À flor da pele: Artistas e personalidades revelam como sentem Salvador

Artistas e personalidades falam sobre sua relação com a cidade, que completa 468 anos nesta quarta-feira

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  • Giuliana Mancini

Publicado em 29 de março de 2017 às 07:00

- Atualizado há um ano

O subir e descer das ladeiras, a brisa que bate na orla, a textura da areia na pele em um dia de sol, os poros nus respirando a cidade. Para cada pessoa, Salvador traz um sentimento diferente de toque. Uns conseguem sentir o aconchego de um abraço apertado, outros citam um mistério que arrepia o corpo.

Luma Nascimento - designer, empreendedora e pesquisadora da área de educação e relações étnico-raciais"Nascida e desenrolada em Salvador, eu tenho uma relação intensa com minha cidade. Já morei na cidade alta, já morei na cidade baixa... desde muito cedo aprendi a circular "entrar em beco e sair de beco", e "me amarrar as belezuras de elegância" culturais que a cidade oferece. E mesmo sendo uma cidade de múltiplas possibilidades, ainda é notório a nao democratização cultural nos acessos e lazeres. Todos os dias quando me olho no espelho, saio de casa e observo as ruas e centros de Salvador, e vou vendo com todas as certezas "que a cor dessa cidade sou eu!" E como diz Gil, "Emoriô!" Se estou fora da cidade "saudade sai bagunçando", mas é um disco, é um calor, uma fresca, uma música ou um punhado de dendê que me faz lembrar de casa. Gosto de sentir o sol de Salvador estalando na pele, com aquela trilha de fundo me dizendo: "água de coco geladinha mainha, 1 real", (risos). Mas também gosto de sentir os arrepios no corpo todo, quando vejo um balançar das negras tranças soteropolitanas que sobem, descem e movimentam os centros da cidade. Da até vontade de cantar "Você tem flores na cabeça e pétalas no coração".  

Luisa Prosérpio, atriz“Essa pergunta veio bem a calhar pois estou na Suécia há um mês e a saudade é grande. Do que mais sinto falta é de estar com meus poros nus, respirando a cidade. Andamos seminus e pra gente é normal. Nossa pele sente livre o ar que circula, o contato com o outro, muitas vezes um desconhecido. Minha predileção é o mar, as poças transparentes de Itapuã. Ficar com metade do corpo dentro das águas mornas e salgadas. E os ouvidos fora d'água pra ouvir a mistura contraditória entre o som pacífico das ondas e a algazarra do povo na areia. Deixar o cabelo embaraçar, o biquíni encher de areia, desafiar a gravidade, virar peixe. Eta quanto mistério tem minha cidade! Se sente na pele. Salvador desafia aquilo que já é conhecido. Tem coisa que só se vê por aqui! Se não existisse precisava ser inventada”. 

Carlos Prazeres, carioca, maestro da Osba, mora em Salvador desde 2011"Salvador na minha pele é o cheiro, a calma e o leve sussurrar das águas plácidas da Baía de Todos os Santos. Me lembra Jorge Amado e seu "Quincas Berro D'Água", me traz de volta a música de Dorival Caymmi e toda a a minha "juventude baiana" que só tive de longe, nas leituras, nos sons e na mais pura e doce inspiração. Foram estas águas que me receberam quando cheguei aqui para morar na Vitória e são elas que me acompanham diariamente, me consolando ou me enchendo de alegria". 

