Marisa Monte era apenas uma coadjuvante no show de Paulinho da Viola

Por Roberto Midlej

Publicado em 23 de outubro de 2017 às 12:25

- Atualizado há um ano

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Sim, vou bancar o chato da segunda-feira. Há cerca de seis meses fui a um show de Paulinho da Viola na Concha Acústica, que tinha, no máximo, 60% dos lugares ocupados. E o show foi uma delícia, com pessoas que estavam ali para o que me parecia óbvio: ouvir música, que é o que se propõe num espetáculo daquele tipo.

Diante daquela ocupação modesta, confesso que fiquei surpreso quando soube que os ingressos se esgotaram em dois dias para o show de ontem, no mesmo lugar. Desconfiei que era, claro, por causa de Marisa Monte, que tem apelo popular. Resultado: a impressão que tive é de que havia ontem na Concha um bando de gente mal informada que não sabia que o espetáculo era pra ser uma veneração ao samba e ao maior representante vivo deste gênero, Paulinho da Viola, sem dúvida um dos dez maiores compositores de nossa história.

E mais: Marisa Monte ali era ali apenas uma coadjuvante, uma convidada de nosso mestre, como a própria cantora fez questão de dizer e agradecer por isso. E adivinha só: o público estava claramente deslocado, achando que ia ali pra ouvir Bem que Se Quis e os sucessos radiofônicos (e sem sal) dos Tribalistas.

Durante o show, especialmente nas conversas entre os dois artistas - que eram um momento enriquecedor, para contar a história do samba, da Portela e de seus compositores - , a horda aproveitava para tirar selfies e botar o papo em dia ou pra levantar e comprar uma cervejinha. E ninguém conseguia ouvir bate papo entre Paulinho e Marisa. Na hora de Carnavália, dos Tribalistas (aquela do refrãozinho sem graça "Sinto a batucada se aproximar / Estou ensaiado para te tocar"...), veio a prova de que o que o público ali queria era um show pop/dançante, ao contrário do que se propunha.

Em tempo: show de samba, ao contrário do que possa parecer, não significa necessariamente que você tem que se levantar pra sambar e cantar com o artista, mas como aqui na Bahia tudo tem que virar festa e Carnaval... Ao meu lado, mais uma dessas que estava perdidinha perguntava, em tom de queixa: "Ah, e Marisa Monte não vai ter um momento só dela não, é?". Não, meu amor, se você tivesse ao menos lido o que estava no ingresso, veria que o nome do espetáculo era "Paulinho da Viola encontra Marisa Monte".

Ou dava um Google, antes de sair de casa e ia ver o que era o show. As estrelas ali deveriam ser Paulinho e o samba. Conclusão: uma experiência frustrante para os fãs do músico e da música, que merecíamos um espaço digno para aquele espetáculo. Salvador precisa urgentemente de um lugar fechado alternativo ao TCA, onde caibam 2,5 mil a 3 mil pessoas e que receba espetáculos como esse, já que, para se comportar de uma forma minimamente educada, a nossa plateia precisa de regras rígidas como a do TCA. (Foto: Mauro Ferreira/Reprodução) Ah, e essa foto não é minha, pois eu estava mais interessado em aproveitar o show que em fotografá-lo. (Foto: Mauro Ferreira, no espetáculo de maio, em São Paulo. Mauro também, com certeza, estava mais interessado em aproveitar o momento, mas precisou tirar umas fotos porque estava a trabalho)

Texto originalmente publicado no Facebook