Professora da Ufba ameaçada de morte presta queixa na PF

Inquérito será aberto para investigar as agressões e identificar os autores do crime

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  • Thais Borges

Publicado em 24 de novembro de 2017 às 02:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Evandro Veiga/CORREIO

A situação da professora ameaçada de morte por conta de uma pesquisa na Universidade Federal da Bahia (Ufba) virou caso de polícia. A vítima procurou a superintendência da Polícia Federal em Salvador, na tarde desta quinta-feira (23), e prestou queixa sobre os ataques. Um dos investigadores da PF confirmou o registro e disse que o boletim de ocorrência será encaminhado para o setor jurídico da instituição.

Caso seja comprovado que as ameaças sofridas pela docente foram em função do cargo de servidora, um inquérito será aberto pela PF para investigar as agressões e identificar os autores do crime.

O artigo 147 do Código Penal estabelece que ameaçar alguém através de palavras, forma escrita ou em gestos é considerado crime contra a liberdade, punido com detenção, de um a seis meses, ou multa. No caso de a ação se dar pela internet, é importante fazer um print da ameaça com a URL, e guardar o dia e horário em que o fato aconteceu. Segurança no campus de São Lázaro precisou ser reforçada (Foto: Evandro Veiga/ CORREIO) Ataques Tudo começou com um pedido de entrevista. Não é nada incomum na rotina das pesquisadoras do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (Neim), da Ufba, que frequentemente são requisitadas pela imprensa. Vez ou outra, na condição de especialistas em temas como gênero e sexualidade, são convidadas a participar de reportagens.

Mas, ao participar de um programa de televisão em outubro deste ano, uma professora do grupo não imaginava que sua rotina fosse mudar – e não de uma forma positiva. Feminista e pesquisadora de gênero, ela despertou a ira de grupos conservadores e radicais depois que apareceu na tela.

Passou, então, a receber mensagens de ódio e a ser ameaçada de morte pelo teor de sua pesquisa – a divisão sexual do trabalho. Na semana passada, deu aulas com segurança reforçada no campus de São Lázaro, na Federação, onde leciona. A também professora Maíra Kubík Mano, uma das 15 pesquisadoras do Neim, grupo do qual a vítima faz parte, contou que as agressões começaram pela internet.

“Há mais de um mês essas ameaças foram feitas. Começaram via rede social e, nos últimos dez dias, a universidade foi notificada dessas ameaças. A professora Maria Hilda Baqueiro Paraíso, diretora da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, propôs uma nota ao Consuni (Conselho Universitário), e isso veio a público”, explicou.

Desde aquela época, a vítima entrou no radar de portais religiosos conservadores. Expressões como “propaganda ideológica” surgiram em meio a dezenas de ofensas. Em seguida, as redes sociais da pesquisadora começaram a ser atacadas diretamente. Para completar, a profissional foi exposta em fóruns de discussão, onde recebeu mais ataques.

A decisão de procurar a Polícia Federal foi tomada pela professora e outros pesquisadores durante reunião com a Coordenação de Gestão de Segurança da Ufba (Coseg), nesta quinta.

O CORREIO não conseguiu contato com o Coseg até a publicação desta reportagem. Procurado, o Ministério Público Federal (MPF) informou que ainda não há nenhum inquérito em andamento sobre o caso. Manifestação em apoio aos pesquisadores ameaçados (Foto: Evandro Veiga/ CORREIO) Outros casos Pelo menos outros três casos de perseguição a pesquisadores foram registrados na Ufba. Outros dois professores e uma aluna do mestrado, que defendeu uma dissertação sobre gênero e sexualidade na educação infantil, também viraram alvos de ameaças.

Em uma postagem em sua página pessoal no Facebook, a mestranda explicou que informou sobre as agressões ao orientador da pesquisa, que tomou as providências junto ao programa de mestrado, “para que tudo ocorresse com tranquilidade”, disse. Funcionou – mesmo com tanta intimidação, os agressores não apareceram na data da apresentação, que aconteceu no início deste mês, no campus de Ondina.

Mas, mesmo após a defesa, as ameaças continuaram. Segundo ela, eram tanto pessoais quanto para atividades na Ufba, mas, até então, nenhuma se concretizou.“A ameaça por si só é uma violência, como se não bastasse a ansiedade pelo rito de passagem, passei 5 dias sem dormir pensando no que poderia acontecer caso fossem cumprir suas promessas. Pensando se era seguro levar minha filha e meu filho na minha apresentação”, escreveu.Através da assessoria, o reitor da Ufba, João Carlos Salles, manteve o posicionamento da carta divulgada pelo Consuni na segunda (20), na qual repudiou os ataques. Na quarta (22), professores e estudantes se reuniram no campus da Federação e fizeram um ato em apoio aos pesquisadores ameaçados.