Amaro Freitas busca sons e histórias inspiradoras do Brasil negro

Revelação da música instrumental, o pianista pernambucano lança o álbum Sankofa

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  • Ana Pereira

Publicado em 26 de junho de 2021 às 10:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Jão Vicente/divulgação

É com empolgação que o pianista pernambucano Amaro Freitas conta a história do africano Mahommah Gardo Baquaqua, que foi trazido para o Brasil como escravo, fugiu para Nova York em 1847, onde aprendeu a ler e escrever. Sua autobiografia foi publicada pelo abolicionista americano Samuel Moore e hoje é o único documento conhecido sobre o comércio de escravos escrito por um ex-escravo brasileiro.

“Ele era um rei, foi escravizado, fez muitas viagens, Rio, Estados Unidos, Canadá, Europa, mas o sonho era voltar à África para ensinar ao maior número de jovens o que aprendeu”, conta Amaro, que usa a história para simbolizar a ideia que traduz musicalmente em Sankofa, seu terceiro álbum, lançado pela Natura Musical/78 Rotações Produções. É a ideia do retorno, de estar com os pés no presente, mas olhar atentamente para o passado. De buscar referências, no caso, nas histórias e musicalidade negras.  Com Jean Elton (baixo) e Hugo Medeiros (bateria), o pernambucano forma o Amaro Freitas Trio (Foto: Jão Vicente/divulgação) Baquaqua é também o terceiro dos oito temas do álbum que sucede os elogiados Sangue Negro (2016) e Rasif (2018), todos com o Amaro Freitas Trio, formado juntamente com Jean Elton (baixo) e Hugo Medeiros (bateria). O trabalho vem sendo preparado há três  anos e reflete o amadurecimento do pianista de 29 anos em sua busca pela música afro-brasileira.

Ele cita, por exemplo, a aproximação das “claves negras” do maestro pernambucano Moacir Santos (1926-2006), o encontro com Milton Nascimento e Criolo (no EP Existe Amor, do ano passado) e a influência da música popular pernambucana como fundamentais para seu piano percussivo, descrito pela revista Downbeat como dono de "uma abordagem do teclado tão única que é surpreendente". Sem esquecer o lirismo da igreja evangélica, que foi onde Amaro deu os primeiros passos na música, na periferia de Recife. Milton, inclusive, ganha homenagem em Nascimento, música que fecha o álbum.   

“Quero trazer as histórias do nosso povo, os saberes ancestrais que nos foram negados, mas que estão no nosso DNA e que passa pela minha mãe e pelo meu pai, que é padeiro como Baquaqua foi”. Diz Amaro. Mas ele também se sente parte de um movimento amplo de “exaltação e retomada”, formado por músicos negros que estão renovando o jazz como os americanos Robert Glasper e Chistian Scott e a inglesa Nubya Garcia.  

   

Cercado das incertezas do momento, Amaro aguarda a hora de realizar a turnê nacional de Sankofa, parte do prêmio Natura Musical, que inclui quatro apresentações, uma delas em Salvador. Também aguarda a próxima turnê europeia, já agendada depois da boa recepção que o Amaro Freitas Trio teve nas turnês de 2018 e 2019. “Já vivemos esta disparidade com outros países, por culpa de um governo que lida desde o começo de forma irresponsável com a covid”, diz Amaro, lamentando que nem sabe quando vai se vacinar.