Camaçari: família diz que ialorixá morreu por infarto causado por perseguição

Uma vigília de evangélicos ficou à frente do terreiro na madrugada no dia da morte da ialorixá

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  • Da Redação

Publicado em 10 de junho de 2015 às 18:24

- Atualizado há um ano

A família da ialorixá Mildreles Dias Ferreira, 90 anos, que morreu no dia 1º de junho vítima de um infarto em Camaçari, afirma que a perseguição religiosa sofrida por ela causou sua morte. Conhecida como Mãe Dede de Iansã, ela comandava o terreiro de candomblé Oyá Denã há 45 anos. Os conflitos aconteciam há cerca de um ano, quando perto do terreiro uma igreja Casa de Oração Ministério de Cristo foi inaugurado.

Uma vigília de evangélicos ficou à frente do terreiro na madrugada no dia da morte da ialorixá. "Ficaram toda a madrugada gritando coisas como ‘afasta o demônio’, ‘limpa esse território do satanás e das forças malignas’. Ela passou mal, teve um infarto e morreu. No dia seguinte a família prestou queixa na polícia, mas a própria Mãe Dede já havia registrado uma queixa contra eles 15 dias antes de acontecer o ato de intolerância que levou à sua morte. Ela tinha 90 anos, mas era muito ativa", disse ao Terra Marcos Rezende, coordenador do Coletivo de Entidades Negras (CEN). (Foto: Arquivo Pessoal)A Secretaria de Promoção da Igualdade Racial da Bahia lamentou a morte de Mãe Dede e disse em nota que está acompanhando o caso. "Após ser comunicado de possíveis atitudes desrespeitosas à fé da ialorixá, o Centro de Referência de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa Nelson Mandela, órgão vinculado à Sepromi, acompanha o caso", diz o texto.

Além da denúncia na 18ª Delegacia, o caso também será levado ao Ministério Público. Ainda em vida, a família da ialorixá procurou outras organizações para denunciar o caso, como a CEN, que tem atuação em Camaçari.

Representantes da igreja não foram encontrados para comentar o caso, mas lideranças evangélicas negaram a intolerância. "A mídia fala em intolerância, mas, na realidade, não existe muito isso. Há um número insignificante, quase nulo, de pessoas praticando esses atos", disse Carlos de Oliveira, diretor da Associação dos Pastores e Ministros Evangélicos do Brasil.

A Comissão de Combate à Intolerância do Rio (CCIR) vai realizar um ato ecumênico em homenagem à ialorixá na Universidade do Estado do Rio, na próxima segunda. "Está muito claro que a intolerância culminou no seu falecimento. Essa senhora já tinha alguns prob lemas de saúde por ser idosa, mas adoeceu depois de sofrer esse assédio", disse Tata Tavares, coordenador municipal, a O Globo.

CasosDesde a criação do do Centro de Referência de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa Nelson Mandela, vinculado à Secretaria de Promoção da Igualdade Racial da Bahia, no fim de 2013, foram registrados 38 casos de intolerância religiosa, 11 deles apenas este ano."Com esses casos lamentáveis, pretendemos inaugurar um pacto de diálogo entre diferentes segmentos religiosos e encontrar um caminho. Temos de tomar os cuidados necessários para que, no futuro, o Brasil não tenha uma guerra santa. Não podemos perder a noção de nação com diferenças de cores e de credos", diz o coordenador do Centro Nelson Mandela, Walmir França, acrescentando que o órgão fará acompanhamento psicológico e social da família de Mãe Dede.