Cria do Vitória, goleiro foi motorista de Uber após assalto

Juninho chegou a se afastar do futebol após a esposa reagir a um assalto e matar o bandido

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  • Gabriel Rodrigues

Publicado em 30 de agosto de 2017 às 15:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Reprodução / Instagram

Promessa das divisões de base do Vitória, o goleiro Juninho fez sucesso no futebol de Minas Gerais, onde defendeu os três principais clubes do estado (Cruzeiro, Atlético-MG e América-MG). Mas foi na modesta URT, equipe da cidade de Patos de Minas, que aos 36 anos o jogador deu a volta por cima e renasceu para o futebol neste ano, após superar um drama familiar. 

Em 2015, quando se preparava para casar, Juninho foi surpreendido em uma tentativa de assalto. A mulher do goleiro, que é policial, reagiu e matou o assaltante. A ação gerou um longo processo e fez o jogador se afastar momentaneamente do futebol, só voltando aos gramados nesta temporada, quando levou o pequeno clube mineiro às semifinais do estadual e por muito pouco não conseguiu o acesso à Série C. Em conversa com o CORREIO, Juninho relembrou seu início na Toca do Leão e contou as expectativas para o futuro. Confira: Na URT, Juninho reencontrou a felicidade de jogar futebol e projeta um 2018 melhor (Foto: Reprodução/Instagram) Aos 36 anos, você se reinventou e foi um dos destaques da URT em 2017. Como foi esse momento? Eu recebi um convite no ano passado, havia parado por um momento por motivos pessoais, e no início pensava apenas em voltar ao futebol, sem muitas expectativas. De repente, as coisas foram fluindo, dando certo no clube e graças a Deus a expectativa agora é voltar ainda melhor no ano que vem. Não sei se na URT, ainda não conversamos, mas tenho certeza que a minha volta no ano que vem vai ser bem melhor. 

O que não deu certo para a URT conseguir o acesso da Série D para a C? Para o que foi este ano, faltou apenas o acesso. Nosso time confiava, mas acabou não dando certo. Pelo que todo mundo esperava, um outro time foi montado para o Brasileiro, a gente foi pegando o entrosamento aos poucos com os jogadores que foram chegando, ficou um pouco de surpresa. Mas ao mesmo tempo a cada dia que passava era uma confiança de acesso que o time teve. Eu digo que aquele não era o nosso momento (o time foi eliminado pelo Globo nas quartas de final). Acredito nisso. 

Apesar dos 36 anos, você tem mostrado que ainda tem lenha para queimar no futebol. O que projeta? Eu não acreditava que pudesse ajudar tanto como ajudei este ano. Foi uma surpresa. A expectativa agora é voltar ainda melhor, voltar ao peso de atleta, que este ano eu não tive a oportunidade. Quando consegui chegar ao meu físico de atleta me machuquei e acabei tendo de jogar machucado. Estou tendo a oportunidade de me cuidar, dia 1º volto a treinar para me apresentar bem aonde for. Vai ser um Juninho melhor. Eu aprendi muito dentro de campo e também fora com a vida e quero tentar dar o melhor para a equipe que eu for. 

Você passou por um momento difícil junto com a sua esposa e chegou a ser motorista de Uber no ano passado. O que de fato aconteceu? Eu tinha disputado o campeonato no Paraná pelo Operário e, um semestre antes, eu fui casar e tive um incidente. Um assalto, a minha esposa hoje é policial, e acabou se defendendo e matou o assaltante. Isso abalou muito ela, abalou muito a gente, com o processo que infelizmente a gente passou, mas graças a Deus isso é passado. Tive que ficar do lado dela durante todo esse processo e acabei ficando mais perto e fazendo qualquer outro trabalho dentro de casa. Com isso tive a oportunidade de trabalhar junto dela."Não importa o que fosse, poderia estar vendendo qualquer coisa na rua, desde que a gente sempre apoie quem a gente ama. O aprendizado é nunca abandonar, independente de qualquer situação, sempre ter fé"

Juninho sobre a situação complicada pela qual passou em 2015 Vocês chegaram a receber alguma ajuda por parte das autoridades? A gente tem o pessoal que acompanhou a situação desde o início, tivemos o apoio da Polícia Militar de São Paulo, não tenho do que reclamar. A única coisa que a gente fica triste é pela resposta, o lado ruim da situação. Se ele tivesse nos acertado, ele estaria preso, ou nem isso, e nós sofrendo desse lado. Graças a Deus, naquele momento deu o segundo para a gente se defender, mas passamos por coisas pesadas. 

