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Nelson Cadena: a Festa do Cachimbo

  • D
  • Da Redação

Publicado em 21 de novembro de 2014 às 03:32

 - Atualizado há 2 anos

 Os baianos comemoram com festa e o caruru de praxe, se mantida a tradição, na próxima segunda feira, São Nicodemus, o santo protetor dos portuários. Festa popular, realizada ininterruptamente desde 1942, hoje menos divulgada pela mídia, mas que continua a ser relevante para os trabalhadores do Porto de Salvador e suas famílias, e também para os funcionários em função administrativa da Codeba, além dos moradores do entorno. A Festa de São Nicodemus do Cachimbo nasceu por obra do acaso, tudo indica que na data aqui referida, numa circunstância que envolve a imagem do santo ou um boneco representativo e nasceu sem nenhum vínculo com irmandades religiosas ou com a Igreja Católica. Salvo a celebração de uma missa pontual na Igreja de Santa Luzia, há quem diga que essa primeira missa foi celebrada na Igreja da Conceição. Três versões se contam acerca das origens da festa que teve no folclorista Antônio Monteiro o seu grande incentivador, autor do registro fotográfico mais antigo conhecido do evento, um flagrante datado de 1945, onde se vê um grupo de senhoras carregando o andor do santo em meio a um grupo de 50 pessoas, se muito. É uma foto reveladora: todo mundo muito bem vestido, os estivadores de paletó branco e gravata, chapéu e sapatos lustrados, as mulheres vestindo também branco, a maioria; no fundo se vê a fumaceira característica do local, naquele tempo ainda existiam navios a vapor. Monteiro foi quem propagou a festa e as suas versões, e obteve o seu reconhecimento como Folclore Nascente no I Congresso Brasileiro de Folclore, realizado em 1951. As versões em torno da origem da festa convergem em torno de alguns personagens: Cirilo, Vivaldo, Dona Cotinha, Tertuliano dos Santos. Aos dois primeiros se atribui a descoberta de uma imagem do santo no Cais do Carvão, identificada por um santeiro do Taboão como Nicodemus, a  descoberta foi interpretada pelos estivadores e carvoeiros como um aviso para se cumprir uma obrigação.

Vivaldo entra na história na versão de Tertuliano dos Santos, que em entrevista à Tribuna da Bahia em 23/11/74 atribuiu a este a confecção de um boneco e para si mesmo a paternidade do nome, São Nicodemus, desqualificando Cirilo: “O sonho dele não existiu, é conversa fiada”. Para Monteiro, Cirilo, de fato, foi o mentor da coisa, através de uma brincadeira de cachaça. Teria ele moldado um boneco que chamou de Nicodemus e, após um sonho revelador, onde aparecia um homem de barba e careca, portando um cajado, convenceu-se de que era a vontade do santo: que todo ano se celebra uma festa na sua intenção. Versão confirmada na década de 70 por Erelmito Cézar da Silva, diretor da escola de samba Juventude do Garcia que, inclusive, revelou o nome completo do carvoeiro: Cirilo Manoel dos Reis, “um mulato forte”. Faz sentido, pois, segundo outros depoimentos, Cirilo costumava fumar um cachimbo que lhe tinha sido ofertado por uma firma inglesa. Daí o imaginário que prevalece até hoje de São Nicodemus do Cachimbo. A festa ganhou força, paradoxalmente, durante a ditadura militar, quando, a pretexto de ajudar com recursos, os militares estabeleceram um certo controle sobre o evento, limitou-se a 1.500 pessoas o público, por razões de segurança nacional e, em contrapartida pelo apoio, tinha sempre uma gracinha e um louva-deus para os coronéis do Porto. Em 1982, com a construção da capela de São Nicodemus, dentro do próprio cais, o percurso da procissão, que antes ocorria em toda a área do comércio, ficou restrito ao Porto. Então já era festa popular de fato, com exibições de capoeira, Filhos de Ghandy puxando o cortejo, regata de saveiros, corrida rústica realizada desde 1977 e um tradicionalíssimo caruru de santo como convém.

* Nelson Cadena é publicitário e jornalista, escreve às sextas-feiras