Comerciantes de Salvador ainda contabilizam prejuízos com apagão

Empresária acredita ter perdido 840 kg de peixes avaliados em R$ 5 mil

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  • Tailane Muniz

Publicado em 22 de março de 2018 às 17:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Mauro Akin Nassor/CORREIO

Margarida dos Santos com mercadoria que descongelou após blecaute (Foto: Mauro Akin Nassor/CORREIO) Mais de cinco horas sem luz e um prejuízo que a comerciante Margarida Silva dos Santos, 54 anos, não esperava. O apagão que atingiu a Bahia e outros 12 estados, deixando cerca de 70 milhões de brasileiros sem luz, nesta quarta-feira (22), pode ter provocado a perda de 840 kg de peixe na mercearia de Margarida, a Coisas do Mar, localizada no Engenheiro Velho de Brotas, em Salvador. 

Isso porque, de acordo com a proprietária do estabelecimento, os peixes acabaram descongelando parcialmente e gerando o que pode ter causado um amolecimento da carne e, consequentemente, apodrecimento do material. Se a suspeita de Margarida se confirmar, o prejuízo pode chegar a R$ 5 mil. Isso além de R$ 2 mil de uma balança especial para pesar frutos do mar, que acabou queimando na hora do blecaute. "Estamos aguardando para ver mas, pelo aspecto, não temos tanta esperança. O peixe é um produto que não pode passar por este processo de congelamento e descongelamento. Quando ele congelar totalmente, aí saberemos se sim ou não", explica Margarida.Além dos frutos do mar, a comerciante também vende frango, mas esses, por sorte, diz ela, não chegaram a descongelar.

Fundada há 36 anos, a Coisas do Mar já havia sofrido prejuízo por falta de energia. "Faz três meses que perdi duas balanças, cada uma avaliada em R$ 4 mil, então já sofremos com isso antes. Fora a clientela que desaparece, óbvio", disse a comerciante, acrescentando que optou por fechar a mercearia."É um problema enorme porque, imagine, a gente tem um prejuízo desses, que é enorme, e quem vai arcar com isso", indaga Margarida.A queda no fornecimento de energia para as regiões Norte e Nordeste foi causada por falha em um disjuntor na subestação do Xingu, no Pará, responsável pela distribuição da maior parte da carga gerada pela Usina de Belo Monte para a Região Sudeste.

A informação foi divulgada na noite desta quarta (21) pelo diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), Luiz Eduardo Barata Ferreira. Leia também: Após apagão, 24 bairros de Salvador e outras seis cidades estão sem água

Também em Brotas, onde a energia caiu por volta de 15h45 e chegou a oscilar pelo menos duas vezes, a proprietária do mercadinho Fluminense, Maria Creusa Bispo, 52, relatou que também ficou prejudicada pela falta luz.

Embora não tenha perdido nenhuma mercadoria, Maria lamentou que o apagão tenha ocorrido justo na quarta-feira. Isso porque, de acordo com ela, é o dia em que o carro-chefe do estabelecimento são os jogos da loteria esportiva."É que [dia de quarta-feira] o sorteio é federal, então muita gente joga. Nós ainda conseguimos realizar alguns jogos, porque nossa máquina estava totalmente carregada, mas, por problemas no sinal, também em decorrência da energia, o sistema travou muito", comentou ela, que estima ter perdido metade dos 50 jogos que costuma fazer num período de cinco horas.Ainda conforme Maria, o mercadinho Fluminense permaneceu aberto durante as cinco horas em que Salvador ficou no escuro. "Não fechamos porque estava movimentado. Não nos sentimos inseguros a ponto de baixar as portas, mas, claro, sabemos que tivemos prejuízo, mas nem quisemos calcular esse valor. Importante é que a luz voltou e já está tudo normalizado", pondera. Maria Creusa é proprietária de mercadinho em Brotas (Foto: Mauro Akin Nassor/CORREIO) Pelo menos 50 picolés e 200 bolas de sorvete deixaram de ser vendidos pelo comerciante Álvaro Rocha, proprietário da sorveteria Doce Sabor, no Garcia, nas cinco horas em que ficou sem luz. Ele, que vende cada picolé por R$ 1,50 e quatro bolas de sorteve por R$ 3, estima um prejuízo de, pelo menos, R$ 225. Além do que deixou de ganhar, Álvaro perdeu dois potes de sorvete e 100 picolés de valores diversos. 

