Bahia vive temporada de queimadas: 706 focos em 48 horas

Em todo o país, são 29.317 focos no mesmo período

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  • Mario Bitencourt

Publicado em 13 de setembro de 2018 às 04:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Divulgação
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As chamas que destroem há quatro dias a Serra do Tromba, na Chapada Diamantina, é um dos 706 focos de incêndio registrados nas últimas 48 horas no estado. O número, verificado no final da tarde desta quarta-feira (12), é de satélites do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia. No país, eram 29.317 pontos em chamas em dois dias.

Apenas nesse período de tempo, a Bahia registrou a cada hora 29 focos de incêndio - os dados do Inpe são reunidos por 10 satélites que processam 250 imagens por dia. No ano, já são, ainda de acordo com o instituto, 27.454 focos de incêndio no estado.

As cidades do Sudoeste e do Oeste da Bahia - esta última, região que se destaca pelo desenvolvimento no agronegócio, com a plantação de grãos (soja, milho e algodão) -, estão entre as que registram o maior número de focos.

Tecnicamente, o Inpe identifica “focos de calor”, que podem ser os incêndios propriamente ditos ou as queimadas controladas, realizadas pelos agricultores como técnica de manejo do solo.

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O pesquisador Alberto Setzer, coordenador do Programa de Monitoramento de Queimadas no Inpe, disse que “no caso da Bahia, os dados indicam que os piores meses são sempre de setembro e outubro”.

“De agosto a novembro, aparecem queimadas na região Sul. Estamos entrando no período de pior queimada para a Bahia”, disse o pesquisador.

O Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos (Inema)  proíbe – entre julho e dezembro - as queimadas, e no resto do ano elas são permitidas, desde que declaradas. A proibição ocorre pelo fato de esta época do ano ser a mais propícia para o alastramento do fogo.

Ranking  A cidade de Aracatu liderava o ranking das últimas 48 horas, com 38 focos, seguida por Bom Jesus da Lapa (33), Jaborandi (33), Wanderlei (31), Formosa do Rio Preto (25), São Desidério (23), Riachão das Neves (20), Cocos (18), Anagé (17) e Correntina (17).

Procurada, a Prefeitura de Aracatu, cidade do Sudoeste, não soube informar sobre ocorrência de incêndios de grandes proporções na região, marcada pela vegetação seca da caatinga, muito explorada por carvoarias ilegais. Os casos de focos de incêndio nessas cidades se dão pela característica regional do clima nas regiões onde estão inseridas, que combina tempo seco, ventos fortes, altas temperaturas e, ainda, no caso do Oeste, a baixa umidade relativa do ar.“São regiões quentes, onde focos de incêndio sempre aparecem. Até novembro, temos uma grande sequência de dias ensolarados e baixa umidade relativa do ar”, disse a meteorologista do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) Cláudia Valéria Silva.E, para dezembro, está prevista a volta do fenômeno El Niño, que provoca dias mais frios no Sul do Brasil e dias mais quentes no Nordeste. “Ainda não sabemos em quanto a temperatura vai aumentar, mas isso já é dado como certo”, acrescentou Cláudia.

Com as altas temperaturas, as vegetações da Caatinga (Sudoeste) e Cerrado (Oeste) são um combustível a mais na expansão dos incêndios, que quando ocorrem são difíceis de ser controlados, podendo levar dias e até meses.

Os estragos causados pelos incêndios este ano ainda estão sendo computados por órgãos ambientais. O caso mais recente, ocorrido no Parque Nacional do Boqueirão da Onça, no Norte do Estado, consumiu mais de 3 mil hectares da Caatinga - o equivalente a 3 mil campos de futebol. O incêndio no parque, iniciado dia 28 de agosto, deve ser controlado totalmente esta semana.

Perdas Segundo a ONG Observatório do Clima, a Bahia perdeu quase 4 milhões de hectares de áreas de florestas entre 1985 e 2017, ano em que foram registrados 26,7 milhões de hectares com florestas nativas. As perdas se dão por incêndios e desmatamento florestal para exploração de madeira e criação de pastagens.

