Que clarão foi esse? Cientistas buscam explicações para mistério no céu da Bahia

Meteoro ou lixo espacial são teorias

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  • Mario Bitencourt

Publicado em 22 de fevereiro de 2018 às 08:02

- Atualizado há um ano

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Que clarão foi esse? A resposta à pergunta sobre a bola de fogo vista na noite de terça-feira (20) por milhares de baianos, flagrada por câmeras e mostrada em vídeos diversos publicados nas redes sociais da internet tem razão lógica com probabilidade de quase 100% de certeza. A discussão que dominou rodas de conversa e as redes sociais da internet, gerando memes, inclusive, era se o fenômeno era um meteoro ou um lixo espacial oriundo de um foguete russo. As duas hipóteses não foram descartadas por astrônomos consultados pelo CORREIO.

O caso causou mais comoção popular nas imediações da praia de Guarajuba, em Monte Gordo, povoado de Camaçari. Por lá foi ouvido um grande estrondo, e moradores encontraram uma peça que acham ser lixo espacial.

Avaliada de forma breve no Instituto de Geofísica da Universidade Federal da Bahia (UFBA), a peça foi classificada como de metal e de fabricação humana. “Não posso afirmar se é lixo espacial”, disse a pesquisadora que avaliou o objeto, Débora Rios, especializada em meteoros. 

“Ficaram de trazer a peça em outro momento para que possamos fazer uma avaliação mais minuciosa”, completou a pesquisadora do Instituto de Geofísica.

Meteoros, segundo astronômonos consultados pelo CORREIO, são rochas que estão vagando pelo espaço e às vezes cruzam o caminho da Terra, queimando na atmosfera.

Quando isso acontece, a rocha espacial produz um brilho intenso e é chamada de meteoro. Quando a rocha ainda não entrou na Terra, o nome dado é meteoroide e passa a ser chamada de meteorito em contato com a superfície da Terra.  Alta luminosidade A explicação quase certeira de que o objeto que cruzou o céu da Bahia foi um meteoro é do astrônomo carioca Marcelo de Cicco, membro da Sociedade Brasileira de Astronomia e coordenador do projeto EXOSS, que colabora no Brasil com a Nasa – a agência espacial dos Estados Unidos – no monitoramento de meteoros. Morador da Rua Guajirus mostra suposto meteoro (Foto: Raquel Lima/Reprodução) “Todo o lixo espacial é rastreado por agências espaciais. De 10 cm em diante elas são detectadas e os dias certos e o local provável onde vão cair são informados. Não havia previsão de queda de lixo espacial para os dias 20 e 21. Então, foi um meteoro”, disse.

Para ser mais específico, o pesquisador explica que o fenômeno visto em várias cidades da Bahia foi a queda de um bólido, meteoro de alta luminosidade, com cerca de 500 gramas de peso, e que explodiu no mar devido à energia cinética, gerada no próprio objeto por conta da velocidade. O clarão da explosão assustou muita gente.

“Não posso precisar a velocidade com que ele chegou a terra, mas podemos afirmar que foi de milhares de quilômetros por hora. Ele entrou na atmosfera [camada de ar que envolve a Terra] no mesmo sentido de rotação do planeta. É como jogar uma pedra em um veículo em movimento, em que a velocidade da pedra dentro do veículo é bem maior”, explicou o pesquisador.

Apesar do susto, não há com o que se preocupar. “Fenômenos como este ocorrem diariamente, e uns são mais notados que os outros. Não podemos nos prevenir nem com o lixo espacial, pois o local onde eles caem não é algo de 100% certeza que será o previsto”, declarou.

Dentre as hipóteses levantadas ontem para o fenômeno por astrônomos profissionais e amadores entrevistados pelo CORREIO, surgiu a de que a bola de fogo seria um lixo espacial de um foguete russo, mas “esse lixo espacial caiu no dia 16 de fevereiro, no Canadá. E o outro lixo espacial, do dia 17, de um foguete americano, caiu na África”, informou De Cicco.  Desconfiado Os registros de quedas de lixo espacial já ocorridas e outras que vão ocorrer podem ser vistas no site americano Satview, que reúne informações de agências espaciais de todo o mundo.

