Como foi a festa de 80 anos de Jorge Amado, que levou estrelas e multidão ao Pelô

Caetano Veloso, Maria Bethânia, Gal Costa e Gilberto Gil cantaram para escritor há exatos 30 anos; relembre

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  • Da Redação

Publicado em 14 de agosto de 2022 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Claudionor Júnior/Arquivo CORREIO

Quando Jorge Amado, cansado de guerra, nos deixou em 6 de agosto de 2001, Caetano Veloso recebeu a triste notícia antes do bis de um show na Concha Acústica, ocasião em que comemorava o próprio aniversário de 59 anos, completados dia 7. Péssimo presente, mas no dia seguinte, o da sua festa, o cantor refletiu sobre aquilo tudo. “Isso é a festa do meu aniversário, e é a festa da vida de Jorge Amado. Concluiu-se ontem a vida de Jorge Amado, e até chorei um pouquinho ali dentro, antes de vir pr’aqui, mas depois, eu pensando nele... Ele é a vida dele, não é a morte dele. Um homem que foi tão feliz, e soube expressar tão bem a felicidade com a vida, a gente, mesmo chorando, só pode comemorar”, disse noutra apresentação. 

Três dias depois, o escritor, a quem Caetano chamou de “maior personalidade da Bahia”, completaria 89 anos. O show acabou antes, mas o outro leonino, também uma das maiores personalidades dessa terra, continuou. Trinta anos depois, Caetano completou 80 anos, com várias homenagens e show no Rio ao lado dos filhos e da irmã, Maria Bethânia. A festa, entretanto, não chegou perto da série de eventos que marcou os 80 anos de Jorge, na Bahia. Mas o ponto alto, para unir as pontas, foi justamente o show que reuniu os próprios Caetano e Bethânia, ao lado de Gal Costa e Gilberto Gil, no Pelourinho.

Há três décadas, os Doces Bárbaros – sem ser Doces Bárbaros oficialmente – se juntaram para homenagear o escritor, diante de uma plateia de 15 mil pessoas, incluindo o próprio Jorge Amado. O registro está na edição do Correio da Bahia de 10 de agosto de 1992, que destaca toda a mobilização em torno da celebração. “Nem a chuva que começou a cair em Salvador atrapalhou a alegria de milhares de pessoas que se espremiam no Largo do Pelourinho. Jorge Amado, Antonio Carlos Magalhães [então governador] e autoridades acompanharam as apresentações da sacada da Casa do Senac, ao lado do palco montado para o evento”, cita a reportagem sobre a noite dos parabéns em frente à Fundação Casa de Jorge Amado.

Embora hoje seja mais comum os palcos, no local, serem montados virados para a parte de baixo da ladeira, nessa ocasião a configuração teve de ser diferente, para que os artistas não dessem as costas ao casarão azul bebê que abriga parte da obra do escritor itabunense. “Os shows que fazem lá agora são virados para baixo, mas nessa vez botaram no meio da ladeira, virado para cima, o que diminuiu muito a capacidade de público”, recorda a servidora pública Stella Santos, hoje com 57 anos, que acompanhou o espetáculo se acotovelando numa área perto do camarote do escritor. “Lembro que fomos eu e uma prima, e ficamos cantando ‘Chove chuva’, de Jorge Benjor, porque caiu uma chuva e a gente tava vestida de branco. (...) O ponto alto do show, pra mim, foi Gal e Bethânia cantando ‘Sonho Meu’, e claro, quando cantaram as músicas inspiradas na obra de Jorge”, relembra. Multidão se espremeu no Largo do Pelourinho para acompanhar apresentações (Foto: Claudionor Júnior/Arquivo CORREIO) A reportagem destaca as saudações ao novo octogenário, vindas do palco e da plateia, muitas delas correspondidas com acenos. “Mais de 15 mil pessoas lotaram o Pelourinho numa comemoração que reuniu som, suor e muita alegria. Do alto de seus 80 anos, o aniversariante recebia da sacada as reverências do público e dos artistas que iam se revezando para as apresentações. Caetano Veloso, Maria Bethânia, Gal, Gil, família Caimmy, entre outros, não se importaram com a fina chuva que caiu durante e fizeram a festa da massa humana que prestigiou o evento”, menciona o texto.

A cantora Daniela Mercury e o sambista Batatinha, falecido em 1997, foram “outros” que subiram ao palco para saudar o ídolo e amigo. Ele se impressionou com o ‘cast’. “Essa é a maior reunião de artistas brasileiros dos últimos tempos. A última vez que vi tanta gente boa no palco foi em 1984, na Itália, em um evento chamado Bahia de Todos os Sambas. Esta festa de hoje é do tamanho da grandiosidade do Jorge”, disse Batatinha ao jornal. 

Muito além do show A programação dos 80 anos não ficou restrita ao show. Na verdade, durou cerca de um mês, com muita coisa acontecendo no próprio Pelourinho e em outros pontos, como lembra o jornalista Antonio Moreno, que prestou serviço de assessoria para a Fundação Casa de Jorge Amado na ocasião. “Teve muita coisa durante o mês, como o lançamento da revista Exu, um simpósio internacional no Hotel da Bahia... Lembro que lá ficaram hospedados muitos jornalistas, muita gente de fora do país, e pessoal da imprensa nacional. Foi uma cobertura gigantesca”, recorda. Jorge Amado entre o então governador, Antonio Carlos Magalhães, e o ex-presidente José Sarney (Foto: Claudionor Júnior/Arquivo CORREIO) Além do ex-presidente José Sarney, que veio a Salvador especialmente para prestigiar as festividades – ficou quase todo o show ao lado do escritor e de ACM, no Senac –, oito países mandaram equipes para cobrir a festa para Jorge na Bahia: Chile, México, Argentina, Itália, Alemanha, Estados Unidos e Bolívia. 

No cardápio de homenagens, também teve exposição de gravuras de Calazans Neto, e de fotografias da escritora Zélia Gattai, além de festival de filmes, lançamento de livros sobre a obra do autor e tudo o mais que só reforçou a noção de que Jorge Amado foi a maior personalidade da Bahia.