O Vitória é um time acostumado a revelar grandes goleiros e você subiu como uma promessa. Como foi seu início no Leão? Foi só coisa boa. Eu cheguei ao Vitória em 1998, tive a felicidade de treinar com grandes treinadores, Marcelo Chamusca, Chiquinho de Assis, fora os treinadores de goleiro de alto nível, como Chiquinho (Francisco Cersósimo), que hoje está no Atlético Mineiro. A passagem no Vitória foi grandiosa, um mundo diferente quando você sai de casa com 16, 17 anos, ainda mais para o Nordeste, que era totalmente diferente do meu dia a dia em São Paulo. Eu aprendi a me dedicar, ser atleta, saber como é você jogar com o barulho, a agitação da torcida. 

Tem algum jogo pelo Vitória que te marcou e você não esquece? Teve vários, mas acredito que o jogo mais sentido, de raça, foi na Copa do Brasil de 2004, quando, infelizmente o irmão de Edilson faleceu. A gente tinha que ganhar de 2x0 contra o Corinthians e acabamos nos classificando nesse jogo, mesmo com todo o acontecido. 

Você acumulou dois rebaixamentos com o Vitória, sendo que em 2005 o time acabou caindo para a Série C. O que aconteceu? Começamos o ano bem, classificamos na Copa do Brasil, mas aconteceram alguns problemas internos, afastaram o Paulo Carneiro (então presidente), mais alguns atletas, as coisas acabaram desandando. Eu também tive a infelicidade de me machucar, acabei voltando só no final. Acho que todo atleta pode passar por altos e baixos, e ali eu conheci o céu e o inferno. Felizmente, o Vitória, com o apoio da torcida, conseguiu se reerguer, mas eu não tive a felicidade de subir porque acabei me transferindo para o Cruzeiro. Mas eu estou sempre acompanhando o Vitória, que foi a minha escola e de onde guardo boas lembranças. 

O que está achando da campanha do time no Brasileirão? Eu estou achando sensacional. Teve altos e baixos, mas, por mais dificuldade que passe, o Vitória tem grandes jogadores. Tive a oportunidade de assistir ao jogo contra o Corinthians aqui em São Paulo e, às vezes, ninguém acredita como os times do Nordeste podem abater os times aqui do Sudeste. Vemos a dedicação dos jogadores, a dedicação que eu tinha quando jogava no Vitória. Acho que o Vitória vai conseguir conquistar uma classificação boa. Fernando Miguel é um baita goleiro, Tréllez, que chegou há quatro, cinco jogos, e encaixou bem. Acho que não vai chegar a almejar uma Libertadores, mas uma Sul-Americana eu acho que classifica.   Juninho treinando no Vitória em 2003; ao fundo, Zé Roberto e Nadson (Foto: Marcio Costa e Silva/ Arquivo CORREIO) Você ainda tem contato com algum jogador da sua época de Vitória? Nadson é o que eu mais converso, ele também jogou na URT. Tem alguns jogadores que estão fora do país, como Felipe Saad, Adailton (ambos zagueiros), mas são contatos esporádicos. Acabei me afastando um pouco por conta do rumo que a minha vida tomou, e a deles também. Mas, às vezes, temos contato quando eles vêm jogar em São Paulo. Passo no hotel, coisa assim. 

No futebol, é muito comum jogadores revelados em um time defender o rival. Em algum momento da sua carreira, você recebeu proposta para defender o Bahia? A única vez que eu passei no Bahia foi quando saí do Vitória. Estava passando aquele momento de turbulência, troca de presidente, eu tive uma contusão, precisava tratar, e como não deixaram no Vitória, por uma questão burocrática na época, o Newton Mota, que estava no Bahia, me abriu as portas. Mas nunca tive nenhum convite para trabalhar no Bahia, uma grande equipe, tem grandes pessoas, como Jeanzinho, que eu conheci ainda criança, e está passando um bom momento no futebol.

O que dizer para o torcedor do Vitória neste momento? Acreditar sempre. Sem a torcida o jogador não é nada. É muito bom ver o estádio lotado, com 30, 35 mil pessoas, até o morro lá atrás, é sensacional jogar dessa forma. Espero um dia voltar novamente, não sei se como jogador, mas em alguma outra função, e estar dentro desse estádio de novo.