A Livraria Pública

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  • Nelson Cadena

Publicado em 11 de maio de 2018 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Assim foi denominada informalmente a Biblioteca Pública que no próximo domingo (13) completa 207 anos de existência, infelizmente, sem nada a comemorar por conta do abandono a que foi relegada desde 2015, hoje um terço de seu espaço interditado e com a sua prestação de serviços limitada. Se chamava Livraria Pública, mas, era de iniciativa privada e é uma pena que muitos anos depois tenha passado ao controle do estado que, em vários momentos de nossa história, agiu muito mais de forma predatória do que construtiva. O insight da Biblioteca Central, hoje, não nos deixa mentir.

A Livraria Pública foi uma iniciativa do coronel Pedro Gomes Ferrão Castelo Branco, um cidadão abastado e culto, ilustre morador do Solar Ferrão que hoje é sede do Ipac, no Pelourinho, ele próprio contribuiu com três mil livros de sua estante para a formação do acervo inicial. Foi o primeiro diretor da Biblioteca e o responsável pela iniciativa de contratar assinaturas dos jornais de Londres, já em 1811, e outros que circulavam na Europa, de modo a oferecer leitura atualizada para os moradores da Bahia. Foi a origem da coleção de periódicos que a Secretaria de Cultura do Estado fez questão, em 2016, num ato impensado, de suprimir (mandou cancelar as assinaturas dos jornais diários de Salvador e fez história, má e perversa história).

Como ia dizendo, Castelo Branco doou seus livros, mas,não foi o único. A biblioteca foi enriquecida com outras doações, dentre as quais 13  volumes sobre a História do Brasil, Espanha e Índias Ocidentais doados por Baltazar da Silva Lisboa. Outro doador foi o desembargador da Suplicação no Brasil Clemente Ferreira França que contribuiu com 38 volumes e 50 mil reis em dinheiro. O Conde dos Arcos, então investido no cargo de governador, também “doou” parte de sua biblioteca particular para a Biblioteca Pública, mas, antes de partir, em 1817, primeiro para o Rio de Janeiro e depois para o exílio, mandou buscar os livros de volta. Além dos doadores voluntários,  a Livraria Pública contou nos seus primórdios com um acervo provisório, constituído de livros por empréstimo. Foi o caso do rico comerciante de vidros finos, cristais, Francisco Inácio de Siqueira Nobre que ofereceu, por empréstimo, pelo período de seis anos, a Enciclopédia Metódica e mais alguns volumes sobre história, agricultura e comércio. O padre Francisco Agostinho Gomes foi o segundo diretor da Livraria, era tido como o homem mais ilustrado da cidade com conhecimento de idiomas e de várias matérias, além de ser homem muito, mas muito,  rico. Também cedeu para a Biblioteca Pública vários livros por empréstimo.

Como era um empreendimento privado,  o leitor pagava pelo serviço, inicialmente uma entrada de 12 mil reis e uma anuidade de 10 mil reis. Para efeitos de comparação, uma assinatura anual do jornal Idade D’Ouro do Brasil custava 8 mil reis. As gazetas - origem da valiosa coleção de periódicos da casa (há vários anos sem manutenção e sem nenhum plano de restauração e digitalização) -  despertavam o maior interesse pela variedade e atualidade das notícias, no tempo real de três meses, daqueles idos. Algumas dessas coleções originais de periódicos foram preservadas, sobreviveram ao incêndio de 10 de janeiro de 1912, nefasto rescaldo do bombardeio da Bahia.

A Livraria Pública adquiria assinaturas dos jornais, mas também adquiria livros, dos livreiros europeus, de modo a manter o seu acervo em dia, atualizado. Hoje, infelizmente,  a nossa Biblioteca Central não compra um folheto, que dirá um livro. E ninguém se importa com isso. O governo se omite e a gente, consumidor, cala e consente. Quem sabe um dia possamos resgatar as mesmas boas energias que inspiraram os idealizadores da Livraria Pública e muitos de seus dirigentes que, ao longo de sua história, honraram a sua passagem na gestão.