Proibição da publicidade infantil pode gerar economia de R$76 bi

Estudo da The Economist mostra que esse resultado seria alcançado logo nos primeiros 15 anos da proibição

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  • Murilo Gitel

Publicado em 12 de outubro de 2017 às 06:21

- Atualizado há um ano

. Crédito: Ekaterine Karageorgiadis, coordenadora do Criança e Consumo (foto: divulgação)

Um estudo da The Economist Intelligence Unit, que apresenta os custos e benefícios do fim da publicidade para crianças no Brasil, revela que em dois possíveis cenários, a proibição da publicidade infantil traria benefícios decorrentes de uma população mais saudável, física e psicologicamente com resultados econômicos positivos que variam entre R$ 61 e R$ 76 bilhões, logo nos primeiros 15 anos da proibição.

Divulgado em agosto, o levantamento observa que na hipótese de a publicidade ser direcionada ao público adulto, as receitas do mercado publicitário seriam compensadas em no máximo 15 anos, como reflexo da adaptação do setor, resultando em uma economia mais produtiva e um ambiente mais sustentável.

“O estudo traz uma mensagem muito forte, e vale pensar naqueles benefícios que não foram monetizados”, destaca Vanessa Nadalin, economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). “O relatório encontra respaldo quando diz que no Brasil a gente já proíbe a publicidade voltada ao público infantil, mas isso na prática não acontece”, aponta Isabella Henriques, diretora de Advocacy do Instituto Alana, organização da sociedade civil organização da sociedade civil que luta pelos direitos da criança.

Falar de sustentabilidade com os filhos passa, necessariamente, pelas questões do consumo, um desafio gigantesco quando se leva em conta a presença da publicidade dirigida a crianças, seja por meio da TV, dos shoppings e da internet, apenas para citar alguns exemplos.

Compreensão

O designer gráfico Herbert Souza, 27 anos, conta que o enteado Arthur, 4, passou a pedir a compra de um brinquedo depois de assistir a propaganda do personagem em um canal de desenho animado. “Pedia, insistentemente, o dinossauro que aparecia. Bastava apertar um botão que ele falava”, relembra. “Em vez de comprar mais, estimulo ele a brincar ao ar livre, visitar parques, jogar futebol. Mostro que já tem muitos brinquedos. Ele reclama um pouco, mas compreende”, completa Souza.

Segundo Yves de La Taille, professor de psicologia da Universidade de São Paulo, dos seis aos oito anos a criança não distingue a publicidade de conteúdo de programação. Dos oito aos 12 não entende o caráter persuasivo da publicidade. “Até 12 anos, as crianças não estão em condições de enfrentar com igualdade de força a pressão exercida pela publicidade”, conclui o pesquisador.

Uma análise de comerciais de alimentos na televisão a cabo direcionados às crianças no Brasil, realizada em julho de 2015 pelo Centro Universitário São Camilo e pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, mediu o conteúdo das propagandas tomando como base a resolução do CONANDA. O estudo observou que a maioria das peças (64%) usava linguagem e personagens infantis, 43% usavam músicas cantadas por vozes infantis e mais de 20% vinculavam a compra de alimentos ao recebimento de brindes.

Consequências

No Brasil, a publicidade dirigida às crianças (menores de 12 anos) é ilegal de acordo com a Constituição, o Código de Defesa do Consumidor, o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Resolução 163/2014 do CONANDA — Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, um órgão vinculado à Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente do Ministério de Direitos Humanos, que estabelece que toda comunicação mercadológica, inclusive publicidade, às crianças menores de 12 anos é abusiva.

Segundo informações do programa Criança e Consumo, do Instituto Alana, entre as principais consequências que esse tipo de apelo pode ocasionar estão a formação de valores materialistas, distância em relação a natureza e obesidade e sobrepeso. “É um caso de saúde pública também, uma vez que 15% das crianças brasileiras sofrem com obesidade e 30% com sobrepeso. Muito do que elas consomem é proveniente de publicidade dirigida ao público infantil”, alerta Ekaterine Karageorgiadis, coordenadora do Criança e Consumo.

Ekaterine admite a complexidade que é abordar esse tema com as crianças, uma vez que que elas são assoladas diariamente por uma “enxurrada de publicidade” que chega através da TV, internet e até mesmo de espaços públicos que elas frequentam. “Os pais podem explicar aos filhos que os produtos têm um determinado ciclo, demandam recursos naturais finitos e que o consumo precisa ser consciente”, sugere a especialista.

Denúncias

No site do programa Criança e Consumo (criancaeconsumo.org.br) é possível que qualquer pessoa denuncie casos de comunicação mercadológica que estimule o consumismo infantil ou viole a integridade, dignidade e os direitos e garantias das crianças brasileiras.

As denúncias são analisadas pela equipe do programa Criança e Consumo, cuja uma das frentes de atuação é jurídica. Posteriormente são encaminhadas aos órgãos jurídicos competentes, como Ministério Público e Procon. “Os cidadãos também podem denunciar de forma independente, bem como cobrar das empresas infratoras”, observa Ekaterine.