Banda baiana Flores do Mal está de volta 30 anos depois

Grupo que marcou o cenário do rock baiano nos anos 1980 retorna com seis canções inéditas e formação original

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  • Roberto Midlej

Publicado em 14 de julho de 2020 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Uanderson Brites/divulgação

Eram meados dos anos 1980 e a banda baiana de rock Flores do Mal resolveu gravar seu primeiro LP. Deparou-se com um problema: as fábricas de vinil estavam com uma demanda absurda, afinal o mercado musical brasileiro estava aquecido e, por isso, o disco deles ficou “na fila” por um bom tempo, esperando a hora de ser prensado.

Ser músico independente naquela época não era fácil, já que as grandes gravadoras tinham a preferência na tal fila. O disco saiu, mas demorou quase um ano até “chegar às lojas”, como se dizia.

Passados mais de 30 anos desde o lançamento daquele álbum, a história é outra: os quatro integrantes, depois de três décadas separados, se reuniram há alguns meses para gravar um novo álbum e, sem aqueles obstáculos, logo lançaram nas plataformas de música para todo mundo ouvir.

Mas Paquito (voz), Heyder (guitarra), Eduardo Luedy (baixo) e Tony (bateria) parecem não ter perdido a afinidade, mesmo depois de tanto tempo.  Hoje, todos têm 54 anos, com exceção de Paquito, que tem 56. “Foi uma alegria estar com eles no estúdio. Um amigo nosso viu as gravações e disse que estava todo mundo entrosado, a gente nem precisou ensaiar tanto assim. Afinal, a Flores do Mal era um grupo de amigos”, diz Luedy. Tony, Luedy, Paquito e Heyder, nos anos 1980, na Concha Acústica (foto: acervo pessoal) O novo álbum, Aquela Dor, sai exatamente 30 anos depois do final da banda. No repertório, estão sete canções compostas no final dos anos 1980, mas que ainda não haviam sido gravadas. E há um bônus para quem quiser matar as saudades: as seis gravações originais do primeiro disco, que Paquito chama de “mini LP”. Para o vocalista, no entanto, aquelas canções “envelheceram bem”.

As canções inéditas praticamente não passaram por mudanças em relação à composição original, com letras e arranjos mantidos. Luedy havia guardado as gravações da época em uma fita cassete e as digitalizou para mostrar aos colegas. “As gravações eram um tanto precárias, mas serviram para lembrar como eram os arranjos e fomos muito fiéis à forma como a gente tocava as músicas. Gravamos por volta de 1987, mas Heyder saiu e depois acabamos sem gravar as canções profissionalmente”, diz o baixista.

MPB e Rock A mistura de rock com MPB, que marca o som da Flores do Mal continua presente. Explica-se: Paquito, que compõe a maior parte das canções da banda, era ouvinte contumaz da música brasileira dos anos 60 e 70, o que incluía desde o romantismo de Roberto Carlos até o tropicalismo de Caetano e Gil, passando pelo rock de Raul Seixas e o baião de Luiz Gonzaga.

Mas, como boa parte dos músicos de sua geração, Paquito reconhece também a importância que os Beatles tiveram para sua formação musical: “Eu já ouvia muito MPB e depois descobri profundamente o Beatles, que foram um arrasa-quarteirão para mim. Com eles, percebi que era possível ter uma banda. A música dos Beatles flui tão naturalmente que parecia muito fácil ter uma banda”.

Aquela Dor tem desde o pop de Fugidia (Heyder/Paquito) até o rock-baião Caso de Amor, História de Terror, que compara o fim de um relacionamento a uma história bem sombria. E tem até um poema do inglês John Suckling (1609-1641) traduzido pelo concretista Augusto de Campos e musicado por Paquito.

E o samba está presente, com duas canções de Noel Rosa: Seu Jacinto e Quem Não Dança, que haviam sido gravadas no LP de 1985 e estão de volta na versão original. Paquito é firme ao defender a mistura: “O rock tinha uma certa rejeição à MPB e sempre discordei disso, sempre achei isso meio colonizado. Marcelo Nova, que defendia uma separação entre esses estilos, sempre foi para mim uma figura datada. A gente queria fazer nosso rock, o rock que a gente gostava”, diz Paquito, que pretende levar a banda aos palcos após a pandemia.