Boca do Rio tem diárias até 20 vezes mais caras no Réveillon

Bairro tem opções para curtir a festa com vista privilegiada

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  • Anderson Ramos

Publicado em 23 de dezembro de 2018 às 04:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Arisson Marinho/CORREIO

Que o baiano é criativo, a gente já sabe. E se o negócio é ganhar dinheiro, bota criatividade nisso. Em nome de uma grana extra, um consultório se transforma em um instante num camarote improvisado e até o banheiro de casa vira negócio e rende R$ 700 em cinco dias. Quando se trata de um imóvel inteiro, o lucro se multiplica e uma diária custa até 20 vezes mais do que o valor de mercado no resto do ano. De olho no Festival Virada, moradores da Boca do Rio provam que são mestres na arte de empreender.

Na Rua Yemanjá, uma marginal da Avenida Octávio Mangabeira, na Boca do Rio, a quantidade de placas de aluga-se chama a atenção. O lugar, que se destaca pela grande quantidade de fábricas de móveis rústicos, nesse período passa a ser cobiçado para o aluguel de temporada. É que  fica a poucos metros da Arena Daniela Mercury e tem vista privilegiada dos shows do Festival Virada Salvador.

Há espaços que já são usados para locação ao longo do ano, mas que os proprietários aproveitam o aumento da procura nesse período para faturar muito mais com eles.  É o caso do dentista e ex-jogador do Bahia, Manoel Oliveira Filho, conhecido como Manezinho. No prédio que construiu há cerca de 50 anos, ele tem cinco apartamentos. No momento, só um está com inquilino fixo. Os demais, inclusive o seu consultório,  botou para alugar.

Surpreendentemente, o consultório foi o primeiro a ser alugado. Durante os dias de festa, vai  funcionar de QG para abrigar o estoque de cerveja e massas de acarajé e abará que serão vendidos na festa. Pelos cinco dias de festival, Manezinho vai receber R$ 1,3 mil.

Mas não será a primeira vez que ele vai lucrar com a festa. Ano passado, ganhou R$ 700 alugando por dois dias uma quitinete que ao longo do ano ele cobra R$ 350 por mês. Já com  a cobertura, que ele costuma locar por R$ 600, lucrou R$ 2,5 mil por três dias. Ainda de olho nas oportunidades, cobrou R$ 5 pelo uso do banheiro da própria casa e calcula que o negócio improvisado  rendeu cerca de R$ 700: “Temos que aproveitar para ganhar um dinheiro”. 

Quem também não perdeu tempo foi a professora Virgínia Simões. Junto com a família, ela construiu um espaço de 24 m² com a intenção de alugar para fins comerciais. Devido à procura, também resolveu disponibilizar para quem quer curtir o Réveillon: “É pequeno, mas como a procura está muito grande, resolvemos liberar para a festa”, conta Virgínia, que está cobrando R$ 1,2 mil pelos  dias da festa. O valor é o mesmo que ela cobraria pelo mês inteiro ao longo do ano.

Ainda na mesma rua, a aposentada Leila Lima espera repetir o ganho do ano passado, quando alugou um quarto e sala mobiliado a R$ 200 por dia. Ela conta que a procura ainda está baixa, mas não perde as esperanças: “As pessoas geralmente deixam para cima da hora. No ano passado, um pessoal de Feira de Santana alugou na véspera de começar a festa”, lembra.

O engenheiro civil Marcus Malta também mora na Rua Yemanjá e tem outro imóvel no local. O térreo, ele aluga para uma fábrica de móveis. Já o andar de cima está vazio. O espaço de 65 m² tem estrutura para funcionar um escritório ou consultório, mas deve ser transformado em um camarote improvisado. Ano passado, teve interessado no espaço, mas ele preferiu não alugar. Dessa vez, pretende faturar R$ 2,5 mil com a locação nos dias de festa. 

“Há outras opções, mas nenhum tem a vista que o meu tem. São dois janelões que dão para ver o mar e o palco. É a melhor vista ”, diz, se referindo ao sobrado vizinho ao Restaurante Rua 15. Manoel alugou até o consultório odontológico (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Preços inflacionados Segundo o diretor  do Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci), Noel Silva, que também é sócio da NNova Soluções Imobiliárias, a Boca do Rio não tinha tradição de Réveillon. Mas a mudança do Festival Virada da Praça Cayru para a orla do bairro fez com que não só crescesse a procura por imóveis na região, como os preços foram inflacionados.

