Cinco pessoas são beneficiadas com órgãos de jovem morto na Graça

Todos os pacientes são da Bahia e estavam aguardando na fila pelas doações

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  • Gil Santos

Publicado em 17 de fevereiro de 2018 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Arquivo pessoal

Cinco pacientes que sofriam na fila de espera de transplante foram beneficiados com a doação dos órgãos do estudante Kaíque Moreira Abreu, 22 anos. O jovem morreu depois de ser agredido quando voltava do Carnaval, no bairro da Graça, na sexta-feira (9). Ele foi socorrido com vida, mas teve morte cerebral cinco dias depois.

Segundo a coordenadora da Central de Transplantes da Bahia, Rita de Cássia Pedrosa, foram transplantados os dois rins, o fígado e as duas córneas do estudante. Os transplantes aconteceram nesta sexta (16), uma semana depois do jovem ser agredido.

"Eram pacientes que estavam aguardando na fila por rins, fígado e córneas. Não podemos aceitar a doação do coração porque a vítima teve uma parada cardíaca, nem os pulmões porque ele ficou muito tempo no hospital, cerca de uma semana. Os outros cinco órgãos foram transplantados hoje (sexta) e todos os pacientes passam bem. Ele (Kaíque) ajudou a salvar cinco vidas", afirmou. Kaíque cursava o 7º período de Engenharia Mecânica (Foto: reprodução) Rita Pedrosa esteve no sepultamento do corpo de Kaíque, nesta sexta, no cemitério Bosque da Paz. Ela levou rosas para o estudante e também para a mãe, o pai e o irmão dele. A ação foi um agradecimento em nome dos cinco pacientes que foram beneficiados com os órgãos do jovem. "Eles agradeceram pela solidariedade", contou a médica.

Por uma questão ética, os nomes das pessoas beneficiadas e dos hospitais onde os procedimentos aconteceram não podem ser divulgados, mas todos os órgãos foram transplantados na Bahia e para pacientes baianos.

A família de Kaíque decidiu fazer a doação depois que lembrou que o estudante comentou com a mãe dele, no ano passado, que quando morresse gostaria que seus órgãos fossem doados.

Bahia diz ‘não’ em 70% dos casos Apesar de nobre, a doação de órgãos não é comum na Bahia. Segundo a Secretaria da Saúde do Estado (Sesab), apenas 30% dos familiares autorizam o procedimento, o que coloca os baianos entre os três estados com o maior índice de negativa familiar para a doação de órgãos no país. Os especialistas acreditam que isso se deve a uma questão cultural que está atrelada à falta de informação.

Em média, os pacientes levam dois anos aguardando por um órgão, mas essa espera é maior em muitos casos porque nem sempre o doador é compatível. A Bahia está credenciada para fazer tranplantes de rins, fígado, córneas, coração, pulmão e medula óssea. Atualmente, além de Salvador, os municípios de Feira de Santana, no Centro-Norte, e de Itabuna, no Extremo-Sul, também realizam esses procedimentos. Familiares de Kaíque durante o sepultamento (Foto: Arisson Marinho/ CORREIO) Contra o tempo Depois da morte, o coração e o pulmão precisam ser transplantados em até 4h. O fígado resiste por 6h. Já o rim pode ser aproveitado de 24h a 36h. A córnea é o mais resistente, podendo ser transplantado em até 12 dias após o falecimento. Nos casos de morte cerebral é preciso aguardar 6h após a constatação para que seja iniciado o procedimento de doação. Para que o transplante seja realizado são feitos, pelo menos, três exames: dois clínicos e um de imagem, para verificar a qualidade do órgão.

Na capital, as unidades que realizam esses procedimentos são: Hospitalar Professor Edgard Santos (Hospital das Clínicas), no Canela; Hospital Ana Neri, no Pau Miúdo; Hospital Santa Izabel, em Nazaré; Hospital Português, na Barra; e Hospital São Rafael, em São Marcos. O Hospital Geral Roberto Santos, no Cabula, foi o último a ser credenciado para fazer os transplantes, mas ainda não começou os atendimentos.

