Nocaute no preconceito

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  • Da Redação

Publicado em 19 de outubro de 2017 às 11:22

- Atualizado há um ano

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Macho, porradeiro e multicampeão. Acelino Freitas, ou simplesmente Popó, ganhou a vida e o mundo distribuindo murros. Fazendo jus à famosa “mão de pedra”,  nunca teve dó de quem ousou desafiá-lo. Metia a mão pesada com força e determinação até ver o oponente beijar a lona. Não raro, desacordado, tonto ou sangrando da boca ao supercílio. Ou ambos.

A cena seguinte temos registrada na memória. Locutor eufórico e Popó de braços erguidos, riso solto e a mistura de suor e lágrimas escorrendo pela face do baiano bom de briga. Num universo 100% machista, a nobre arte é, por vezes, violenta, às vezes fatal, muitas vezes responsável por sequelas irreversíveis. Talvez por força desse tempero viril, desse espírito selvagem que acomete o boxer dentro do ringue, nunca esperamos nada além de medalhas, cinturões e nocautes dos heróis que vestem luvas.

Mas não raro eles nos surpreendem com atitudes de verdadeiros multicampeões. Foi assim com Muhammad Ali, que se negou a lutar numa guerra burra, infame, sem lógica e genocida como foi o Vietnã; foi assim com George Foreman que, já veterano, retornou várias vezes ao ringue para promover a paz, o amor e as ações de caridade desenvolvidas pela instituição religiosa onde congrega. Agora foi a vez de Popó, o filho do seu Babinha, dar exemplo de homem, de ídolo, de pai de família e, mais importante, de cidadão.

No momento em que moralistas de cueca invadem exposições de arte para promover um espetáculo dantesco de baixaria e preconceito, surge Acelino Popó Freitas para nocautear o mal que vive impregnado da mais pura ignorância. Com um direto no queixo dos conservadores de plantão, Popó deu a cara a tapa (sic) ao tornar pública a orientação sexual de seu filho adolescente que, tão corajoso, altivo e homem como o pai, revelou ser homossexual.

Popó, agora ainda mais ídolo, foi ainda mais longe. Além de acolher o rebento com amor, carinho,  compreensão e respeito, em diversas oportunidades ocupou as janelas midiáticas para incitar os pais de outros adolescentes a abraçarem seus filhos gays, lutarem por seus direitos e defendê-los em todas e quaisquer circunstâncias. 

Mas o maior boxer brasileiro de todos os tempos não parou por aí. Decidiu que vai fazer a terceira despedida da carreira de atleta com um objetivo muito claro e singelo: homenagear o filho gay. Para não deixar dúvidas, vai trocar socos ao som de Pablo Vitar.

Isto sim é atitude de homem macho. Isso sim é ter aquilo roxo. Quantos outros pais  não estariam desesperados, amargurados e esparramados num divã, simplesmente porque filhos e filhas optaram pela felicidade? E é chocante que em pleno século 21 ainda existam pessoas incomodadas com o prazer alheio. Pra mim é medo de contaminação. Sim, felicidade contamina.

Voltando a Popó, lembro que o conheci quando era apresentador de esportes da TV Educativa. Seu irmão, Luís Cláudio Freitas, era assíduo frequentador das resenhas esportivas, afinal era atleta olímpico do Brasil e, evidentemente, a maior inspiração do irmão mais novo que, tímido e calado, assistia as entrevistas ao vivo sentado no carpete do estúdio.

Por isso mesmo tive o prazer e o privilégio de conhecer o casebre mais que modesto na Baixa de Quintas e de fazer a primeira entrevista de Popó (então apenas uma promessa) para a televisão. Conheci a família toda antes da fama e testemunhei a dureza daqueles que literalmente dão murros e socos para sobreviver.

Quase 20  anos depois, é gratificante ver a ascensão não do atleta e boxeador incontestável, mas do pai de família que enfrenta tudo e todos pelo amor aos filhos. Se você não concorda, tá brabinho e acha que Popó merece um corretivo, não perca tempo: seja macho e faça o desafio. Se ele aceitar, eu pago ingresso pra ver Popó desmanchar seu preconceito. Oscar Paris é jornalista