As lições feministas de Paulina Chiziane

Escritora tem 66 anos e é a primeira mulher, e negra, a vencer o Prêmio Camões de Literatura

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  • Ana Pereira

Publicado em 8 de janeiro de 2022 às 07:00

- Atualizado há 10 meses

. Crédito: Foto: Divulgação

Com a lente de aumento colocada pelo Prêmio Camões, muita gente se perguntou quem era Paulina Chiziane, a escritora moçambicana de 66 anos que venceu a maior distinção literária em língua portuguesa em 2021. Já bastante conhecida no nincho da literatura negra, a autora tem uma relação antiga com o Brasil e já veio inclusive na Bahia, onde participou da Festa Literária Internacional de Cachoeira (Flica), em 2017.   Em outubro, quando o prêmio foi divulgado, Chiziane disse que ficou surpresa. O que pode ser explicado, em parte, pelo fato dela ser a primeira pessoa preta a ganhá-lo. E, claro, a primeira mulher, em 33 anos de existência do Camões. E olhe que ele foi criado para divulgar autores portugueses, brasileiros e africanos de países lusófonos, ou seja, com muitos negros na concorrência.

Em bate-papo com a “comadre” Conceição Evaristo em evento promovido pelo Itaú Cultural (disponível no YouTube), Chiziane disse que o prêmio lhe deu a certeza de ter feito as escolhas certas quando optou por escrever sobre a cultura das mulheres de sua terra, em falar sobre mitos e tradições banto. “É um prêmio para uma raça e uma cultura, para a luta por um mundo mais equilibrado e para dar força a toda uma geração”.

No Brasil, Chiziane tem alguns livros publicados pela editora mineira Nandyala, especializada em literatura negra. Mas também teve Niketche, um de seus romances mais importantes, lançado pelo selo Companhia de Bolso, da Companhia das Letras – com edições mais baratas.

Niketche é um ótimo exemplo do que Chiziane fala sobre em ir fundo na cultura de seu país - o que, contou, foi muito rejeitado internamente. O romance, que tem o subtítulo Uma História de Poligamia, traz a visão feminina dessa tradição que sobrevive em muitos países - legalizada ou não. Quem conta a história é Rami, casada há 20 anos com Tony e que decobre que o marido é cheio de amantes. Cinco no total. 

Quando resolve conhecê- las e formar um polígono contra o marido, Rami mexe profundamente com os muitos aspectos da poligamia - que é cheia de regras e não um harém divertido como queria Tony, que acredita piamente que “só as mulheres podem trair” e só queria o lado bom de ter cinco mulheres.

A poligamia é legítima? É bom pra quem? Ter amantes é uma degradação da tradição? Qual o papel feminino nisso tudo? Por que, nós mulheres, sempre estamos em segundo plano? Angústias de Rami que têm muito mais a ver com a gente do que gostaríamos.  Companhia de Bolso, R$ 19,90, 293 páginas

Duas escritoras negras para preste atenção Yaa Gyasi - Nascida em Gana e criada no Alabama, nos Estados Unidos, Yaa Gyasi tem escrito exatamente sobre a diáspora africana. Depois do premiado   O Caminho de Casa, no qual ela conta uma saga que percorre da escravidão aos EUA moderno, ela lança Reino Transcendente, ambos pela editora Rocco (R$ 64,90). Neste último, foca em uma casal ganês que migra para a América. Uma história dolorosa, que mistura religião e ciência, e envolve muitas fraturas raciais.     

Raven Lailani  Lúxuria é o primeiro romance da jornalista, ganhou vários prêmios e chama atenção pela linguagem ágil e mordaz com que ela retrata a vida da jovem negra Edie, mora- dora do Brooklyn e totalmente sem saber o que fazer da vida - como muitos de sua geração. E dá-lhe conflito  racial, sexual, de gênero  e de classe. Companhia das Letras, R$ 64, 90.

Nara Leão ganha série (Paulo Lorgus/Divulgação) Série documental Nara Leão por quem a conheceu de perto

 Nome fundamental da Bossa Nova, Nara Leão tem sua história registrada na série documental  O Canto Livre de Nara Leão, que estreou no Globoplay. Dirigida por Renato Terra e produzida pelo Conversa. doc, núcleo de documentários do programa Conversa com Bial, o projeto entrevista pessoas que conviveram com a artista -  que no dia 19 completaria 80 anos -  e traz uma pesquisa de imagens, fotos e arquivos – muitos inéditos.

“Nara foi uma cantora brilhante. Mas sua importância não se resume à música. Suas entrevistas, muitas vezes, pautavam as conversas em todo país. Ela confrontava os críticos que queriam rotular e limitar o seu trabalho. Com inteligência e delicadeza, Nara sempre fez o que quis na sua arte e na sua vida pessoal”, observa Renato Terra.

Dividida em cinco episódios, a série mostra diferentes fases de Nara Leão, na música e na vida íntima. Conta com depoimentos de Chico Buarque, Roberto Menescal, Paulinho da Viola, Maria Bethânia, Edu Lobo, Dori Caymmi, Marieta Severo e Fagner, entre outros.

Casado com Nara durante muitos anos, Cacá Diegues deu um íntimo depoimento sobre sua relação. Filha do casal, Isabel Diegues também participa, assim como o neto José Bial, de 19 anos. Os episódios contam com imagens de acervos variados, entre materiais raros e alguns inéditos, como arquivos da ditadura que foram descobertos recentemente. Entrevistas que Nara deu ao longo da carreira, números e encontros musicais, shows, filmes e fotos de reuniões em seu apartamento fazem parte do conteúdo.  O projeto ainda resgata o acervo do especial Por Toda A Minha Vida, exibido em 2007 na TV Globo. 

A parceria de Nara com Chico Buarque e sua importância nas carreiras de Edu Lobo, Sidney Miller, Fagner e Dominguinhos é tema de um dos capítulos. Assim como sua aproximação com a turma da Tropicália e de Roberto e Erasmo Carlos.