Mas há astrônomos, como Marildo Geraldête Pereira, que não confiam 100% na eficácia do rastreamento do lixo espacial. Sobre o fato de ontem, contudo, o pesquisador acredita que foi um meteoro.

Doutor em astrofísica pelo Instituo Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e professor de Física da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Pereira comentou que “parte  do  lixo espacial não  é mapeado”, e lembrou que “outro dia um astrônomo amador achou um satélite americano perdido a mais de 10 anos”.

A descoberta do satélite perdido foi divulgado no início deste mês pela própria Nasa, que ao avaliar uma das imagens enviadas pelo CORREIO sobre o fenômeno de anteontem comentou que “parece uma bola de fogo, mas não temos câmeras fora dos EUA. Então, não podemos confirmar de qualquer maneira”.

Astrônomo amador, Fernando Munareto, que é estudioso do assunto, foi um dos que viram o clarão provocado pelo objeto voador. Ele mora no bairro de Costa Azul, em Salvador.

“O clarão tinha cor meio amarelada com laranja. Isso indica uma composição química que dá a impressão que era o resto de um foguete. Mas pode ser meteoro”, disse.

No Brasil não há órgão oficial que monitore a vinda de objetos vindos em direção a Terra. A Agência Espacial Brasileira, a Força Aérea e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) informaram não ter detectado o fenômeno.  Surfista voador A Rede Brasileira de Monitoramento de Meteoros (Bramon), organização aberta e colaborativa mantida por pesquisadores em astronomia, divulgou em sua rede imagens do fenômeno e afirmou que era um “meteoro de alto brilho”, que cruzou o céu da Bahia às 22h27. As câmeras que capturaram as imagens estavam em Camaçari e Conceição do Coité.

“O meteoro visto em Salvador, toda a costa leste além de Sergipe, entrou na atmosfera terrestre no sentido nordeste para sudeste e explodiu sobre o Oceano Atlântico, a 83 Km da Praia de Guarajuba e aproximadamente 29 Km de altitude”, afirma a Bramon. O astrônomo José Carlos Santos, coordenador do clube de astronomia do Observatório Antares, de Feira de Santana, também acredita ser um meteoro o fenômeno. Ele viu o clarão e o comparou a um “surfista voador”.

“As chances de ser um meteoro são de 90%. Estimo que ele tenha vindo a 8.000 km por hora, caído de uma altitude de 64 mil km, em comparação com outros fenômenos parecidos, que ocorrem todos os dias. A diferença é que uns chamam mais a atenção do que outros”, comentou o astrônomo.

O último registro de meteorito na Bahia foi na zona rural de Palmas do Monte Alto (Sudoeste do Estado), em 26 de maio de 2017. O objeto de quase um quilo, 9 cm de comprimento e 5 cm de altura foi encontrado por uma dona de casa que queimou a mão ao tocá-lo.

O mais famoso caso relacionado ao assunto no Brasil é o meteorito de Bendegó, encontrado no sertão da Bahia em 1784, na zona rural da cidade de Monte Santo. Ele pesa 5.260 quilos e está em exposição no Museu Nacional da Quinta da Boa Vista (Rio de Janeiro), desde 1888.

Outros casos Bendegó (1784)  Primeiro registro de meteorito encontrado na Bahia, com 5,3 toneladas e ainda é o maior do Brasil. Está exposto desde 1888 no Museu Nacional, no Rio de Janeiro  Palmas de Monte Alto (1954)  A primeira pessoa que o avistou foi um trabalhador rural, entre as décadas de 1940 e 1950. Sua composição é basicamente ferro e ele pesa 150 kg  Quijingue (1984) O meteorito de 59 kg é do tipo mais raro já registrado, o palasito. Também chamado de meteorito misto, é composto de cristais e aço  Vitória da Conquista (2007)  Esse meteorito tem 10,5 kg, 25 cm de comprimento e composição de ferro. A peça pode ser vista na Uesb  Palmas do Monte Alto (2017)   O corpo celeste de 950 g foi encontrado na zona rural em que o outro corpo já havia sido achado.  Esse meteorito ainda está sob análise