Seis moradores de área quilombola morrem em chacina na Chapada Diamantina

Uma das linhas de investigação é de envolvimento das vítimas com o tráfico de drogas

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  • Mario Bitencourt

Publicado em 8 de agosto de 2017 às 15:45

- Atualizado há um ano

Seis moradores de uma área remanescente de quilombo foram assassinados a tiros na zona rural de Lençóis, na Chapada Diamantina. O crime ocorreu na noite do último domingo (6), no Território Quilombola de Iúna, cujo processo de regularização fundiária foi iniciado em 2010 pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

As vítimas moravam em duas casas vizinhas e foram mortas dentro dos imóveis - quatro em uma casa e dois em outra - por homens que estavam em um veículo preto não identificado.

Suspeita de tráfico A Polícia Civil de Lençóis informou que cada vítima recebeu de quatro a cinco tiros. Ninguém foi preso. A polícia trabalha com a hipótese de os crimes estarem relacionados ao tráfico de drogas - duas vítimas tinham passagem por tráfico.

Foram mortos Adeilton Brito de Souza, Gildásio Bispo das Neves, Amauri Pereira Silva, Valdir Pereira Silva, Marcos Pereira Silva e Cosme Rosário da Conceição. Os corpos foram sepultados na tarde desta segunda (7) e na manhã desta terça (8).

Procurada pelo CORREIO, a Secretaria da Segurança Pública (SSP-BA) informou que o caso está sendo investigado por dois departamentos: o de Polícia do Interior (Depin) e o de Repressão e Combate ao Crime Organizado (Draco). Ainda de acordo com a pasta, uma das linhas de investigação é o envolvimento das vítimas e dos autores com o tráfico de drogas. 

Disputas por terras Um representante da Ouvidoria Regional Agrária do Incra estará em Lençóis na próxima segunda-feira (14) para acompanhar as investigações e verificar se as vítimas foram mortos por conta de disputas de terras. Caso essa hipótese seja confirmada, seriam oito moradores de áreas quilombolas mortos na Bahia, em menos de um mês, em regiões de disputas de terras.

Segundo a polícia, fazendeiros da região querem expulsar os quilombolas do território e impedir que o Incra dê continuidade à regularização fundiária.

Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), um dos passos iniciais para a regularização, “encontra-se pronto e será apresentado ao Comitê de Decisão Regional da instituição”, informou o Incra. Atualmente, o Território Quilombola de Iúna abriga 1.400 habitantes e 39 famílias, segundo o Incra. A área é de 1,4 mil hectares.

A Comissão Pastoral da Terra (CPT), ligada à Igreja Católica, e a Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais (ARTT) informaram que estão acompanhando as investigações sobre os crimes com representantes em Lençóis e manifestaram solidariedade às famílias dos mortos.

O Incra declarou que “solidariza-se com a comunidade Iúna e com as famílias das vítimas, os trabalhadores rurais quilombolas. A notícia chocou a autarquia”.

Há 303 processos de regularização de territórios quilombolas em aberto na Bahia, sendo que 34 estão publicados (em fase avançada de regularização). No estado, ainda não há nenhum território com título.

No relatório sobre os conflitos no campo 2016, divulgado este ano pela CPT, foram identificados 19 territórios quilombolas na Bahia em disputa de terras com terceiros. 

Violência No dia 16 de julho, no mesmo território quilombola em Lençóis, Lindomar Fernandes Martins, 35, foi morto com seis tiros por homens que invadiram a casa dele. Até o momento, também não houve prisão por esse crime.

Também em julho, no dia 17, outro morador de área remanescente de quilombo, José Raimundo Mota de Souza Junior, 38, foi morto com dez tiros. O crime ocorreu no Território Quilombola Jiboia, zona rural de Antonio Gonçalves, Centro-norte baiano. Lá, vivem 2.016 habitantes e 224 famílias.

No momento do crime, ele estava trabalhando numa roça da família junto com um irmão, que foi poupado pelos quatro homens, que chegaram num veículo preto não identificado e já desceram atirando.

De acordo com o Incra, o RTID do Território Quilombola Jiboia já foi publicado, e os proprietários dos imóveis rurais inseridos no perímetro, notificados. Atualmente, transcorre o prazo de 90 dias em que cabe a contestação por parte dos proprietários sobre o relatório.