“Cresceu e inflacionou, se equiparando muito a quando havia Réveillon na Barra. O crescimento na procura foi de 50%”, avalia o diretor do Creci. Como quem dita os preços no mercado é a lei da oferta e procura, consequentemente, os valores cobrados foram lá pra cima. “Os preços ficam até 20 vezes mais caros do que o normal”.

No site OLX, por exemplo, há anúncios de imóveis de dois quartos na região, com infraestrutura completa, por R$ 5 mil para 28 de dezembro a 2 de janeiro. “O aluguel de um apartamento na região de Armação com infraestrutura custa em torno de R$ 1,5 mil. Ou seja, a diária sai por R$ 50. Com o pacote de cinco diárias custando R$ 5 mil, cada diária sai por R$ 1 mil”.

Cuidados Em meio a essa euforia para lucrar com a festa, há também quem já teve problemas com a experiência e vai preferir deixar o imóvel fechado. A responsável pela locação de um imóvel na rua, que não quis se identificar, contou que o espaço foi locado no ano passado para um grupo de quatro pessoas. Na prática, dez se hospedaram no local e fizeram a maior bagunça no prédio.

A situação foi tão crítica que foi preciso acionar a polícia. O trauma foi tanto que o dinheiro já não enche mais os olhos do dono. “O aluguel normal é de R$ 850 por mês. No Réveillon passado, alugamos por R$ 1,8 mil. Mas o transtorno foi tanto que não compensou. Tem muita gente interessada, mas o dono não tem a intenção de alugar para a festa”, conta.

O diretor do Creci, Noel Silva, diz que, na hora de alugar um imóvel, mesmo que seja por poucos dias, é preciso estar atento a alguns detalhes, para que aquilo que deveria ser uma forma de ganhar dinheiro não acabe se transformando em dor-de-cabeça e prejuízo. Ele explica que é preciso identificar o perfil de quem está interessado em alugal o imóvel, pedir cópia de documento de identidade, comprovante de endereço e formalizar um  contrato de locação. 

“É preciso ter esse cuidado para não correr o risco de abrigar alguém que venha trazer problemas. Mesmo que seja só por um dia, é importante formalizar um contrato”, diz. Outro aspecto que não pode ser esquecido no momento da formalização do contrato, segundo ele, é a lista com a relação de tudo que possui no imóvel, além de ser exigido o pagamento antecipado. Quem tem imóveis na Boca do Rio, aproveita para fazer uma grana extra nesse final de ano (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) “Recomendo, inclusive, que seja cobrada uma taxa caução para caso haja algum dano no imóvel. Todos os cuidados devem ser tomados, de preferência com a ajuda de um profissional da área”.

Mas não é só o proprietário que deve estar atento aos cuidados. O inquilino também deve prestar atenção a alguns detalhes antes de fechar negócio. “É preciso saber se o imóvel existe mesmo, porque há muitos golpes na internet de locação de imóveis que nem existem. É ideal visitar o local antes de alugar”, alerta.

Ocupação hoteleira esperada é de 100% Quase 461 mil turistas devem desembarcar em Salvador para o Festival Virada. O número representa um acréscimo de 7,2% comparado ao ano passado, quando a capital baiana recebeu 430 mil visitantes no período. A estimativa é da Secretaria  Municipal de Cultura e Turismo (Secult). Segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (Abih-BA), a região da Boca do Rio e o entorno reúnem pouco mais de oito mil leitos.   Na avaliação do secretário municipal de Cultura e Turismo, Claudio Tinoco, a grande procura por imóveis na região para o Réveillon ocorre também porque o parque hoteleiro de Salvador é insuficiente para atender a todas as demandas do período.“Os imóveis alugados e a casa de parentes têm sido uma alternativa. Com a migração do Réveillon para a  Boca do Rio, a área foi se consolidando e os proprietários de imóveis na região se programaram para oferecer essa hospedagem”, avalia Tinoco.A ocupação hoteleira esperada em Salvador este ano durante o Réveillon é de 100%. Segundo o presidente da Abih-BA, Glicério Lemos, a estimativa é que cresça 2,5% em comparação com o mesmo período do ano passado, quando a taxa foi de 97,5%: “Havia muitos anos que a gente não batia esse percentual, isso é muito positivo”.

Ainda segundo o estudo da Secult, dentre os turistas que virão para o Festival Virada, 232.158 são do interior baiano, 154.128 de outros estados e 74.676 de outros países, a maioria argentinos. A expectativa é que o turismo injete quase R$ 500 milhões na economia local no período. 

