Capítulo final: piano é levado da casa de músico para endereço misterioso

Instrumento roubado, abandonado na Orla e resgatado foi devolvido sob comoção

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  • Fernanda Santana

Publicado em 11 de junho de 2018 às 19:22

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Marcos Clement/Arquivo pessoal

Uniram-se quatro ou cinco curiosos, dois músicos e repórteres, policiais e sete carregadores de piano. Do estacionamento, todos saudavam, fotografavam e registravam, como podiam, a despedida do piano Fritz Dobert. Do roubo ao abandono, do abandono à casa do músico Wilson Aragão, de lá, para um destino agora misterioso.

Nesta segunda-feira (11), Fritz deu adeus à vaga de número 21 de um condomínio de prédios na Orla de Salvador para ser guiado até a próxima residência. Ele se foi! Piano Fritz foi retirado de estacionamento nesta segunda-feira (Foto: Marcos Clement/Arquivo Pessoal) O piano preto de 88 teclas, rebaixado ao chão pelas três pernas quebradas, seria levado, até então, para um hotel abandonado, o Hotel Itapoã. Foi Fausto Mendes Batista, genro de Carlos Roberto Jesuíno dos Santos, empresário falecido e primeiro dono do instrumento, quem havia decidido.

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Mas, desistiu: o piano já havia sido roubado de um hotel fechado da família, o Hotel Atlântico, em Jardim Armação; levá-lo para outro, ele concluiu no último sábado (9), poderia ser “muita exposição”. Prefere não contar o próximo endereço:“É melhor não dizer, só que decidi mudar mesmo, para evitar exposição”, limita-se a dizer.Fritz precisou ser carregado por sete pessoas contratadas por Fausto até ser colocado em um caminhão baú. Mesmo lá, prestes a se despedir, foi tocado por Marcos Clement, músico que, junto ao amigo Wilson Aragão, o tirou da rua da Orla. A música produzida justo para a sua história pela dupla deu o tom da cerimônia improvisada.

“Foi bem divertido. Porque a gente tocou, tocamos a música dele, até fizemos uma parte nova para a canção”, disse Marcos. Festa para o piano: antes da despedida, um pouco de música (Foto: Marcos Clement/Arquivo Pessoal) A despedida do piano durou cerca de uma hora. De pouco antes das 11h a pouco depois do meio-dia. Nunca, na história, houve tamanha comoção na despedida de um piano. Adeus regado a música, alegria e um pouco de melancolia. Feitas as honras, seguiu para outro hiato silencioso. 

O caso Dois “sacizeiros” empurram, às duas da manhã de quarta-feira, um carro de compras. Dentro dele, um piano. Um taxista vê a cena, algo atípico em toda a sua vida, e a relata para Aragão pela manhã. “Ele me disse que os dois, mesmo bem fortes, não aguentaram o peso, e largaram ali mesmo, no meio da rua”, conta Aragão. Também pudera: o piano pesa, no mínimo, 300 quilos, calcula o músico. Tanto assim que, para ser retirado da rua, precisou do esforço dos quatro ajudantes.

Foi o músico quem avistou o piano abandonado na rua, entre 8h e 9h da última quarta-feira (6). Ele próprio relatou a história da descoberta do piano e pôs fim ao mistério do Fritz Dobbert perdido. “Passei pelo piano, mas nem sabia o que era. Quer dizer, achei que fosse coisa de marido e mulher mesmo, alguma briga dessas de jogar fora a coisa de outro. Depois, vi que era um piano mesmo. Não acreditei. Liguei para Marcos Clemente [outro músico] e ele falou: ‘a gente precisa fazer algo, bota ele aí na sua'”, lembra.Decidiu ligar também para a esposa, Mirian Aragão, 62. Ali mesmo, de frente ao piano descoberto da lona preta, a artesã conta o desespero do marido. “Ele ligou e me disse: Teco, tem um piano que aqui está prestes a ser jogado no lixo. Mas a gente tem que dar um jeito nisso aí. Eu respondi que sim, tínhamos que fazer alguma coisa mesmo”. Juntaram-se, contrataram um caminhão baú e levaram o piano para o estacionamento do condomínio onde moram Wilson e Mirian.

Mas, quem são os misteriosos ladrões? “Ah, o hotel está lá, abandonado, deve ter sido um sacizeiro [usuário de droga] qualquer que nada por ali”, opina o delegado ACM. “Quer dizer, um sacizeiro artista, né?”, brinca ele, em seguida. Até o momento, nenhum suspeito foi encontrado pela polícia, ainda conforme o delegado. 

O piano perdido estava no Hotel Atlântico desde o início da década de 80, quando foi inaugurado. Nos primeiros anos, era utilizado para eventos de música ao vivo para os hóspedes, no saguão do café da manhã. Pouco depois, sem explicar a razão, Fausto diz que os eventos pararam de acontecer. No entanto, ele diz: “Tem muito a agregar no valor do hotel”. 

*Com supervisão do chefe de reportagem Jorge Gauthier e do editor João Gabriel Galdea.