Bahia passa Pernambuco e colhe primeira safra de azeitonas do Nordeste

Projetos foram iniciados ao mesmo tempo, mas oliveiras de Rio de Contas, na Chapada, foram as primeiras a produzir em escala

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  • Georgina Maynart

Publicado em 22 de junho de 2018 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Georgina Maynart

A primeira safra de azeitonas colhidas na Bahia este ano abre espaço para um mercado promissor e um fato inédito: a fabricação do primeiro óleo de oliva do Nordeste.

Pelo menos as azeitonas em conserva já estão sendo produzidas nestas terras. Elas estão em processo de apuração da essência e começam a apresentar um sabor delicioso depois de quase quatro meses mergulhadas na salmoura.

São as primeiras azeitonas geradas em escala produtiva no nordeste do Brasil. Foram colhidas, este ano, em dois mil pés de oliveiras, no município de Rio de Contas, na Chapada Diamantina. As oliveiras deram frutos pela primeira vez depois de 12 anos do plantio.

“Foi uma surpresa completa. Uma benção. Nos anos anteriores elas chegavam a dar pouquíssimos frutos. Este ano surpreenderam. A floração foi excelente e a gente colheu cerca de 5 toneladas de azeitonas”, diz Christophe Chinchillla, um dos donos da fazenda e presidente da Cooperativa de Produtores Rurais ChapaSul. 

A expectativa para a próxima safra são animadoras: “Este ano estamos focados em fazer com que a floração de agosto seja boa. Porque isso é que vai indicar se no ano que vem teremos uma safra tão boa quanto a deste ano” aponta o produtor rural.

Já no ano que vem, as azeitonas podem ser beneficiadas e transformadas em óleo de oliva. “Neste primeiro momento, pretendemos beneficiar em uma agroindústria de Minas Gerais. Já que ainda não temos maquinário. Mas futuramente queremos realizar todo o processo aqui mesmo na Bahia”, antecipa Christophe.

Enquanto o óleo de oliva ainda não tem sotaque baiano, outra fase da produção está em andamento. Cerca de 500 quilos de azeitonas foram reservados para o preparo de conservas temperadas. Os produtores já anunciaram, também para o ano que vem, a fabricação de uma pasta de azeitona de origem francesa, conhecida como Tapenade.

História improvável A existência de oliveiras produtivas no Nordeste é fato inédito. Esta história começou em 2003, quando o empresário francês Didier Chinchilla, um declarado apaixonado pelo Brasil, deixou a empresa em que trabalhava como executivo e começou a percorrer o país em busca de um lugar ideal para instalar um projeto de agricultura sustentável.

Ao chegar na Chapada Diamantina, ele diz que teve uma sensação: “quando eu conheci a Chapada há cerca de 15 anos, eu senti ser um clima diferente, que me lembrava muitos as regiões do sul da França, região da Provence. Era uma sensação física de que eu estava na minha casa, com ar seco, mas com luminosidade, em um clima bem típico do mediterrâneo”.

Daí surgiu a ideia de cultivar azeitonas, comuns no sul da Europa e no Norte da África. O empresário reuniu um grupo de investidores franceses e começou a colocar o projeto em prática. 

Através de uma parceria com a Embrapa Pernambuco, que estava iniciando um projeto experimental em Juazeiro, no norte da Bahia e na divisa com Pernambuco. Ele obteve mudas de 20 variedades de oliveiras. As mudas foram plantadas em apenas 3 dos 7 mil hectares da fazenda.

O projeto pernambucano ainda não vingou. Mas as duas mil oliveiras de Rio de Contas, depois de quase 11 anos de longa espera, brotaram intensamente em fevereiro deste ano.

Do pomar foram retiradas quase 5 toneladas de azeitonas. Até para os produtores rurais foi uma surpresa. “Nós queríamos muito, mas não esperávamos que elas frutificassem de forma tão repentina. Tanto que a nossa colheita este ano foi improvisada. Estamos muito felizes com o que está acontecendo. Para nós a azeitona é um símbolo do potencial de desenvolvimento desta região”, afirma Didier.

Clima mediterrâneo A “sensação de mediterrâneo” sugerida pelo empresário não era por acaso. Esta região da Chapada Diamantina tem características especiais proporcionadas por um conjunto de fatores climáticos e geográficos.

