Café no Pelourinho pode fechar por conta de dívida com IPAC

O Café Conosco deve R$ 150 mil ao órgão, que se nega a negociar a dívida

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  • Daniel Silveira

Publicado em 6 de março de 2018 às 18:37

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Arisson Marinho/CORREIO

O Café Conosco, famoso reduto gastronômico e artístico do Pelourinho pode fechar as portas em breve. O motivo é uma disputa entre os proprietários do espaço e o Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Ipac). De acordo com Thiago Ferraz, sócio do local, em 2016 o órgão se reuniu com ele e a outra sócia, a chef Nilza Ribeiro, e entregou aos dois uma ordem de despejo expedida pela justiça. 

“A gente recebeu uma notificação de comparecimento ao IPAC e fomos saber do que se tratava”, explica. “Quando chegamos lá a advogada nos informou que já havia uma ação de despejo e uma dívida junto ao órgão”, completa. De acordo com Thiago, a dívida é referente a uma espécie de condomínio pago pelos inquilinos ao IPACm, que custa R$ 600. Segundo o instituto o Café deve R$ 150 mil.  Há doze anos no Pelourinho, o Café Conosco está ameaçado de fechar as portas por conta de uma  disputa com o IPAC, que acusa o café de ter uma dívida de R$ 150 mil reais (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Thiago conta que o valor nominal da dívida é de R$ 80 mil, referente às mensalidades acumuladas desde 2006, quando a primeira dona do café, a artista visual Fabiane Ribeiro teria sido isentada de pagar o condomínio pelo então diretor do IPAC, o antropólogo Júlio Braga. "Ela restaurou o casarão e ele ofereceu esse acordo", lembra.  Ainda segundo o sócio, o contrato foi feito “de boca”, sem nenhum documento. Por conta disso a dívida foi se arrastando ao longo dos anos e, junto com os juros, resultou no montante divulgado pelo instituto.

De acordo com o IPAC, o Café Conosco não é o único nessa situação. Em uma nota de esclarecimento enviada ao CORREIO, o órgão diz que, atualmente existem 381 contratos ativos de ocupação de espaços administrados por eles. Desses, 290 são remunerados sendo que 227 estão inadimplentes. Ainda segundo o instituto 131 estabelecimentos são comerciais e outros 96 residenciais.  Conforme nota foram 102 ações ajuizadas na Justiça da Bahia em 2012 para resolver o problema de inadimplência. Uma delas é do Café Conosco. 

“Durante o encontro no IPAC, perguntamos se a dívida poderia ser negociada, mas da parte deles não teve negociação, nos mostraram a ordem de despejo, as contas e disseram que eles precisariam fazer uma ligação entre as casas vizinhas para usar os casarões como prédio administrativo”, conta Thiago. O sócio diz que a solicitação de retirada deles está ligada a um futuro uso da casa pelo instituto. O IPAC nega que tenha interesse em ocupar administrativamente o espaço. O restaurante fica na Rua da Ordem Terceira, no bairro histórico e recebe turistas do Brasil e do mundo com uma exposição permanente de obras de Fabiane Ribeiro e outros artistas (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Thiago diz que voltou a procurar o órgão e até agendou reunião com o atual diretor do IPAC, o arquiteto João Carlos Oliveira, mas que não conseguiu se encontrar com o mesmo. “Só quem nos recebe é a advogada, a senhora Nadja, com essa postura sem negociação”, explica. O órgão se defende dizendo que disponibiliza atendimento para ocupantes dos seus imóveis todas as terças-feiras, das 8 às 12h, e das 13 às 17h. “Nunca e em nenhum momento o IPAC negou atendimento”, descreve em nota. No entanto, Thiago relata dificuldade em agendar um encontro. “O João nunca recebe ninguém, é muito difícil marcar uma reunião na terça e quando conseguimos, é sempre Nadja que atende”, diz.

Ponto de equilíbrio O Café Conosco funciona desde 2005 na Rua da Ordem Terceira. O restaurante e espaço cultural nasceu como um projeto da artista plástica Fabiane Ribeiro, filha de chef Nilza, que hoje comanda cozinha e é uma das sócias do local. “Fabiane restaurou tudo e quatro anos depois que ela fez isso, faleceu”, conta Thiago. O café virou uma galeria com obras de arte de Fabiane e outros artistas. “Recebemos gente do mundo inteiro, somos citados nos guias internacionais de oito países. Não se pode apagar uma história de vida como a nossa”, descreve. 

“Não é pela casa em si que estamos lutando, mas pela estrutura que criamos, não somos só um restaurante, aqui é um local de energia e cura”, relata Thiago. Ele conta que o espaço recebe encontros de mulheres e também é um lugara para terapias como reiki e massagens. “É um ambiente totalmente energizado, foi trabalhado para isso”, pontua.  A chef Nilza Ribeiro e o sócio Thiago Ferraz estão na justiça em busca do perdão da dívida de R$ 150 mil (Foto: Arisson Marinho/CORREIO) Mas para o IPAC a questão é financeira, sim. Em 2013 o Tribunal de Contas do Estado notificou o órgão sobre falta de práticas para gestão e cobrança de dívidas dos usuários dos espaços públicos. “A inadimplência tem um ato nocivo intrínseco a própria pauta, a falta de conservação destes imóveis, em relatório técnico de 2015, demonstrou o agravado estado de conservação de várias unidades”, aponta o órgão em nota ao CORREIO. 

Ainda de acordo com o IPAC a falta de conservação vem aliada a atos ilegais como a sublocação de imóveis a terceiros até pela Internet. “Para citar mais um exemplo, o restaurante Casa da Gamboa, por exemplo, representado agora pela empresa Itabrás Restaurante Ltda., chegou ao extremo do ilícito de querer 'repassar o ponto' do imóvel de propriedade do Estado oferecendo-o em ampla publicidade com fotos na Internet ao valor de R$ 300 mil para um possível novo ocupante, ato configurado crime”, revela a nota. Os proprietários da Casa da Gamboa foram procurados para dar explicação, mas não foram encontrados.

O processo corre na 7ª vara. “Vamos até a última instância e se assim for a vontade de Deus fecharemos as portas com dignidade e consciência de um trabalho de excelência realizado durante todos esses anos para a população soteropolitana e turistas”, conclui Thiago agradecendo o apoio dos amigos e clientes.