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Da Redação
Publicado em 22 de setembro de 2018 às 05:00
- Atualizado há um ano
“Ô, cruzeirense, toma cuidado, o Bolsonaro vai matar viado (sic)”.
Este cântico – se é que isso pode se chamar de cântico – foi entoado por torcedores do Atlético-MG (não todos, é bom registrar) durante o clássico contra o Cruzeiro, domingo passado, no Mineirão.
A criação de rima tão cretina parte da “premissa de arquibancada” – na falta de termo mais explicativo - de que os torcedores do Cruzeiro seriam homossexuais, as “Marias”, como chamam atleticanos.
Logo no domingo, começou a circular nas redes sociais um vídeo do momento em que tal poesia é gritada. As pessoas filmam, riem e rodam as camisas, achando o máximo dizer pra todo mundo que “o Bolsonaro vai matar viado”.
Qualquer esporte – e, no Brasil, o futebol em especial – se desenvolve também como um dos braços da expressão identitária de quem o vivencia coletivamente. O esporte, vemos todos os dias, reflete algo da sociedade e, em via de mão dupla, faz-se refletir também nela.
Que ninguém se engane: está seriamente doente uma sociedade em que, no que deveria ser um grito de incentivo ao desempenho esportivo de qualquer time, ouve-se a exaltação do assassinato de gays.
O candidato à Presidência Jair Bolsonaro já deixou claro incontáveis vezes seu desprezo por pessoas diferentes dele, seja no que diz respeito à cor, ao gênero, ao estrato social ou à opção sexual. Não foi ele quem criou o tal cântico (também vale registrar), mas o triste eco da arquibancada do Mineirão é mais uma prova de como o discurso raivoso vai se espalhando feito impinge.
Quando este grito começou a ganhar as redes e sites noticiosos, logo apareceram comentários como os que defendem que “num estádio vale tudo” e que aquilo seria “bobagem”, pois - pela premissa de arquibancada - os cruzeirenses sempre foram as “Marias” e a “provocação” faz parte do futebol. “Não pode nem mais brincar?”, alguém questionou.
Pois então veja só com o que estamos “brincando”: um numeroso grupo de torcedores usa o nome de um postulante à Presidência da República para anunciar que, ora bolas, tal postulante vai matar homossexuais.
Mesmo torcendo para que tudo não saia do campo fantasioso, é triste ver que, no Brasil de agora, onde se mata uma pessoa gay ou trans a cada 20 horas pelo simples fato de ser o que é, “brinca-se” (rodando a camisa e tudo) com uma coisa desta. A estupidez desconhece limites.
Felizmente, o Atlético-MG repudiou a atitude de parte dos seus torcedores. “A maior torcida de Minas é composta por pessoas de todas as classes sociais, raças e gêneros, não cabendo qualquer tipo de discriminação. Isso não faz parte da nossa gloriosa história”, publicou o clube.
No Brasil de agora e de qualquer tempo, manifestações como a que se viu no Mineirão devem ser cortadas pela raiz, no nascedouro, seja lá qual for o nosso time, seja lá qual for o time adversário, seja lá qual for a nossa premissa de arquibancada.
Não dá pra aplaudir, apoiar ou simplesmente calar frente aos sinais de barbaridade, porque a barbaridade, quando se instala, não quer mais ir embora.
Não é questão do meu time ou do seu, do meu candidato ou do seu. Não é nada disso. É só uma questão de humanidade mesmo.
*Victor Uchôa é jornalista e escreve aos sábados