A Vida Invisível está na abertura do Panorama Coisa de Cinema

Filme de Karim Aïnouz critica o patriarcado e é pré-indicado do Brasil ao Oscar

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  • Roberto Midlej

Publicado em 30 de outubro de 2019 às 05:59

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Criado numa casa onde só havia mulheres (onde viviam a mãe dele, a avó e tias-avós), o cineasta Karim Aïnouz (Praia do Futuro/2014) percebia que aquele ambiente era diferente da maioria dos lares brasileiros: “Na minha casa, era tudo horizontal, sem um homem, então a hierarquia se dava de outra maneira. Por isso, me sinto mais à vontade para falar sobre isso”, afirma o cineasta, referindo-se à estrutura familiar patriarcal criticada em seu novo longa, A Vida Invisível.

Depois de ser escolhido como a produção para representar o Brasil na corrida pelo Oscar de filme estrangeiro e de vencer a mostra Un Certain Regard no Festival de Cannes, o longa será exibido nesta terça (30) em Salvador no Cine Glauber Rocha, na abertura do Panorama Internacional Coisa de Cinema, às 20h. O diretor e a atriz Carol Duarte estarão presentes na sessão. 

O filme, baseado no romance A Vida Invisível de Eurídice Gusmão, de Martha Batalha, se passa nos anos 1950 e conta a história de duas irmãs, Guida (Julia Stockler) e Eurídice (Carol Duarte/Fernanda Montenegro), muito ligadas entre si e que são separadas depois que Guida fica grávida de um namorado e é expulsa de casa pelo pai autoritário. Daí em diante, as duas passam a vida à procura uma da outra.

Anos 1950 Segundo Karim, o filme é um retrato das mulheres dos anos 1950, que hoje têm cerca de 80 anos: “É a última década em que não houve conquistas feministas, um pouco antes dos anos 1960, última década da família 'tradicional’”.

A mãe do cineasta era daquela geração e ele reconhece que o filme tem uma relação com a sua própria história. “No começo, eu achava que era parecido com a história de minha mãe, mas à medida que fui assistindo, percebi que era a história de muitas mulheres. Cerca de 40% dos lares brasileiros são liderados e sustentados por mulheres, então não se trata de uma exceção. O Brasil é, paradoxalmente um país machista liderado por mulheres”, afirma Karim.

O filme mostra dois lares submetidos ao patriarcado: um é liderado pelo pai de Eurídice e de Guida, Manuel (Antonio Fonseca). O outro, anos depois, é liderado por Antenor (Gregório Duvivier), que se casa com Eurídice. Os dois homens são retratados como opressores e controladores.

Antenor engravida a mulher mesmo a contragosto dela, que desejava estudar música num conservatório e sabia que, caso tivesse filhos, seria muito difícil conciliar a vida de mãe com a carreira de pianista. Chamam a atenção as cenas de sexo, em que o marido preocupa-se apenas com a própria satisfação e força a mulher a transar com ele. Karim chegou a classificar as cenas como 'ridículas'.

O diretor nega que o filme seja feminista: “É uma crítica contundente sobre o machismo, o patriarcado e os efeitos nocivos que o poder patriarcal tem na vida das pessoas. Houve conquistas desde os anos 1950 que foram frutos das lutas das mulheres”. Karim diz que, passados quase 70 anos desde aquele período, as mulheres mudaram muito enquanto os homens pouco evoluíram.“Não digo que o filme seja feminista, mas com certeza é antimachista”, assegura.Para criar esse discurso contra o machismo nas telas, Karim fez questão de ter uma equipe predominantemente feminina, incluindo a assistente de direção Nina Kopko. “Ela foi fundamental e teve um papel muito importante na preparação do elenco. Eu dizia que, se morresse, ela poderia muito bem continuar o filme”, brinca o diretor.

Exibição gratuita hoje (30), 20h, no Espaço Itaú Glauber Rocha