'Consegui forças para levar a vida', conta motorista de ônibus que virou paratleta

Jenilton Souza, 43 anos, integra time de Amputados do Bahia

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  • Vinicius Nascimento

Publicado em 2 de dezembro de 2018 às 11:48

- Atualizado há 10 meses

. Crédito: Marina Silva/CORREIO

Cinzenta e nublada, a manhã deste domingo (2) não tinha nada a ver com a vitalidade solar de Jenilton Souza. Aos 43 anos ele aproveitou a exclusividade para pedestres na Avenida Magalhães Neto, na Pituba, e jogou bola, andou de bicicleta, conversou com os amigos e fez muita resenha. É quase certo que ao ver toda essa descrição você não imaginou que se trata de uma pessoa com a perna direita amputada. Tá vendo aí?!

Jenilton é um dos atletas do time de Futebol de Amputados do Bahia que participou da primeira Caminhada em Comemoração ao Dia Internacional da Pessoa com Deficiência, que será celebrado na segunda-feira (3). A atividade foi uma iniciativa da Câmara Técnica de Atenção à pessoa com deficiência do Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (Crefito-7) e contou, além dos atletas tricolores, com demonstração de bicicletas adaptadas. Time do Bahia em ação que marca Dia Internacional da Pessoa com Deficiência (Foto: Marina Silva/CORREIO) Fisioterapeuta e membro do Crefito, Nadja Queiroz explica que a caminhada foi a primeira ação do órgão no ano, mas que a partir de agora a ideia é realizar pelo menos um evento por mês para que as pessoas com deficiência tenham a oportunidade de ocupar os espaços públicos da cidade. “O objetivo [das ações] é incluir a pessoa com deficiência na sociedade”.

A inclusão social foi o que tirou Jenilton da depressão. Há dois anos ele era rodoviário e trabalhava como motorista na linha IAPI x Barra. No dia 23 de março de 2016, já próximo ao final do expediente, ele passava pela Avenida Vasco da Gama quando sofreu um grave acidente: após desviar de um carro que passou em alta velocidade, Jenilton percebeu que um caminhão acabara de sair do retorno na altura da Perini e tentou fazer um novo desvio - dessa vez não foi bem-sucedido e acabou chocando seu veículo contra um poste.

Foram quatro horas de resgate até que veio a informação: seria preciso uma amputação traumática para tirar Jenilton das ferragens do ônibus que dirigia. E aconteceu. Justamente no dia em que sua filha comemorava o aniversário de 15 anos, o motorista teve a perna amputada.

Os dias que sucederam o acidente trouxeram incertezas, mudanças drásticas no cotidiano de Jenilton juntamente à família e, por fim, o que o próprio Jenilton classifica como “uma inevitável depressão”.

No início do processo de recuperação, Jenilton contou com um acompanhamento psicológico, além dos tratamentos fisioterapêuticos. “Segurou um pouco a barra, mas eu ainda me sentia vazio e tinha medo do futuro”, aponta o atleta.

No último ano, ele conheceu o projeto do Futebol de Amputados da Bahia e decidiu experimentar. Ele confessa que no começo desconfiou, mas aos poucos foi pegando ritmo, conhecendo pessoas e se sentindo mais à vontade. E, principalmente, mais feliz.“Depois que conheci a galera eu consegui forças para combater a depressão e levar a vida pra frente”, conta Jenilton.Torcedor fanático do Vitória, Jenilton recebeu uma surpresa durante o último mês de setembro: o time em que ele jogava, que na época assinava pelo nome de Tigres, fez uma parceria com o Bahia. O time azul, vermelho e branco cedeu o nome para a equipe, além de assumir a responsabilidade de divulgar as competições que os atletas participam e também forneceu material esportivo: camisas, calções e chuteiras foram doados pelo Bahia.“Virou motivo de resenha. O pessoal que trabalhava comigo ficavam dizendo que sempre desconfiaram que eu era Bahia, mas a gente leva na esportiva. No dia que a gente acertou a parceria, eu cheguei em casa e tomei meu banho de álcool para purificar”, conta o atleta aos risos.Jenilton não é o único rubro-negro no time do Bahia. Quase 30 anos mais jovem, Reinaldo Lima tem apenas 16 anos e também integra o elenco tricolor. Ele enfrentou uma doença chamada osteossarcoma, uma espécie de tumor ósseo que costuma se manifestar majoritariamente em crianças e adolescentes. Ele descobriu o time através de pesquisas na internet e logo após finalizar a quimioterapia recebeu o sinal verde para a sua participação no elenco.

Reinaldo contou à reportagem do CORREIO que foi muito bem recebido pelos colegas de equipe e isso foi o que o encorajou a tomar uma decisão: amputar de vez a perna. Quando entrou no time ainda havia a possibilidade de continuar o tratamento sem amputação, apesar da perna direita já bem debilitada. Reinaldo, 16 anos: tempo dividido entre escola e treinos do Bahia (Foto: Marina Silva/CORREIO) Por conta do tratamento, os estudos de Reinaldo ficaram parados por três anos. Hoje ele está no nono ano do Ensino Fundamental e estuda em um colégio no Costa Azul, bem perto de sua casa. Durante a semana ele se divide entre a escola e os treinos no Bahia, que normalmente acontecem no bairro do IAPI, região da Cidade Nova.

“Minha vida antes era jogar bola, e hoje mesmo depois da amputação continua a mesma coisa. Só que dessa vez eu tou vestindo a camisa de um time como o Bahia”, contou Reinaldo.

*Com supervisão da editora Mariana Rios