A  palavra na primeira infância

  Dianne Melo é gestora de programas e projetos sociais e educacionais do Itaú Social

Publicado em 17 de abril de 2018 às 08:20

- Atualizado há um ano

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A palavra é o primeiro alimento do bebê. É ela que conduz a criança ao desenvolvimento emocional e cognitivo, à construção do imaginário e ao processo de aquisição da linguagem. A todo tempo podemos oferecer às crianças algum tipo de diálogo, formal ou informalmente. Cantando canções de infância, contando casos de família e lendas da nossa cultura, ajudando-as a ler textos e imagens nas placas de orientação, nas ruas. Todas essas linguagens, embora simples, são ferramentas essenciais na relação de adultos com crianças e que serão a base de todo o desenvolvimento linguístico delas.

São muitos os estudos que demonstram que a formação de conexões cerebrais  é mais intensa no período entre a gestação e os 5 anos de idade, alicerçadas nas experiências vivenciadas. Em todas as culturas, as crianças se reconhecem, compreendem tempos e espaços, criam vínculos e constroem memórias afetivas por meio da palavra. Por esse motivo, o direito à leitura e a outros bens culturais deve ser garantido, para que todas as crianças tenham oportunidades de desenvolver as competências de leitura e escrita necessárias para o pleno exercício da cidadania. Além disso, o fortalecimento do vínculo afetivo familiar aumenta sua segurança para ganhar autonomia.

O psicanalista colombiano Evélio Cabrero-Parra considera que a linguagem cotidiana tende a ser muito imperativa, dando orientações e limites para a criança sobre o que fazer e o que não fazer. A literatura, por sua vez, oferece um novo vocabulário e histórias de outros lugares, perspectivas e possibilidades, tem um ritmo próprio e sem omissões típicas da fala. Quando um adulto lê para uma criança, ela escuta com maior liberdade e apreende o que necessita.

Ao apresentar às crianças a fantasia, por meio das histórias e dos personagens, a literatura exerce um papel fundamental na construção do significado. Elas passam a usar a imaginação e a criatividade para lidar com sentimentos e emoções, enriquecendo e ampliando suas experiências com as pessoas com quem convivem e com elas mesmas.

O afeto e a disponibilidade dos pais são mais determinantes para as práticas de leitura do que a condição socioeconômica. A qualidade das interações, conversas e trocas no ambiente familiar favorece a apropriação de ferramentas essenciais para viver e conviver num mundo letrado e a participação efetiva numa sociedade que é mediada pela palavra.   As escolas e creches, embora não sejam as únicas responsáveis pela promoção das práticas sociais de leitura, acabam sendo, muitas vezes, um lugar privilegiado para garantir o acesso à palavra, à cultura e à arte.

Recentemente, autores e ilustradores de literatura infantojuvenil e especialistas em temas e políticas ligados à primeira infância, à cultura e ao desenvolvimento infantil trouxeram à tona, durante o Seminário Internacional Arte, Palavra e Leitura na Primeira Infância, realizado em São Paulo, a reflexão sobre como essas questões estão sendo vistas, os diferentes olhares que podem contribuir para ampliar referenciais e inspirar novas práticas. Os pontos cruciais, como o título do evento bem coloca, são a arte, a palavra e a leitura, como um tripé fundamental para sustentar esforços em iniciativas que garantam a todas as crianças o acesso à cultura por meio de políticas, programas e projetos de incentivo à leitura.