Com cruzeiros suspensos, mais de 46 mil turistas deixarão de visitar Salvador

Dez navios passariam pela cidade até 21 de janeiro

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  • Da Redação

Publicado em 5 de janeiro de 2022 às 05:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Divulgação

Os recentes surtos de covid-19 em todos os cinco navios que operavam no litoral brasileiro, sendo um deles no porto de Salvador, fizeram com que as companhias de cruzeiros tomassem a iniciativa de suspender suas operações no país até o dia 21 deste mês. Com isso, mais de 46 mil turistas que passariam por Salvador, em dez viagens, tiveram os planos interrompidos, segundo dados da Companhia das Docas da Bahia (Codeba).  

O comunicado da suspensão foi feito pela Associação Brasileira de Navios de Cruzeiros (Clia) na segunda-feira (3). A ação teve caráter voluntário porque a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) recomendou, e não determinou, o término da temporada de cruzeiros, quando 800 casos de covid-19 foram identificados em apenas nove dias. (Foto: Marina Silva/CORREIO) Também na segunda, a agência atendeu um pedido da Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (Sesab) e decidiu que navios de cruzeiro não poderiam atracar nos portos de Salvador e Ilhéus temporariamente. 

Antes que os navios voltassem a operar na costa brasileira, a Anvisa determinou que um protocolo sanitário fosse seguido. Entre as medidas estavam a comprovação de vacinação completa contra a covid-19, obrigação de apresentação de teste tipo RT-PCR negativo feito em até 72 horas antes do embarque, além de testagem diária de 10% dos passageiros e de 10% da tripulação.

A decisão de suspender até o final do mês a temporada dos cruzeiros, apesar de ser um sinal positivo para o controle da pandemia, representa uma perda substancial para o turismo local. Segundo o secretário de Turismo da Bahia, Maurício Bacelar, cada passageiro de um navio de cruzeiro gasta, em média, 100 dólares ao desembarcar em Salvador. Em reais, o valor passa a ser R$ 569, 00. 

“Esse é um dinheiro que rapidamente circula na economia. Tanto no setor informal informal, com o vendedor de água mineral e souvenir, até na convencional, num restaurante ou em uma loja, onde o cruzeirista realiza a despesa. Então é uma perda muito grande na economia”, afirma o secretário. 

Maurício Bacelar lembra ainda que um protocolo foi elaborado em conjunto com a Anvisa para que os navios de cruzeiro pudessem voltar a operar, mas que a decisão foi tomada antes da descoberta da variante Ômicron, mais contagiosa que as outras: “O protocolos devem ser aperfeiçoados nesse novo cenário para que os cruzeiros possam ser retomados. E se for possível ter protocolos que possam ser elaborados para proteger as pessoas que estão nos navios sem o risco de se contaminar e contaminar os outros”. 

O secretário reitera que colocar a saúde em primeiro lugar e proteger vidas é essencial. Já a Sesab, que solicitou à Anvisa a suspensão antes que fosse acatada pelos cruzeiros, afirma que a precaução é importante, uma vez que a variante Ômicron ainda não foi detectada em solo baiano. Além disso, a secretária de Saúde da Bahia, Tereza Paim, lembra que a situação de emergência decorrente das chuvas em 166 municípios baianos é prioridade.

Perdas para a capital

Durante a temporada dos navios de cruzeiro, entre dezembro e abril, a expectativa era que Salvador recebesse cerca de 100 mil turistas, que injetariam na economia local por volta de 60 milhões de reais, segundo o secretário municipal de Turismo. Fábio Mota lembra que a cidade é muito dependente do setor turístico, que vem apresentando uma retomada, com números parecidos com os de 2019.

“É uma medida acertada, levando em consideração o que estamos vivendo na pandemia, não critico a decisão, mas a gente lamenta porque temos uma perda econômica na cidade. Temos a esperança de que no dia 21 seja realizada a retomada”, diz. 

Fábio Mota defende que o problema “não é o protocolo”, uma vez que ele foi capaz de detectar os casos de covid-19 nos navios: “O protocolo está correto, o problema é que estamos vivendo uma alta de casos no Brasil e no mundo inteiro por conta da nova variante”. 

O CORREIO tentou entrar em contato com a secretaria de Saúde de Salvador para saber sua posição a respeito da suspensão, no entanto, não houve retorno até a finalização desta reportagem. A Companhia de Docas do Estado da Bahia também foi procurada e não retornou.