Bel Borba, artista plástico"Eu sinto Salvador como uma extensão de mim mesmo, em três aspectos. A cidade tem essa geografia muito sedutora, arrebatadora. As suas ladeiras, encostas, dique, praia, sua baía, suas ilhas. A luz é outra coisa mágica, é um prato cheio pra um pintor. E os amigos. Eu não diria que é exatamente a natureza do soteropolitano em geral, mas dos soteropolitanos que eu interajo, que me rodeiam. Eu sinto salvador “under mais skin”, sob a minha pele. Eu me sinto em Salvador como uma coisa íntima mesmo, indissociável, em lugar nenhum no mundo eu me sinto como me sinto aqui". Marcia Ganem, estilista"Salvador é lugar que se sente no ar úmido que te acolhe ao chegar aqui, ar perfeito pra germinações, pra florescimentos. Salvador de formas singulares e generosas, se sente no toque, na pele macia dos meus conterrâneos, lugar onde o abraço é também religioso, é generoso, é pedir aos deuses pelo outro, que faz parte de nós. Salvador se sente nas mãos, no relevo das rendas, nos bordados, nas fitas do Senhor do Bonfim, que esvoaçam nos gradis das antigas igrejas. Salvador se sente nos pés, nas calçadas da minha rua no Pelourinho, no chão de pedras, nas janelas coloniais, no subir e descer de ladeiras e escadarias. É de tantas texturas que se faz a minha cidade, experiências que entram em mim, pelas mãos, pelos pés, pelos poros, no toque do suave, do macio, de tantas rugosidades... de tanto tempo... de tantos espaços impregnados de história, de sutilezas, de sensações. Obrigada, parabéns e lhe desejo nesse aniversário, que nós, seus filhos e seus tantos afilhados, lhe reconheçam, abram os olhos pro seu valor, pra sua história, cuidem do seu presente e zelem pelo seu futuro".Luis Miranda, ator"Uma coisa sempre que me vem à pele, sempre quando eu penso em Salvador, é que, inevitavelmente, todas as vezes que eu vou à alguma lavagem do Bonfim, geralmente quando estou perto da Colina Sagrada, cai uma chuva fina. Aí aquela chuva fina se mistura com o cheiro de alfazema das baianas, o cheiro da calçada. Aí a pele arrepia. Aquela água fina caindo na pele, aquele sentido frio do álcool da alfazema misturado com aquilo, me dá uma sensação de leveza e de profundidade, me faz pensar ‘Ah, eu sou baiano’. Isso só tem aqui na Bahia, axé".Martinha Fonseca, blogueira do Armário de Madame"Eu simplesmente amo morar em Salvador. Gosto de presentear com um acarajé de vez em quando (uma das minhas comidas favoritas e que são especialmente gostosos quando você sente ele ao mesmo tempo fofinho e crocante). Mudo meu trajeto só para passar pela orla e apreciar a vista.  E de tudo, eu realmente amo sentir o sol queimando na pele. É curioso que não gosto de ir na praia e ficar lá pegando sol, mas, no dia a dia, adoro chegar mais perto na janela e sentir o quentinho do sol. Nos dias de verão, meu humor melhora só de sentir o dia lindo lá fora com o sol brilhando. Nos dias de inverno, quando a chuva dá trégua e aparece o sol depois do toró, é tipo um abraço que a cidade me dá". Alberto Pitta, artista plástico e presidente do Cortejo Afro"Eu sinto Salvador na brisa que sopra do Parque São Bartolomeu. Acesso a reserva que fica na parte de trás do Ilê Axé Oyá, local que originou o Cortejo Afro, no bairro de Pirajá. Local repleto de vida e que me inspira. Em contato com a natureza, seus signos e símbolos desenvolvo a maioria das minhas criações".Daniela Mercury, cantora"Sempre que volto pra casa e desço do avião, sinto a cidade me  abraçar com seu calor e tenho a sensação do amor que há e que eu  preciso. É o calor do paraíso".Allan do Carmo, nadador"Sinto Salvador com toda a energia que lhe é peculiar. Nas  águas do mar ou da piscina, sinto a vibração do nosso povo, o gás que me  é necessário para representar nosso povo pelo mundo, competindo ou não.  Mas, o que mais sinto (e isso não é novidade pra ninguém), é orgulho.  Ser soteropolitano e viver aqui é mais que um prazer. Valeu, Salvador!".Bell Marques, cantor"Os sabores de Salvador são únicos. Não troco por nada, assim como não troco a maresia depois de um longo dia de trabalho, correndo na orla. São coisas que me mantêm muito ligados com minha cidade".Emiliano D'Ávila, ator"Sinto Salvador na pele quando entro em contato com as minhas raízes ao receber os abraços dos meus velhos amigos e da minha família".Fabrício Lemos, chef"Quando volto de alguma viagem, assim que saio do avião, sinto logo o calor de Salvador. É uma coisa que é só daqui. Não só o calor de temperatura, mas o humano, das pessoas. Falando de comida, lembro da cidade quando toco o fruto do dendê. Ele é meio liso, parece um coquinho... Me remete bastante a Salvador".Nádia Taquary, escultora"Difícil falar de todas, mas o abraço, a proximidade física do outro, a forma como nós, baianos, dialogamos com nossa corporeidade, acho única! As frutas também. Algumas vão além do paladar e deixam sensações. Como a mangaba, que cola os lábios, ou a jaca, que tem uma textura muito curiosa. Outra coisa é a renda das rendeiras de Ilha de Maré. Ir ao encontro delas é uma experiência tátil única, que me faz feliz por estar em Salvador"

Tereza Paim, chef"Salvador pra mim é uma cidade de muitas texturas, temos um povo diverso multicultural, místico que com base na fé, embala seu dia a dia como o movimento faceiro de uma panela de Moqueca que borbulhando exala um cheiro inebriante e uma cor sedutora, como os cabelos de Oxum!"[[saiba_mais]]