Em 2017, foram registradas ocorrências de incêndios florestais em todo o estado da Bahia, sendo os maiores números de ocorrências em Pilão Arcado, Formosa do Rio Preto, Correntina, São Desidério, Santa Rita de Cássia, Barra, Barreiras, Jaborandi, Cocos, Riachão das Neves, Luís Eduardo Magalhães, Rio do Pires, Piatã e Rio de Contas.

Pesquisador da ONG, o especialista em Geotecnologias Washington Franca informa que os municípios que têm mais focos de calor (incêndios ou queimadas) durante os últimos dez anos são os do Oeste da Bahia: Formosa do Rio Preto, São Desidério, Santa Rita de Cássia, Barra, Cocos, Correntina e Cotegipe.“Formosa do Rio Preto é o que apresenta maior número de focos de calor durante os 10 anos de observações, esse fato pode estar relacionado ao fato desse município possuir muitas áreas ainda vegetadas, tendo assim, material combustível disponível para os recorrentes incêndios”, disse Franca. Brigadistas atuam no combate às chamas em Piatã, na Chapada Diamantina (Foto: Divulgação) Em Piatã, na Chapada Diamantina, ocorre situação semelhante. A vegetação que há na área da Serra do Tromba tem sido consumida pelo fogo, que se espalhou com facilidade com a força dos ventos, com as  temperaturas relativamente altas para essa época do ano – o máximo foi de 26°C ontem. 

Por lá, está sendo esperada a chegada do helicóptero do Grupamento Aéreo (Graer), unidade da Polícia Militar da Bahia, autorizado desde segunda-feira pelo governador Rui Costa para ser usado no combate ao incêndio. Sem a aeronave, o trabalho de brigadistas e membros do Corpo de Bombeiros tem sido quase dobrado porque os locais onde as chamas estão são quase impossíveis de serem alcançados por via terrestre. Até o momento, só uma aeronave motoplanador do Graer (usada para monitoramento) sobrevoou o local.

A aeronave aguardada é para atuar no transporte dos combatentes (voluntários e do Corpo de Bombeiros), equipamentos, ferramentas e logística necessária, e realiza combate direto através da utilização do bambi-bucket, uma espécie de bolsa para lançamento de água no combate aéreo a incêndios.

Preocupação com as nascentes O secretário de Agricultura de Piatã Glayco Barbosa, que acompanha a situação, disse que o helicóptero é essencial para transportar pessoas e equipamentos até áreas onde se possa fazer o trabalho mais efetivo de combate às chamas, cuja extensão atingida da mata ainda não é possível de se estimar.

“Estamos no aguardo deste reforço para termos um combate mais efetivo”, disse o secretário. A serra fica dentro da Área de Relevante Interesse Estadual Nascente do Rio das Contas, e tem 4.777 hectares, entre as cidades de Piatã e Abaíra.“As nascentes ficam numa área de brejo, com vários pontos de minadores. Não podemos afirmar por enquanto se elas foram atingidas”, declarou Barbosa.Ainda segundo o secretário, a preocupação maior está sendo com moradores que vivem próximo a área atingida pelas chamas. Há uma residência que fica a menos de 100 metros do incêndio. No total, há 10 bombeiros e 23 brigadistas atuando no combate, com bombas costais. Moradores locais auxiliam no trabalho.

O Corpo de Bombeiros, em comunicado no final da tarde desta quarta-feira (12), informou que “o incêndio está sendo controlado”, e que as “equipes de brigadistas estão percorrendo o perímetro, realizando o rescaldo, eliminando focos onde é possível o acesso e avaliando a cena, para prevenir reignições”.

“O monitoramento acontece de forma minuciosa, seguindo protocolo, por tratar-se de área rica em nascentes e com muita matéria orgânica no subsolo. Ainda não se sabe as causas desse incêndio”, diz o informativo, segundo o qual “houve fogo nas proximidades de alguns minadouros das nascentes, mas a atuação impediu que o prejuízo fosse maior”.

O CORREIO procurou a Polícia Militar da Bahia para saber o motivo de ainda não ter sido liberado o helicóptero do Graer para combater o incêndio em Piatã, mas não houve retorno até o fechamento desta reportagem.