Carros milionários, multidão e cerveja barata: conheça o Baixo Itaigara

Rua Guillard Muniz vira point dos jovens que querem paquerar e exibir seus carrões

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  • Rafaela Fleur

Publicado em 1 de junho de 2018 às 12:07

- Atualizado há um ano

. Crédito: Renato Santana/Divulgação

O público fica em pé e dispensa mesas. A aglomeração é no meio da rua. É sábado à noite, por volta das 21h. Pelo meio da multidão, carros de luxo, como Porsche e Audi R8, pedem licença para desfilar. Não tem garrafa de São Jorge vendida por R$ 5 como no Largo da Dinha, no Rio Vermelho, mas, em um mês, um único bar vende 27 mil canecas de chope. Para centenas de pessoas, o reino da boemia é aquela área do Itaigara. Mais especificamente, a rua Guillard Muniz, entre os bares Preto, Boteco do Caranguejo e Primeira Opção.  No Baixo Itaigara cada cerveja é um flash (Foto: Renato Santana/Divulgação) Cadastre seu e-mail e receba novidades de gastronomia, turismo, moda, beleza, tecnologia, bem-estar, pets, decoração e as melhores coisas de Salvador e da Bahia:

A aglomeração de pessoas em pé, inclusive, inspirou um trocadilho com o Baixo Gávea, no Rio de Janeiro, onde acontece coisa semelhante. Além de citado por um funcionário de um dos bares que preferiu não ser identificado, a semelhança foi notada por um carioca que flanava pelo local. 

Ali, homens se enfileiram enquanto bebem suas cervejas long neck - latinha nem pensar. A maioria veste camisas polo com brasões e marcas destacados ou regatinhas apertadas. Já as moças, que não dispensam um bom vestido justo, aproveitam para tirar diversas selfies. Cada cerveja é um flash. O clima de paquera, claro, é inevitável. E tem trilha sonora: muito sertanejo universitário. 

A multidão fica à vontade. Só sai da pista quando abre alas para carros de marcas como BMW, Mercedes, Audi, Porsche e Camaro passarem. O desfile, que pode chamar a atenção de muitos, é rotina por lá. 

O empresário Leonardo Damiani, por exemplo, já está acostumado com o luxo. Além de ser dono de um Porsche Boxster S conversível, avaliado em cerca de R$ 300 mil, valor apenas 15% menor que o maior prêmio da Loteria Federal na última quarta-feira (9), ele é fundador do Driving Club Brasil, que funciona no posto Shell de Amaralina (Av. Amaralina, 441).“Somos um clube de amigos, um centro de estética automotiva premium, um lava a jato de luxo. Hoje,  o negócio se espalhou e chegam até pessoas que não conheço. Treinei e especializei funcionários para cuidar desse tipo de carro” explicou.Além de polimento, pinturas e customizações, eles trocam e vendem carros. Para fortalecer a amizade, encontram-se para assistir corridas de Fórmula 1 e fazem passeios de carrões pela cidade. O Baixo Itaigara, claro, é roteiro certo.  Os encontros de motocicletas, chamados de Quinta Sagrada, acontecem toda semana (Foto: Renato Santana/Divulgação) As motos também não passam batidas.  Alguns modelos que circulam por lá custam até R$ 80.000. É o caso da CBRR RR Fireblade. Lançada este ano pela Honda, a motocicleta é para poucos: no Brasil, existem apenas 25 exemplares. Um deles pertence ao empresário baiano Marcel Souza, 38.“Motos e cavalos são minha paixão desde que nasci. Também curto carros. Tenho uma picape por causa de minhas fazendas, viajo muito”, compartilha.Marcel é um dos integrantes da Quinta Sagrada, um grupo de motoqueiros que se reúne  na área toda quinta-feira. 

Quando começou Em 2009, o finado bar Munik Gourmet estava no auge. Segundo os entrevistados, foi com ele que a Guillard Muniz começou a bombar. Os outros foram surgindo depois.  O finado Munik Gourmet, onde hoje funciona o Boteco do Caranguejo (Foto: Reprodução/Facebook) Frequentador da área há mais de 8 anos, Renan, 27, costuma bater ponto no Preto, seu boteco favorito, toda semana. Às vezes, mais de uma noite.  “Quinta já bomba, mas sábado é o dia que mais lota. Chego sempre no mesmo horário, por volta das 20h”, comenta ele. E acrescenta que o movimento na área, que caiu com o fim do Munik, voltou a crescer há um ano e meio, depois que o Boteco do Caranguejo, instalado no mesmo local do antigo bar, foi ampliado. “A gente encontra amigos, vai transitando entre um e outro. É bom pra todo mundo”. 

