Moral de jegue

Malu Fontes é jornalista e professora de jornalismo da Facom/UFBA

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Publicado em 30 de outubro de 2017 às 07:52

- Atualizado há um ano

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Uma onda avassaladora de obscurantismo, conservadorismo e censura ancorada numa moral de jegue, como se diz aqui na Bahia, vem chegando como um tsunami sobre o Brasil. É incrível que justamente em um momento em que as denúncias sobre o comportamento político das alas mais conservadoras da República gritam sem que os protagonistas demonstrem nenhum pudor, justamente eles, os conservadores, venham adotando uma estratégia que a turba ignara não se dê conta ou finja que não.   Não importa que o presidente da República, com uma rejeição popular que beira os 100%, não tenha absolutamente nenhuma vergonha de propor e ninar as causas mais esdrúxulas, como proteger quem se favorece do trabalho escravo, defender derrubada de florestas virgens e comprar deputados para derrubar denúncias contra ele. Os segmentos políticos e ideológicos que apoiam tudo isso e ficam entoando um corinho de que o presidente é frágil, mas o importante é aprovar as reformas e ver que a economia tá reagindo, são os mesmos que apostam na incapacidade crítica e na moral de jegue já citada acima para construir todos os dias uma cortina de fumaça.   PORNÔ - As cortinas que inventam são usadas para enfiar a situação política do país para baixo do tapete enquanto conclamam seus semelhantes de neurônios mineralizados para xingar Caetano, Gil, as artes plásticas e intelectuais dos quais nunca leram uma letra escrita ou falada. A cada cortina, e elas são muitas, produzidas em série e no ritmo de, no mínimo, uma por dia, vemos esses insetos morais fantasiados de cuidadores da moral alheia.   Posando de defensores de uns tais valores familiares que nem eles mesmos adotam, esses obscurantistas empunham como se fosse uma bandeira vanguardista uma pauta agora quase que exclusivamente voltada para a censura às artes, mesmo que essa matilha nada saiba de produção ou consumo de arte. Se um tipo como Alexandre Frota, que fracassou até mesmo como ator pornô, é um dos baluartes desse movimento censor, é mesmo preciso que se diga mais algo contra essa turma?   BEATO SALU - O que leva uma sigla medonha, nascida aparentemente dos instintos sexuais e nazifascistas reprimidos de um bando de moleques, a propor à justiça brasileira que não sejam punidos com zero os candidatos que, na redação do ENEM, se manifestem contra os direitos humanos? Os anencéfalos que sobreviveram ao parto e chegaram à vida adulta para criar essas siglas que convencem até padarias a colocar seu nome em eventos onde eles defendem suas sandices, acham que o termo direitos humanos é um adjetivo que atende pelo apelido de esquerdopata. Não é não, quelônios bípedes propositadamente desinformados.   Direitos Humanos são conquistas da humanidade, construídas para além das fronteiras paulistanas, sustentáculos da ONU, sigla e entidade que vocês ou desconhecem ou têm como meta dissolver. A quem e por que interessa permitir que um sujeito qualquer possa se sentir livre e à vontade para ser nazista, racista e preconceituoso numa redação oficial e ter nota por isso? Isso protege quem e do quê? Um religioso local com mandato, perto de quem o Beato Salu de uma novela brasileira antiga merece uma cadeira na Academia Brasileira de Letras, ameaçou essa semana jogar sangue num espaço cultural de Salvador caso fosse encenada lá uma peça cujo roteiro se sustenta no pedido de uma transexual para que seja vista com o amor que os cristãos tanto pregam em nome de Jesus.   A turba está organizada e tem sempre um juiz de plantão para chamar de seu e atender às suas demandas instintivas reprimidas. E cadê os parlamentares de ideias oxigenadas da Bahia? O diabo que habita todas as frases dos pastores comeu a língua de vossas excelências? Se sim, retirem suas candidaturas em 2018 que eu quero passar com quem me representa. Vão rezar e larguem o osso.