Lívia Natália celebra amor negro em Dia Bonito Pra Chover

Lançamento do quarto livro de poesias da escritora baiana acontece hoje (19), no Espaço Cultural da Barroquinha

Publicado em 19 de setembro de 2017 às 06:00

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Dia bonito pra chover. É como se diz em alguns lugares do Nordeste, onde há seca, quando o dia está muito bonito. “Pra ele ficar mais bonito, só se chovesse”, diz a escritora baiana Lívia Natália, 38 anos, explicando a metáfora que inspira seu quarto livro de poesias, Dia Bonito Pra Chover, lançado hoje, às 17h, em evento gratuito no Espaço Cultural da Barroquinha. A ambiguidade, o transbordamento e a tensão presentes nessa imagem, segundo a autora, caracterizam também o amor negro, tema presente nos cerca de 40 poemas da obra.

 “Comecei a escrever o livro há três anos, a partir de vivências e pensamentos sobre afetividade de mulheres e homens negros. Há muitas pesquisas na área acadêmica sobre a solidão da mulher negra, mas há muitos homens negros que não conseguem expressar afeto, que acham que isso é bobagem, que ‘é coisa de mulher’. Existe aí uma situação sobre a qual precisamos pensar e falar, porque isso também dá conta da nossa humanidade”, argumenta a escritora, que também é professora e pesquisadora da Ufba e tem um poema na antologia É Agora Como Nunca, organizada por Adriana Calcanhotto. (Foto: Priscila Fulo/ Divulgação) Para ela, defender esse ponto de vista é também militar. “A gente luta contra o genocídio do povo negro, mas muitas vezes nos tornamos corpos assassináveis, descartáveis justamente por não pensarmos essas subjetividades. Precisamos sublinhar o afeto, o modo como nos posicionamos nas nossas famílias, como nos relacionamos com nossos parceiros. Isso nos humaniza. O que o racismo faz é nos desumanizar em todos os âmbitos”, completa.Escuta

Dia Bonito Pra Chover pode ser encarado como resultado de uma busca de Lívia Natália pelo amadurecimento da própria vida afetiva. “A gente costuma ouvir que a vida é uma só e que, por isso, vai fazer isso ou aquilo. Se a vida é uma só, viva bem, de maneira firme, responsável com o afeto do outro, que também tem uma vida só pra viver”, pontua.

A autora ressalta que, apesar do livro se concentrar numa experiência afetiva heterossexual afrocentrada, a identificação com o que é dito  pode acontecer com qualquer um. “Sou uma mulher negra, então tudo que escrevo vai passar por esse lugar, mas minha escrita é universal. É arte, e arte não manda recado para ninguém específico”, diz. Muito do que Lívia escreve passa também pelo lugar de escuta atenta que faz questão de se colocar: “Eu sempre me pergunto sobre essa história da sororidade, sobre como a gente pode criar vínculos e cultivar uma escuta efetiva para os nossos”. Foi pensando nisso que em abril ela topou o convite da atriz e jornalista baiana Mônica Santana para participar do projeto artístico Cartografando Afetos, que acabou rendendo um documentário e um espetáculo que  deu voz às diferentes reflexões, intimidades e questionamentos sobre a afetividade da mulher negra.

“Mônica é minha leitora e achou que a gente podia construir esse trabalho juntas. Sueide Kintê, que também participou desse projeto, é parceira de muitos anos e conduz o projeto Mais Amor Entre Nós. É ela quem assina a orelha do livro”, conta Lívia, ao lembrar que ela, Sueide e a pesquisadora Carla Akotirene vão conduzir um bate-papo com o público presente no evento de hoje, na Barroquinha. “Vai ser a noite de lançamento do meu livro, mas chamei dezenas de pessoas para dividir esse espaço comigo”, diz. Celebração

O lançamento, que acontece até as 21h, contará ainda com outros dois momentos: um sarau com direção de Jorge Washington, no qual poemas do livro serão recitados por nomes como Dão Anderson, Vera Lopes, Wesley Correia e Mônica Santana; e um baile com a DJ Nai Sena, que encerrá a noite. “O Baile Black Love é o momento que estou muito sinceramente querendo. Quem não namora vai sair de lá com pelo menos um beijo dado, pelo menos de mãos dadas”, brinca, ao confessar rindo que espera que não chova.

Outro “bom problema”, segundo ela, é que durante o lançamento só estarão à venda exemplares de Dia Bonito Pra Chover. Seus outros três títulos estão esgotados, mesmo após as reimpressões recentes.