Explosão de casos

Em 55 dias de temporada, até o dia 25 de dezembro, foram 31 casos confirmados de covid-19 entre tripulantes e passageiros das cinco embarcações que operam no Brasil. Mas, nos últimos nove dias, entre o dia 26 e o dia 3 de janeiro, 798 casos foram diagnosticados, dentre os quais 60% em tripulantes, segundo dados da Anvisa. 

A agência reguladora afirma que foi o aumento exponencial do número de casos que motivou a recomendação para a suspensão temporária. A Anvisa ainda afirma que a maior quantidade de infecções em tripulantes agrega maior grau de risco à condição sanitária desses navios, porque esses viajantes ficam mais tempo a bordo. 

Ilhéus

No Porto de Ilhéus, no sul do estado, eram aguardadas 34 paradas de navios, no período entre dezembro de 2021 e abril de 2022. Mas, a suspensão temporária da temporada não pegou o município de surpresa. O secretário de Turismo Fábio Cavalcante explica que o protocolo elaborado pela Anvisa, governo do estado e município previa como prosseguir em casos de surtos de covid-19. 

“Já era algo que poderia acontecer, apesar de não ser o nosso desejo. Queríamos que todos os passageiros chegassem bem para usufruir da cidade e aquecer a nossa economia, mas a questão da saúde vem em primeiro lugar”, diz Fábio Cavalcante.  (Foto: Reprodução/Prefeitura de Ilhéus) Os turistas que chegam em Ilhéus costumam visitar o centro histórico, praias e também vivenciam as etapas de produção do cacau e do chocolate, por meio de visitas a fazendas e fábricas. Por isso, a suspensão protege os moradores locais da contaminação da covid-19.

André Cezário, secretário de Saúde de Ilhéus, também lembra que os protocolos foram determinados e seguidos para que a disseminação do vírus pudesse ser controlada dentro dos cruzeiros e que, apesar de o cenário não ser oportuno, as questões sanitárias devem ser prioridades. 

Direito dos passageiros 

Com a suspensão das atividades dos navios de cruzeiros até, pelo menos, o dia 21 de janeiro fica a dúvida: quais são os direitos dos passageiros que tiveram a viagem cancelada? O advogado Ivan Pires, que atua na área de Defesa do Consumidor, explica que o cliente pode escolher entre obter crédito junto à empresa (aceitar outro produto ou serviço equivalente) ou receber a devolução do dinheiro gasto. Caso escolha a segunda opção, a empresa deve restituir o valor integral e monetariamente atualizado:

“Os clientes devem ser ressarcidos integralmente por todos os prejuízos que tiveram devido ao cancelamento. Ou seja, além da passagem e dos pacotes efetivamente comprados, também tem as questões de reserva de hotel e voos, que o consumidor também pode ter o direito de ser ressarcido”, ressalta o advogado. 

Mas é importante tomar cuidado porque caso o cliente deseje cancelar a viagem após o dia 21, ou quando houver a retomada, pode ter que arcar com multa. Por isso, é importante verificar as condições contratuais específicas de cada caso. 

Ivan Pires lembra ainda que até o dia 31 de dezembro havia uma legislação provisória em vigor, que regulamentava que eventos poderiam ser remarcados sem ônus para as empresas. Mas agora, as empresas não podem mais alegar o desconhecimento da pandemia e devem arcar com os prejuízos. 

A Costa Cruzeiros, responsável por operar os navios Costa Diadema e Costa Fascinosa, sendo o primeiro deles o que ficou parado no porto de Salvador, confirmou que suspendeu voluntariamente seus cruzeiros. Segundo a empresa, é oferecida aos clientes a opção de transformar o valor pago pela viagem em um voucher de crédito a ser utilizado até o último dia de 2022, para embarques até 30 de junho de 2023.

O consumidor também pode optar pelo reembolso de todo o valor pago pelo cruzeiro a ser executado nos prazos da lei. A Costa Cruzeiros afirma ainda que a decisão de suspensão visa permitir que a Associação Brasileira de Navios de Cruzeiros trabalhe para encontrar um alinhamento com o governo federal, no que diz respeito aos protocolos sanitários. A reportagem tentou contato com a MSC Cruzeiros, mas não obteve retorno.

Cláudio Brites, gerente da Contermas, que administra o terminal marítimo de Salvador, salienta que a empresa realizou todos os procedimentos conforme o plano de contingência aprovado pela Anvisa e pelo governo federal e lembra que a decisão de suspensão foi voluntária.

“Entendemos que haverá um impacto financeiro negativo na economia de Salvador, já que cada turista em um único dia na cidade, gasta, em média, R$ 500,00. O que reafirma a importância de se avaliar com cautela as atuais circunstâncias”, completa.

*Com a orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro.