Artista plástico cria obra de arte em homenagem aos 40 anos do CORREIO

Ady Guedes faz arte com material reciclado há mais de 30 anos

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  • Yasmin Garrido

Publicado em 15 de janeiro de 2019 às 14:26

- Atualizado há um ano

. Crédito: Mauro Akin Nassor/CORREIO

Trofarte. Balaxé. Guitarra de pimenta. Chapéu bateria. Todas essas palavras soam como estranhas para algumas pessoas, mas não para o artista plástico Ady Guerra, 52 anos. Originalmente batizado como Adilson, como ainda é chamado pela família, ele se tornou um artista após descobrir sua paixão por recriar peças de arte com a utilização de materiais reciclados.

Nesta terça-feira (15), quando o CORREIO completa 40 anos de história, Ady fez questão de ir até a sede do jornal, no bairro da Federação, para presentear a instituição com um trofarte - um troféu feito de arte. O objeto homenageia tanto os leitores, quanto os jornalistas.“É uma parceria entre quem escreve e quem lê. Um não sobrevive sem o outro”, disse.Feito com diversos materiais, como vinil, base de monitor de computador, pedaços da porta de vidro que foi quebrada em uma agência bancária no bairro da Pituba e partes de uma mesa, o troféu chama atenção pela beleza e imponência. “Eu vou vendo as peças na rua e penso: ‘isso aí dá arte’”, declarou.

A inspiração para criar a peça para o jornal, segundo ele, foi simples: “é um leitor que muda de cor a depender da perspectiva, como a notícia”. De acordo com o artista, a obra de arte permite múltiplas interpretações, leituras e opiniões, mas tem de ser única. “As peças são únicas. Eu não consigo reproduzir”.

Para o artista plástico, ao pensar no trofarte do CORREIO, foi impossível não levar em consideração a dinâmica da redação, da produção da notícia e, também, de um laço afetivo que ele tem com o jornal. 

“Eu trabalhei muitos anos no Centro Administrativo da Bahia e o CORREIO, na época, funcionava na Paralela. Eu nunca chegava no trabalho sem o meu exemplar. E, até hoje, mesmo com o site a todo vapor e a internet a um clique, eu faço questão de tocar no papel, sentir o cheiro da impressão, que é arte também”, contou.

Não é a primeira vez que Ady Guedes oferece uma homenagem à Rede Bahia. Em 2018, ele entregou um trofarte em comemoração aos 33 anos da TV Bahia. “É essa troca que me inspira. Vocês, jornalistas, ganham a notícia de presente, e nós também. E o CORREIO tem um público fiel, tradição. Então, os 40 anos não poderiam passar em branco”. 

Como tudo começou Nascido no bairro de Amaralina, onde mora até hoje, Ady Guedes cresceu ao lado dos cinco irmãos e carrega a paixão pela criação desde pequeno. “Eu desmontava bonecos, carros, construía coisas. Então, a arte começou como uma brincadeira e, atualmente, é meu momento de extravasar”, contou o artista, que começou a produzir as primeiras obras nos anos 80.

Nesse início, a arte era motivo de briga entre Ady e a esposa. “Eu recolhia muita coisa na rua e ela achava que as coisas estavam empatando a casa, acumulando. Então, passei a adotar uma tática: ‘se eu recolho, eu produzo’”.

À época, ele ainda não tinha um ateliê para chamar de seu e a produção acontecia na sala de casa, acompanhando e respeitando a rotina da casa. Mas, agora, Ady já reservou um quarto na casa onde mora, em Amaralina, para fazer de ateliê.

“É bom produzir em silêncio, só com o barulho do mar. Minha imaginação precisa funcionar. Às vezes, eu estou dormindo, sonho com uma ideia e corro para transformar ela em trofarte”, contou.

Hoje, além de casado, Ady é pai de dois filhos, de 17 e 27 anos, e estabeleceu uma regra com a família: ‘no ateliê ninguém pode mexer’. Ele explicou que não gosta de ser incomodado quando está em processo criativo. Para garantir sua concentração, ele sempre trabalha à noite, na companhia apenas de suas duas calopsitas.

“É muito engraçado isso, porque esse momento de transformar objetos em arte, de recriação, precisa de muita concentração. Eu preciso ficar recluso, deixar a introspecção falar, meus sentimentos se aflorarem. Por isso, já peço que não mexam nas colas, peças e tintas, porque é chato ter de perder tempo procurando as coisas. As calopsitas não mexem em nada, só conversam”, brincou. Editora chefe do CORREIO, Linda Bezerra recebe a homenagem (Foto: Mauro Akin Nassor/CORREIO) Segura aí, motô! No meio de tantas histórias e caminhadas, Ady guarda lembranças engraçadas e coleciona situações bastante inusitadas. Como os produtos que utiliza para criar são todos achados nas ruas ou doados, ele sempre caminha por Salvador com olhos bem abertos. Mas, como nem sempre está de carro, quando acha peças que valem a pena transformar em arte, decide esconder.

“Se eu estou passando pela rua e vejo alguma coisa que me inspira, pego logo. Mas, um dia, eu vi um material que era ótimo para virar um quadro. Eu já comecei a ter ideias ali mesmo. Mas, precisava ir ao banco. Então, fui na agência e, quando voltei, o caminhão de lixo estava recolhendo tudo. Claro que eu saí correndo atrás, pedindo para o motorista parar o caminhão”, revelou aos risos.

O que virou todo o material? Um trofarte em formato de cavalo. Adilson jamais poderia deixar todos os produtos - que para alguns são lixo - serem levados pelo caminhão. “Seria uma obra de arte a menos. Eu não consegui não correr e pedir para me entregarem aquilo”, disse.

Outro material que Ady não dispensa é o vidro.“Uma vez a porta de um banco quebrou e os estilhaços caíram no chão. Eu, rapidamente, catei tudo e guardei dentro da mochila. O vidro é interessante, porque ele tem o efeito reluzente. Eu gosto muito de trabalhar com isso”.Balaxé Ady também já é um velho conhecido das festas populares de Salvador. Entre elas, o famoso 2 de fevereiro, dia de Iemanjá, além da festa em homenagem a Nosso Senhor do Bonfim. Neste ano, a agenda dele já está lotada.

“Eu pedi férias do trabalho no posto de saúde para poder intensificar a produção. Me afastei por 15 dias, que foram todos dedicados à produção da pomba do Divino Espírito Santo, que vou levar ao Bonfim nesta quinta (17), e também à elaboração de mais um balaxé”, explicou.

O balaxé é mais uma ideia de Adilson Guedes. São balaios de axé, feitos especialmente para Iemanjá. Este ano, o artista vai entregar o terceiro exemplar da obra: um peixe beijupirá de 2 metros e meio, feito com pedaços de uma palmeira imperial que caiu na Avenida Centenário, na Barra.

“Quando soube da queda da árvore, peguei o carro e fui lá buscar a palmeira, que era lindíssima. Passei 6 meses trabalhando no balaxé, envelhecendo e envernizando a palmeira”, explicou. A entrega do balaxé vai acontecer logo cedo no dia 2 de fevereiro, às 7 da manhã. “Eu ainda não sei para quem vou doar a obra. Mas, preciso doar, porque se eu me apego demais, não consigo liberar espaço para novas criações. A mente precisa se desapegar também. O primeiro balaxé eu doei a um amigo. Foi um balaio com uma sereia. Mas, o segundo eu não consegui doar ainda. Me apaguei. Porque arte é que nem filho, a gente acaba se apegando”, declarou.

Visual E não é só a obra de arte de Ady que chama a atenção das pessoas. Ele também faz questão de adotar um visual inovador. “O que adianta ser igual a todo mundo?”, provocou.“Uso sempre esse chapéu, que é a cara do sertão nordestino, porque isso faz parte de minha história. A camisa, me perguntam se eu só tenho ela. Mas, eu gosto de aparecer sempre com o visual meu, que ninguém tenha, por isso os óculos também”, contou ele, que comprou a peça em São Paulo.Além dos balaxés e trofartes, Ady Guedes se juntou a um grupo de amigos para levar arte e alegrias a pontos conhecidos de Salvador, como o Mercado Modelo e a Feira de São Joaquim. O grupo Anima Festa, como foi batizado, agita por onde passa.

“Eu saio com um chapéu que tem uma mini bateria em cima. Um amigo sai com uma guitarra em formato de pimenta. Outro sai com um violão. E tudo foi feito por mim, com materiais reciclados que foram recriados e transformados em arte”, gabou-se. 

Além dos instrumentos e dos cinco integrantes, a Anima Fest tem um mascote: boneco pidão. “Eu achei esse boneco em casa, fiz algumas modificações e, como ele tinha uma cesta, decidi levar junto com a banda. As pessoas começaram a depositar dinheiro nele. Então, batizei de boneco pidão”, contou Ady Guedes.

*Sob supervisão da subeditora Fernanda Varela