Ter ou não ter?

Por Aninha Franco

  • D
  • Da Redação

Publicado em 18 de novembro de 2017 às 01:37

- Atualizado há um ano

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Qual é a maior questão  do Brasil, a corrupção ou a mentira? A Colônia foi iniciada pelas duas, com um “descobrimento” que não houve, e com um caso de corrupção – soltura de um parente que estava preso – na carta de Pero Vaz de Caminha. Quinhentos e dezessete anos pós achamento, 418 anos pós europeização, as duas, mentira e corrupção, mandam no país. Mas não só nele.

Estou viajando pela Rússia nos 100 anos de sua Revolução através dos livros. Uma viagem riquíssima. Jamais conseguiria entender numa turnê o que aconteceu nos últimos 100 anos na Rússia, como entendi nA Revolução Russa, de Sheila Fitzpatrick. Jamais conseguiria alcançar o caminho da Perestroica passeando em Moscou, como estou compreendendo nO Fim do Homem Soviético, de Svetlana Aleksiévitch. Nos Anos 1930, o objetivo maior da Revolução Russa, a Igualdade, já estava destruída pelo Partido Comunista que impôs aos russos “Membros da elite [que] podiam usar lojas não abertas ao público em geral, comprar mercadorias não acessíveis a outros consumidores e tirar férias em resorts especiais e em datchas bem equipadas.” (Sheila Fitzpatrick, 2017). Protegida pela cortina de ferro, a Revolução Russa mentiu ao Planeta dos Anos 1930 aos Anos 1990. 

Quando li a notícia da morte do artista Frans Krajcberg (1921.2017), que escolheu a Bahia como morada, e doou ao Estado sua obra, lembrei a quantidades de fotos, matérias, filmes com que a doação publicizou o ex-governador Jaques Wagner e seu ex-secretário de Cultura, Marcio Meirelles, que não fizeram nada para resolver uma questão tão proveitosa para o Estado. E me pergunto, agora, aqui, como está o acervo de Glauber Rocha, esse artista que todo e qualquer artista brasileiro diz que ama, mas que nenhum protege. 

A corrupção e a mentira se instalaram no Brasil com sua europeização? Talvez. Os americanos, chamados de índios porque os portugueses achavam que estavam na Índia, não eram patrimonialistas. Nossos antepassados tupis não entendiam por que os brancos queriam ter mais do que uma machadinha ou um espelho, por isso foi impossível fazer escambo com eles. Eles cortavam uma árvore e ganhavam um machado, que era um bem de valor inestimável no Brasil seiscentista. Mas eles não precisavam nem queriam ter outro machado se derrubassem outra árvore. Para que duas machadinhas? 

Escravizados para trabalhar, morreram em massa resistindo ao branco patrimonialista que venceu e empesteou o país de patrimonialismo. Poucos brasileiros querem ser. Brasileiros em geral querem ter. Ter casas em Miami, iates, sítios em Atibaia. E mentem e corrompem para Ter e, finalmente, Tendo, existirem. Os sobreviventes de Arembepe querem Ter, os tropicalistas não se amarram em dinheiro, mas Ter é uma coisa boa, o movimento negro reclama que não Tem  enquanto jovens negros morrem sem parar nas periferias. Ter ou não ter é a questão de Lula, o garoto propaganda do PT, encarregado de aliciar miseráveis que querem ter para a causa, para que a causa produza milhões para seus lideres. Ter foi a questão de Marcelo Odebrecht que já tinha tanto que quis ter tudo. E de Joesley & Wesley que transformaram Ter numa obsessão cafona. E como no Brasil Ter ou não Ter é a única questão, Ser tornou-se precioso.