a perícia e emitisse um parecer específico, e não conseguiu.

“Há uma necessidade de um acompanhamento de um especialista na área de estruturas metálicas para que este, em sua especialidade, realize as devidas análises e cálculos estruturais para melhor conclusão e auxílio do Juízo e resolução da problemática”, disse.

Na audiência, realizada pela juíza Ana Paola Santos Machado Diniz e com representantes da Secretaria de Administração do Estado (Saeb) e do procurador do Estado Frederico Augusto Valverde Oliveira, foi indicado que o engenheiro civil Luiz Alberto Nolasco e os arquitetos Fernando Faria de Almeida e Abel Travassos assumam a perícia. Os dois primeiros trabalharam na Bahiatursa.

Os indicados têm até hoje para analisar a documentação apresentada pelo Estado, que sustenta que o CCB deve passar por obras. A audiência também determinou que o CCB fosse vistoriado na última segunda (18) pelos assistentes técnicos da obra, além do superintendente de patrimônio da Saeb, José Anísio Leal Costa, e pelo especialista em obras públicas e fiscal de obras Rafael Cerqueira de Oliveira.

O laudo validando – ou não – as providências sugeridas pelo Estado será apresentado até 28/9. As partes têm até 6/10 para se manifestar. As obras poderão voltar, caso o laudo esteja de acordo com as providências sugeridas pelo Estado. Enquanto não se decide o destino do CCB, a comunidade faz, no próximo domingo, um ‘abraçaço’ no local, às 9h.

Ministério Público apura se houve omissão do poder público Além da Justiça do Trabalho, outra entidade jurídica também está de olho no caso do Centro de Convenções da Bahia. O Ministério Público do Estado (MP-BA), através do Grupo de Atuação Especial de Defesa do Patrimônio Público e da Moralidade Administrativa (Gepam), está apurando o acidente que completa um ano amanhã.

Segundo informou o MP-BA, por meio da assessoria de comunicação, um procedimento foi instaurado para apurar se houve ação ou omissão do poder público que tenha contribuído para ocasionar o desabamento no equipamento, que aconteceu no dia 23 de setembro do ano passado.

“O procedimento encontra-se em fase avançada, aguardando a conclusão das perícias realizadas pela Central de Apoio Técnico (Ceat) do MP-BA para sua finalização”, explica o MP-BA, em nota enviada ao CORREIO.

O que diz cada um?Secretaria de Administração do Estado (Saeb) Foi contatada três vezes na terça-feira (19) e uma na quarta (20), quando encaminhou a reportagem à Secom.

Secretaria de Comunicação do Estado (Secom) Foi contatada na terça (19), quarta (20) e ontem, entre tentativas por telefone, app de mensagens e e-mail, sem respostas

Secretaria da Segurança Pública (SSP-BA) Procurada na terça-feira (19)  sobre o laudo, respondeu na quarta (20), que procurasse a Secom

Departamento de Polícia Técnica (DPT) Informou na terça (19) que o laudo havia sido enviado em maio para a 9ª Delegacia (Boca do Rio) e que não podia ser disponibilzado

Polícia Civil Foi procurada para dar informações sobre o laudo, mas recomendou que procurasse a SSP-BA

9ª Delegacia A delegada adjunta Ana Francisca informou que não estava com o processo e a titular, Rogéria Araújo, não estava no local. Procurada por telefone, Rogéria não atendeu

Tribunal Regional do Trabalho (TRT5) A 34ª Vara falou sobre o leilão, mas não tinha informações sobre o laudo