"Confesso que ainda não calculei essa parte, porque é realmente triste parar pra pensar. Tive sorte porque são produtos que eu consegui recuperar. Precisei ficar aqui até a madrugada organizando as coisas e tentando salvar tudo", comentou ele, que produz a própria mercadoria. 

Álvaro comentou que o fato de fazer o sorteve e o picolé no local foi o que o "livrou" de um prejuízo maior. "Sim, porque eu vi que faltou energia, já parei com a produção. Não utilizei muitos dos ingredientes, senão o prejuízo teria sido muito maior. O estoque de produtos também não costuma ser grande: geralmente fazemos a demanda do dia. Porque se eu comprasse pronto, por fora, teria agora uma bomba nas mãos", disse, aliviado. 

Mais transtornos Em nota enviada à imprensa, o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) informou que decidiu suspender os prazos processuais de quarta-feira (21) em função da falta de energia. Segundo o TJ-BA, a medida evita amenizar possíveis transtornos de acesso aos sistemas processuais. O decreto Judiciário, ainda de acordo com a corte, será publicado no Diário da Justiça Eletrônico desta sexta (23), oficializando a suspensão dos prazos.

O apagão resultou também em transtornos nas unidades policiais. Na Delegacia de Repressão a Furtos e Roubos (DRFD), na Baixa do Fiscal, a escuridão predominou na recepção, salas dos delegados e do Serviço de Investigação (SI).

Os presos reclamaram do breu e os agentes do plantão tiveram que improvisar. "Não tivemos escolhas. Para evitar um problema maior na carceragem, distribuímos algumas velas. Apesar de aqui ter poucos presos, eles estavam muito agitados", disse um agente, que não soube responder sobre o risco de os detentos estarem expostos às chamas. Segundo o policial, a DRFR tem hoje 15 custodiados. "Tivemos época de ter 30, 40 presos no xadrez. Hoje está tranquilo", complementou.

Ao lado da DRFR funciona o Grupo de Repressão a Furtos e Roubos a Coletivos (Gerrc). Como a carceragem da unidade está interditada, os presos são abrigados na DRFR.

"Quando houve o apagão, isso aqui virou um inferno de tanto calor. Algumas pessoas não tiveram paciência em aguardar a normalização e foram embora. Outras aguardaram, mas eram pouquíssimas pessoas", relatou outro policial.

Polo também parou A assessoria do Comitê de Fomento Industrial de Camaçari (Cofic), que gerencia o Polo Industrial de Camaçari, na Região Metropolitana de Salvador, informou ao CORREIO nesta quinta que ainda não tem uma estimativa do prejuízo provocado pelo apagão e consequente paralisação das atividades no local.

Os funcionários foram liberados meia hora antes do fim do expediente por conta da queda de energia. Nesta quinta não foi identificado nenhum problema, a exemplo de máquinas danificadas, nas empresas.

Clareou O serviço de energia elétrica foi completamente restabelecido em Salvador e Região Metropolitana às 20h48, exatamente cinco horas após o início do apagão iniciado às 15h48 e que também atingiu o interior da Bahia, além de outros 12 estados. Na capital baiana, de acordo com a assessoria da Coelba, a energia foi completamente restabelecida às 20h17, 4h29 minutos após o início do blecaute.

Diretor-geral do ONS, Barata disse nesta quinta (22) que o apagão não significa fragilidade no sistema elétrico brasileiro. "Apesar do distúrbio de ontem (quarta), temos absoluta convicção das condições de suprimento de energia no país", afirmou. "Quero deixar clara a nossa convicção de que o distúrbio não pode e não deve significar qualquer tipo de fragilidade no sistema". 

Na visão do ONS, o sistema é "robusto" e dispõe de energia suficiente. Barata explicou que houve uma expansão na geração e transmissão de energia, enquanto o consumo ficou estável com a crise econômica dos últimos anos."A nossa expectativa é que em 10, no máximo 15 dias, possamos divulgar exatamente o que aconteceu. As causas e as consequências e quais são as medidas que vamos tomar", afirmou o diretor-geral.