A doação de órgãos e tecidos é gratuita. Quem tiver dúvidas sobre o procedimento pode entrar em contato com a Central de Informações pelo número: 0800 284 0444. É importante também conversar com os familiares e deixar claro o desejo de ser doador. Segundo os médicos, cada doador pode salvar, pelo menos, sete vidas. Amigos de kaíque fizeram uma camiseta com a foto do estudante (Foto: Arisson Marinho/ CORREIO) O crime Às 23h30 da sexta-feira de Carnaval, Kaíque saiu da casa de um amigo, na Rua Manoel Barreto, no bairro da Graça, na companhia de um primo e mais três amigos para o circuito Dodô (Barra/ Ondina). Durante a folia, ele se perdeu do grupo e decidiu voltar para casa, sozinho. Às 3h, o estudante estava a menos de 500 metros do imóvel quando foi surpreendido com um soco no rosto. Ele caiu e ainda levou um chute do agressor. Toda a ação foi registrada por uma câmera de segurança.

Nas imagens, é possível ver quando um homem se aproxima de Kaíque e acerta o estudante. Em seguida, o agressor chuta a vítima e foge com outras quatro pessoas em um caminhão. O homem foi identificado como sendo o pintor Edson Rodrigues dos Santos, 27, que confessou o crime. Ele disse que estava com raiva porque foi agredido no Carnaval e precisava descontar em alguém. Delegados responsáveis pela investigação do caso (Foto: Almiro Lopes/ CORREIO) Segundo a polícia, dois adolescentes estavam com Edson no momento do crime, além do motorista do caminhão e de outro homem. A titular da 14ª Delegacia (Barra), Carmen Dolores, contou que o grupo também estava voltando do Carnaval.

"Edson encontrou com um dos adolescentes, 15 anos, no Carnaval. Todos moravam no mesmo bairro e o menor disse para ele que estava de carro com uns amigos, e perguntou se ele queria carona. No momento do crime, é possível ver Edson e o adolescente caminhando lado a lado, enquanto os outros três seguem pessos à frente. Ele se aproxima da vítima e dá o soco, sem motivo. Depois disso, todos entram no caminhão e fogem", contou a delegada. Edson contou que agrediu o jovem porque estava com raiva (Foto: Almiro Lopes/ CORREIO) Prisão A polícia chegou até o grupo depois de identificar a placa do caminhão. O motorista Bruno Ribeiro Fernando Batista, 30, foi o primeiro a ser encontrado e levou os investigadores até a casa de Edson, na Capelinha de São Caetano. O pintor foi preso em casa. O adolescente de 15 anos também foi localizado e levado para a Delegacia do Adolescente Infrator (DAI). O outro homem e o outro adolescente que estavam com o grupo quando tudo aconteceu foram identificados e serão ouvidos nos próximos dias.

Kaíque foi socorrido por uma família que passava pelo local. Uma das pessoas que ajudaram com o socorro era uma médica. Ela tentou reanimar o jovem enquanto aguardava a chegada do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), o que aconteceu às 3h30. O estudante não levou o celular para a festa com receio de ser assaltado, por isso, a pessoa que prestou socorro tentou localizar algum familiar do jovem através das redes sociais.

"Esse anjo que ajudou no socorro viu os documentos dele e, através do nome, conseguiu achar uma prima de kaíque nas redes sociais. Ela contou que ele foi encontrado desacordado na rua, e foi assim que ficamos sabendo dessa tragédia", contou o amigo do estudante, o microempresário Igor Aquino. O jovem morreu cinco dias depois de ser agredido. Edson confessou o crime (Foto: Almiro Lopes/ CORREIO) Nesta quinta (15), a Justiça decidiu manter Edson preso. Ele foi indiciado por homicídio e encaminhado para o Complexo Penitenciário da Mata Escura. O motorista Bruno e o outro homem vão responder por omissão de socorro e favorecimentos pessoal. Os dois adolescentes serão ouvidos pela Delegacia do Adolescente Infrator (DAI).