O Carnaval está apenas começando

Fernando Guerreiro é  presidente da Fundação Gregório  de Mattos (FGM)

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  • Fernando Guerreiro

Publicado em 14 de fevereiro de 2018 às 09:25

- Atualizado há um ano

Apesar do coro insistente das trombetas da miséria de plantão, o Carnaval de nossa cidade está longe de um esgotamento e de um fim do túnel. Entendam de uma vez: esta festa se renova automaticamente, passando rasteiras monumentais nos teóricos de plantão que insistem em esgotamento de modelos, formatos, e não entendem que o momento agora não é de um modelo e sim da convivência de vários, numa diversidade jamais vista nesta festa. Tem camarote, tem bloco de corda, tem bloco sem corda, tem axé, tem pagode, tem sertanejo, tem bloco afro, tem patricinha, tem mauricinho, tem gay, tem enrustido, tem careta. O que vossa excelência quiser acha , nesta festa babilônica e maternal, que abraça e absorve tudo que aparecer pela frente. Senão vejamos:

“Os gays tomaram conta da festa” – Claro que não. Paranoia dos caretas e seres humanos carentes. O negócio é que a galera está ocupando cada vez mais espaços, sem medo de ser feliz  e de mostrar suas paixões em público. Esperto quem entendeu isso e está trabalhando com esse mercado promissor. A quinta da Barra está dominada e algumas cantoras se reinventaram a partir desse público. Vamos deixar de cheiro mole e deixar a galera se beijar à vontade.

“O Axé acabou” – Outra besteira sem tamanho. A moda e o monopólio acabaram, mas as pérolas do gênero continuam a balançar o esqueleto de milhares de foliões. Bell saiu do Chiclete e reconstruiu sua carreira a partir de seus clássicos do ritmo e continua eletrizando multidões. Luiz Caldas voltou e seus sucessos continuam imbatíveis. O Axé virou um clássico.“Não tem espaço para o folião pipoca” – Onde, em que Carnaval? Nunca se viu tanto artista tocando free para a galera. De Moraes, passando por Armandinho, Baby do Brasil, Daniela, Claudia, Leo Santana e o pioneiro Saulo, tá todo mundo de corda arriada. Só não vai atrás quem já morreu.

“O Carnaval de outros lugares é melhor” – É para rir? Estava em São Paulo, uma folia tomando espaço, mas boba, boba. Rio, o Carnaval do tiroteio, Minas, sem comentários, e quem quiser ouvir os frevos de Olinda pela milésima vez, desculpem o trocadilho, boa viagem! Nosso Carnaval é o melhor do mundo, não adianta chorar. “A melhor música de Carnaval é.....” Claro que essa história já deu o que tinha que dar. Quem está preocupado com isso, além de artistas com ego nas alturas e carentes de aprovação eterna. O folião quer se divertir com o que aparecer e essa conversa enche o saco de todo mundo. Cansei de zaap de artista me pedindo voto. Vão procurar o que fazer!

Claro que muita coisa pode melhorar, como por exemplo o falatório dos artistas no meio dos desfiles, as coberturas bobas e baba ovo de algumas emissoras, o esgotamento de alguns circuitos, a ausência sistemática de decoração nas ruas, a péssima qualidade de som de alguns trios, o pouco apelo visual dos blocos e por aí vai. Nada que derrube o brilho desta orgia antropofágica que está sempre, apenas começando. Duvidam? Esperem o ano que vem pra ver!

Um adendo: Daniela Mercury continua sendo a “artista” mais completa do Carnaval. Criativa, repertório impecável, se relacionando com outras artes, uma obcecada pelo trabalho. Palmas sinceras do artista Fernando Guerreiro. Sempre!