CORREIO visita set de filmagem da série da Netflix inspirada na Lava Jato

Estrelada por Selton Mello e Caroline Abras, com criação e direção de José Padilha, O Mecanismo estreia dia 23 de março

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  • Laura Fernades

Publicado em 25 de fevereiro de 2018 às 06:10

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Netflix/Divulgação
"Meu personagem tem uma polarização com o do Selton, que luta contra o sistema perverso", diz o ator Enrique Diaz, que interpreta um doleiro na série na qual Selton Mello é um obstinado delegado por Foto: Netflix/Divulgação

Era só o sinal ficar vermelho na rua que, de um galpão vazio no Centro do Rio de Janeiro, era possível escutar: “Atenção! Gravando!”. Cessado o barulho externo, só se ouvia a respiração da equipe de filmagem, afinal aqueles 40 segundos de sinal fechado eram preciosos para rodar uma das cenas de O Mecanismo, nova série brasileira da Netflix. Inspirada na Operação Lava Jato, a produção protagonizada por Selton Mello estreia dia 23 de março.

Sem o vai e vem dos carros, quem entrava em cena eram os atores Caroline Abras, 30 anos, e Jonathan Haagensen, 35 (Cidade de Deus/2002). “Confirmou o cartel, galera, pagamento de propina para a diretoria da Petrobrasil. Todo mundo usando dinheiro do esquema dos doleiros, menos o Ricardo Brecht”, disse a personagem de Caroline, a Delegada Federal Verena Cardoni, líder da megaoperação anticorrupção e pupila do personagem de Selton na trama criada por José Padilha (Narcos/2017 e Tropa de Elite/1997) e Elena Soarez (Cidade dos Homens/2002 e Eu Tu Eles/2008).

Diante do painel instalado na sala da força-tarefa, onde estavam as fotos dos 13 envolvidos no esquema, o policial vivido por Jonathan reforça: “Quanto ao Ricardo, a gente não tem o suficiente, ainda, mas para os outros 12, sim”. Qualquer semelhança com a realidade brasileira não é mera coincidência, afinal o drama ficcional é inspirado nos fatos que revelaram o maior escândalo de corrupção da história do Brasil.

Apartidário Apesar disso, direção e atores esclarecem que O Mecanismo não se trata de uma série sobre a Lava Jato e, sim, sobre as falhas humanas. “No nosso caso, esse mecanismo é muito mais essa lógica da estrutura da corrupção, desde o micro até o macro, do menor ao maior, das pequenas contravenções até os grandes escândalos”, explica Caroline. “O tema corrupção é muito maior do que os fatos que  aconteceram nos últimos anos. Vai além”, garante.

Ou seja, não adianta se deter na tentativa de espelhar realidade e ficcção para descobrir que político ou empreiteiro inspirou o personagem X ou Y. Ambientada entre 2013 e 2014, com direito a flashbacks e final em aberto, a trama envolve presidentes, vice-presidentes, empreiteiros, doleiros e procuradores, mas sem citar o nome real dos envolvidos.

“Não é um game de ‘quem é quem’”, reforça Caroline, cuja personagem trabalha na ‘Polícia Federativa’ e responde ao ‘Ministério Federal Público (MFP)’. Ao fundir vários personagens em um só, mais genérico, a história de oito episódios se concentra muito mais em mostrar como a engrenagem corruptiva atinge todas as pessoas.

“O Mecanismo é apartidário, não tem ideologia e está impregnado desde o mais alto escalão político, empresarial e econômico, até o ser humano que falsifica a carteira de identidade para pagar meia no show”, compara Daniel Rezende (Bingo: O Rei das Manhãs/2017), que também dirige O Mecanismo com Padilha, Marcos Prado (Tropa de Elite 2) e Felipe Prado.

Ator que interpreta o doleiro Roberto Ibrahim, responsável por operar o esquema de corrupção, Enrique Diaz, 50, entende que “a imagem da Lava Jato é tão forte que a gente fica tentando puxar para lá”. “É claro que tem a ver, é inspirado naquilo tudo e tal. Mas uma série de informações do contexto político as pessoas já sabem. Se elas forem olhar só para aquilo, não tem graça. O roteiro é muito bem pensado”, completa.

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Marco Zero Seu personagem é antagonista ao de Selton Mello, 45 anos, o delegado federal aposentado Marco Ruffo, que está obcecado pela investigação. Ao contrário dos outros personagens, Ruffo é declarademente inspirado no delegado federal Gerson Machado, considerado o policial ‘marco zero’ da Lava Jato.

Selton, que não quis conhecer o Gerson real “para ter mais liberdade criativa”, reforça que o que interessa em seu personagem é a humanidade. “Ele é um personagem bem ambíguo e rico, complexo. Pode ser herói, mas pode ser anti-herói”, provoca o ator, enquanto reforça que “O Mecanismo não é um documentário, é uma obra ficcional baseada em fatos surreais”.

Assim, a partir de personagens cheios de camadas, se desenvolve a trama gravada durante quatro meses em Curitiba, Brasília e São Paulo, tendo 90% das cenas rodadas no Rio, no galpão vazio de 12 mil m². Ao todo, 3.500 m² de área foram construídos em dois andares de cenário que priorizam tons escuros de cinza, marrom, azul e verde.

Tudo pensado no mínimo detalhe para entreter o público diante de um tema tão polêmico. “A gente vive esse momento louco e é importante falar sobre isso”, defende Selton Mello. “A democracia deve ser tagarela e a função da arte é fazer pensar”, completa o ator.

*A repórter viajou a convite da Netflix