Na avaliação de Lemos, os primeiro leitos ocupados são os localizados no entorno da festa: “Além da orla da Boca do Rio, o turista recorre também aos hotéis da região do Stiep e da Tancredo Neves, pela proximidade da festa”. Apesar da estimativa de bater os 100% de ocupação, Lemos traz uma boa notícia para o turista que deixou a reserva para a última hora: ainda há vagas. “Ainda não estamos lotados, há muitos quartos, mas até lá vende tudo”, diz.

Mas é bom preparar o bolso: segundo ele, as diárias no período chegam a triplicar. “É a segunda data mais cara para hospedagem em Salvador, só perde para o Carnaval”. Já o mês mais festejado pelo trade é janeiro. Este ano, a ocupação esperada é entre 90% e 92%, o que representa um aumento de até 12% em relação ao ano passado, quando foi de 80,8%.  

Aumenta procura por imóveis no Litoral Norte Quem só decidiu agora buscar um imóvel para curtir o feriadão do Réveillon em uma das praias do Litoral Norte, pode preparar o bolso. Segundo o diretor do Creci, Noel Silva, de última hora, pode custar até 20% mais caro. E, mais do que o preço, na reta final não sobram muitas opções. Os destinos mais procurados são Praia do Forte, Guarajuba, Itacimirim e Imbassaí. “O campeão de preço é Praia do Forte”, ressalta.

A corretora de imóveis Adriana Santiago já fechou dez casas para  o Réveillon e, se surgir um cliente interessado, ela não tem mais como atender: “Aumentou muito a procura e diminuiu a quantidade de imóveis disponíveis para alugar. Perdi dez casas que alugava e foram vendidas”.

Apesar da procura, ainda é possível encontrar as últimas unidades. Segundo Adriana, um imóvel de 2/4 para até seis pessoas custa a partir de R$ 2,5 mil por três diárias.“Esse valor é em Arembepe e Barra de Jacuípe que são mais baratos. Praia do Forte e Guarajuba são mais caros. O Litoral Norte, hoje, é a Ilha de Itaparica das antigas. Se não quiser pagar R$ 5 mil, R$ 6 mil, vai pra Ilha”, diz.Já Solange Souza, da Qualy Imóveis, diz que, próximo à praia, já não é possível encontrar mais nada. “Alugamos os dez imóveis que tínhamos”. Segundo ela,  as diárias custam, em média, R$ 1 mil.

Dos 50 imóveis que a agência de aluguel por temporada Rent Brasil possui, só dois ainda estão disponíveis para locação na Reserva Imbassaí. Um deles é um apartamento de três suítes que acomoda até sete pessoas e custa R$ 8 mil o pacote com dez diárias. O outro é uma casa de quatro suítes, que acomoda até nove pessoas e custa R$ 15 mil por dez diárias. “Em outubro, já tínhamos fechado 70% das reservas, então restaram poucos imóveis. Foi um comportamento atípico”, avalia Samara Oliveira, responsável pelo setor de reservas da Rent Brasil.

Festas pagas: Salvador e Litoral Norte

Réveillon Sete Ondas Na Barraca do Lôro, na Praia do Flamengo, com animação de Magary Lord, Bailinho de Quinta e DJs. Ingressos custam R$ 300 com open bar e R$ 450 na categoria all inclusive.

Réveillon do Farol  Dentro do Farol da Barra, com animação da banda Pra Casar e de Dan Valente. Os ingressos do primeiro lote custam R$ 250 , com open bar premium, incluindo água, refrigerante, cerveja, vodka e uísque. 

Réveillon Celebre  Na Bahia Marina, com shows de Alexandre Peixe, Negra Cor e Dan Valente. Os ingressos do lounge custam R$ 500 e dão direito a um bufê preparado pelos restaurantes DASS, Soho e Lafayette e acesso  liberado no bar de água, refrigerante, água tônica, cerveja, vodka, gin, uísque e espumante.

Réveillon Maré Blú  Na  praia que leva o mesmo nome, em Vilas do Atlântico, Lauro de Freitas. A animação fica sob o comando de Saulo Fernandes e Durval Lelys e show de abertura da ÊaJack. Os ingressos da Arena Vibe são vendidos por R$ 250 a meia e  R$ 500 a inteira.

Melhor Réveillon do Mundo Na Arena Guarajuba com o axé da banda Eva, o sertanejo de Mano Walter e o Forró do Tico.  Os valores dos ingressos variam de acordo com o setor: arena  R$ 200, lounge R$ 520 e camarote R$ 870.

*Integrante da 13ª turma do programa Correio de Futuro, com supervisão da editora Mariana Rios