Ivan Bastos, dono do Boteco e ex-funcionário do Munik, concorda. “Quando chegamos, tinha fila de espera de três horas. Na reforma, colocamos mais que o dobro do número de mesas e melhoramos a ventilação. Só que, com a ampliação, o público aumentou junto e hoje ainda tem fila.  Mas isso é bom, a relação entre os comerciantes é muito boa”, garante.

Thiago Hanna, um dos donos do Preto, confirma.“A rua influencia demais, movimento gera movimento. Temos praças em volta, facilidade de estacionamento, iluminação”, destaca ele, que gerencia o estabelecimento ao lado do sócio Gustavo Nilo.Público Fiel Cria do Rio de Janeiro, o estudante de engenharia civil Yago Sales, 22, desembarcou na capital baiana há um ano. Carioca da gema, como ele mesmo se define, adora um boteco de rua e virou cliente fiel da noite do Itaigara. Para Yago, a região é uma espécie de Baixo Gávea (um dos maiores redutos da boemia fluminense) com uma pitada de dendê. “Lá, a gente tem muito isso de ficar em pé na rua, bebendo cerveja com os amigos”, observa. Torcedor do Vasco, o jovem só faz questão de sentar na mesa para ver o time. E se o jogo for lá pelas 22h, a dica é se apressar. “Tem que chegar, no máximo, umas 19h pra conseguir”, assegura. 

Já Ingrid Albuquerque, 32, diz que se for pra gastar sola de sapato no meio da rua, prefere nem sair. “Não suporto ficar esperando e não gosto de ficar na rua. Gosto de sentar. Não sou muito de azaração, na verdade, estou cansada desse clima”, confessa a enfermeira, que revela ter “preguiça” dos homens que passam no local ostentando seus carrões. “Isso nunca me atraiu. Sinto uma vergonha alheia, na verdade. Mas tem gosto pra tudo, né?”, acredita.

Desconforto O clima de paquera, às vezes, beira o ofensivo. Principalmente para as mulheres. Puxadas de braço, tentativas de beijo e cantadas ruins costumam incomodar algumas delas. A estudante de Direito Isis Santos, 22, é um exemplo.

Moradora da Pituba, ela vai ao Boteco do Caranguejo sempre que pode. Porém, confessa que atração mesmo ela só sente pela cerveja gelada. “Venho porque é perto de casa e os preços são bons, mas não curto o público que frequenta. São pessoas pedantes e metidas. Os homens são babacas, têm cantadas péssimas”, revela. Deu para sentir na pele. Em uma das minhas visitas ao local, um gaiato propôs até trocar a entrevista por um beijo. Não rolou.

A engenheira ambiental Maria Clara Dias, 27, frequenta há quase dez anos e diz que isso acontece com frequência. “Vários caras sem noção ficam chegando em você do nada. Acham que aquilo ali é micareta, e não é. Tem gente que vai pra caçar, mas também tem quem só quer ficar tomando uma”, relata ela.

No que tange diversidade, Isis confessa que quase nunca  vê casais homossexuais por lá. “É diferente de vários lugares do Rio Vermelho, por exemplo, onde o público é mais alternativo e mais mente aberta, veem casais gays com naturalidade, ninguém recrimina ninguém. Acho que rola esse preconceito mesmo”, diz. 

Durante cerca de quatro horas no local, encontramos apenas um casal gay. José Pinheiro e João Maurício, ambos de 18 anos, nunca tinham ido antes. E as opiniões sobre o lugar divergem. “Estou achando legal. Não me identifico com o público, mas achei divertido”, declarou José. Já João Maurício confessa estar arrependido. “Não gostei, é péssimo. Essa escolha foi um erro”, concluiu.

Comidas e bebidas Drinques variados e petiscos não faltam por lá. Apreciadora assumida de chope, Ingrid confessa que esse é um dos melhores atrativos do lugar. “Tomei um chope no Preto e percebi que foi o melhor que já tinha tomado na vida. Me ganhou”, relembra. A taça da Heineken, única marca vendida no bar, custa R$ 5,90. Às terças, é dobrado. Para comer, o filé mignon ao molho gorgonzola faz sucesso. “Só peço ele. É maravilhoso” indica Renan. A porção para duas pessoas custa R$ 25,90. No Preto, só tem chope e long-neck da Heineken (Foto: Shutterstock/Reprodução) Já no Boteco do Caranguejo, todos os dias tem uma promoção diferente. A caipirinha, muito querida pelos visitantes, custa R$ 7,90. A porção de queijo coalho com abacaxi grelhado custa R$ 16,90.   Siga o Bazar nas redes sociais e saiba das novidades de gastronomia, turismo, moda, beleza, decoração e pets: *Com orientação do editor Victor Villarpando