A cidade de Rio de Contas, onde estão localizadas as fazendas, fica a quase 1.200 metros de altitude, cercada pelos mais altos picos da Bahia, o Pico das Almas, o Itobira e o Barbado. A temperatura pode chegar a 4°C no inverno. Pesquisadores estudam a existência de uma espécie de “microclima" na região.

Segundo o pesquisador da Embrapa Mandioca e Fruticultura, Orlando Passos, que analisa a Chapada há mais de 60 anos, “existe um clima diferenciado nesta região em relação as outras partes da Bahia. Esta altitude elevada favorece uma amplitude térmica, com grande variação de temperatura durante o dia e a noite”.

De acordo com Passos, estas variações influenciam diretamente no desenvolvimento de frutas. “Faz as cores das frutas ficarem mais intensas. A fruta começa a ficar colorida exatamente quando a temperatura baixa, e é quando a folhas começam a ficar coloridas. Vale a pena avaliar este potencial para a produção de frutas aqui, não apenas as azeitonas, mas laranjas e outros citrus ”, aponta.

O engenheiro agrônomo Cristian Meira Lima também acredita nesta tese. “O diferencial que eu vejo é estarmos em um microclima que possibilita frutas de extrema qualidade”, acrescenta.

As oliveiras apresentam ainda uma grande vantagem: não suportam excesso de água, algo escasso na região. As condições climáticas, aliadas ao manejo sustentável fizeram a diferença. “O solo daqui é muito arenoso e necessita de constantes correções. Nós fizemos uma adubação orgânica no ano passado que também influenciou muito”, conta o agrônomo.

Potencial Conhecida pela arquitetura colonial preservada e com uma forte história ligada à resistência quilombola, a cidade de Rio de Contas vive uma nova expectativa econômica.

A produção de frutas e outros alimentos surge como uma alternativa de desenvolvimento. Dezenas de pequenos produtores rurais passaram a cultivar nos últimos anos frutas como tangerina, laranja e manga.

Agora os moradores têm o desafio de aliar a produção agrícola, com preservação do meio ambiene. “A gente acredita que a fruticultura, se for planejada, pode ser excelente caminho para o desenvolvimento sustentável”, diz Jilciléia dos Santos, coordenadora municipal de Meio Ambiente.

Conservas experimentais  Enquanto a produção do primeiro óleo de oliva da Bahia não começa, cerca de 500 quilos de azeitonas estão sendo usadas na produção de conservas temperadas artesanais.

Os potes estão sendo preparados por um pequeno produtor rural do município, Nagoy Sol, que pratica a permacultura. Ele fez uma parceria com os donos da fazenda e, mesmo sem nunca ter manejado azeitonas, pesquisou receitas para preparar os molhos. De sabor genuíno, as conservas estão fazendo sucesso na cidade, e são ideais para servir como aperitivo, acompanhadas de um bom vinho.

Se você não tem condições de ir em Rio de Contas, comprar diretamente na mão do produtor, veja abaixo uma das receitas. E que as azeitonas das oliveiras baianas sirvam de inspiração.

Conserva temperada de Azeitona à moda espanhola  Em um litro de água fervendo, acrescente algumas folhas de louro, raminhos de alecrim à gosto, alho cortadinho e pitadinhas de tomilho. Depois da fervura desligue e deixe esfriar. Coloque em potes de vidro, acrescente as azeitonas e 3 colheres de óleo de oliva. Consuma depois de 3 dias em conserva. Além de saborosa, o petisco é super decorativo! 

Oliveiras no mundo As oliveiras são árvores que levam entre 8 a 15 anos para aprofundar as raízes, maturar e frutificar.

São conhecidas no mundo inteiro como árvores da eternidade, por que podem durar mais de 2 mil anos.

As regiões de clima frio e altitude são consideradas ideais para o cultivo. No Brasil existem pomares no Rio Grande do Sul, em Minas Gerais e em São Paulo. Mas a maior parte das azeitonas consumidas no Brasil, mais de 95%, ainda é importada de países europeus e africanos.

As oliveiras de Rio de Contas são pioneiras no nordeste.