O Carnaval ainda pulsa

Igor Leonardo é jornalista, idealizador do blog de viagens Pé na Rota

  • D
  • Da Redação

Publicado em 21 de fevereiro de 2018 às 02:06

- Atualizado há um ano

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Passada uma semana do fim do Carnaval de Salvador, ainda podemos ver, nas redes sociais, aqueles que defendem a tese da decadência da festa. Discordo. Primeiro, porque os argumentos são sempre enfatizando a qualidade das músicas, fator muito subjetivo. Bunda, bumbum, mão aqui e outra ali, além de outros termos do gênero, sempre foram utilizados na música baiana, principalmente no pagodão, e tocadas no Carnaval.

O segundo argumento utilizado é a necessidade de reinvenção da festa. Concordo em parte, porque o enfraquecimento do Carnaval de Salvador se deu por diversos fatores: a desunião de artistas e empresários da axé music, a elitização de alguns blocos e a intervenção do poder público em questões que não deveria são alguns dos exemplos.

Porém, esse processo de retomada do Carnaval das antigas, com todo aquele prestígio frente às outras capitais, tem sido paulatino, como deve ser, com a reinvenção do “carnaval pipoca”, com a volta da utilização de fantasias e, também, pela democratização da festa, abrindo espaço para grandes atrações tocando em trios independentes, com a exclusão das cordas.

Outro argumento muito falho: a “fuga” da classe média da cidade. Ora, isso sempre aconteceu e tem ocorrido ainda mais porque essa classe tem perdido espaço para o folião pipoca e, como disse o professor e cientista social Leonardo Nascimento, em uma matéria no jornal Correio*, “as elites lidam com o espaço público de uma maneira diferente (do restante da população), em Salvador. Elas têm medo do espaço público, e não ocupam, porque o local delas é o privado”. E o espaço privado está ficando cada vez mais escasso no Carnaval de Salvador.

Acredito ainda na pulsação do Carnaval de Salvador, como folião observador durante os seis dias oficiais da festa, pelo simples fato de que os empresários que enxergam crise como oportunidade estão investindo em nichos como os LGBT – o esgotamento dos abadás de blocos para o público gay é prova disso – além do investimento em espaços que, historicamente, foram das classes média e alta e, agora, estão sendo ocupados pelos foliões de classes mais baixas, como no caso de um camarote aberto ao público patrocinado por uma cervejaria, lançado este ano.

E o Carnaval de Salvador sempre foi isso: a nítida separação de classes sociais, seja entre os blocos e a pipoca, os camarotes e os blocos, os camarotes mais “VIPs” e os “menos VIPs” e por aí vai, situação que não cabe mais em pleno 2018, século XXI, no qual o empoderar-se de ideias, costumes, identidades e espaços está cada vez mais em evidência, em que o espaço público passa a ser visto pela maioria da população como lugar pertencente a todos, e não somente a alguns privilegiados.

 Igor Leonardo é jornalista, idealizador do blog de viagens Pé na Rota e folião pipoca de carteirinha