Crônica: Nem como consolação serve

A disputa pelo terceiro lugar da Copa América 2019 teve um quê melancólico, tratada como desnecessária. E é. Argentina 2×1 Chile.

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  • Gabriel Galo

Publicado em 7 de julho de 2019 às 16:26

- Atualizado há um ano

. Crédito: Nelson Almeida/AFP

Convenhamos, há uma certa tristeza na disputa pelo terceiro lugar que uma competição de futebol. Está eclipsada pela final do dia seguinte, muito mais relevante e atraente. Ambas as equipes chegam à disputa derrotadas, cumprindo o regulamento por tabela. Na mente, o desejo incontrolável de embarcar no primeiro voo para ir curtir as férias bem longe dali.

Ao olhos de quem assiste, o terceiro lugar é o espetáculo de humilhação. É a via crucis de condenados à irrelevância, sem crime algum a ser imputado, a não ser a dor da derrota magnificada no bronze, ou pior, o quarto lugar. A importância da disputa é inversamente proporcional ao tamanho de quem a joga.

Não venho com isso dizer que não compreendo a história do terceiro lugar. Longe disso. Está em xeque o porquê em uma Copa América.

São apenas 12 seleções numa competição de terços. Um terço se despede na primeira fase, outro terça alcança as semifinais desejando o título.

E aí é que está: o que se faz como consolação, num confronto entre Argentina e Chile, nem pra isso serve.

A diferença? Um degrau a mais de quem não conseguiu a meta.

Não há objetivo maior. E nem Olimpíadas é, cujo bronze aumenta a contagem do país, galgando níveis na contenda entre países pelo quadro geral para ver quem se posiciona melhor abaixo de EUA e China.

É nada, é vazio, é nulo.

A postura de “pra quê, mesmo?” se viu nos chilenos. Abatidos, chegaram a Itaquera torcendo para que os 90 minutos terminassem de uma vez. Bicampeões, pagaram pela soberba de quem era favorito, mas desprezou o Peru na semifinal ao já fazer conta para a final. Irrompeu o túnel de acesso ao gramado com a certeza de que a Argentina, a quem bateram em ambas as finais anteriores, viria de cabeça baixa.

Mas se tem algo que argentino não pode ser acusado de ter é pecho frío.

Pois os albicelestes fizeram um a zero rapidamente, dois a zero na sequência, e parecia que a goleada viria.

A alternativa aos perdedores passou a ser a velha reação sudaca ante ao fracasso duplicada numa partida que leva a lugar nenhum: a pancadaria.

A partir do momento em que os rojos passaram a tratar o evento para “defender a honra”, o que quer que isso seja, o enfadonho virou regra. Foram 60 minutos de um espetáculo sofrível, chulo.

Medel e Messi se envolveram num bate-peito estranhíssimo, um tanto patético, culminando na expulsão exagerada – certamente a de Messi fora – de ambos.

Um pênalti achado, convertido por Arturo Vidal, diminui a vantagem. A todo instante, a zaga argentina mostrando sua estrondosa incapacidade.

O grande vencedor, pois, seria o relógio e o cronômetro anunciando o fim do que não deveria ter começado.

E ele veio, 90 minutos tarde demais.

Afinal, para ambos, qualquer coisa abaixo do título era desapontamento.

À Argentina, pela continuação da imagem de perdedora de uma geração que não parece conseguir chegar.

Ao Chile, pela certeza de que o ocaso da geração mais vencedora de sua história é presente.

A espetada derradeira no ego despedaçado viria ainda na forma de medalhas de participação para ambos, com Messi se recusando a buscar a sua.

Melhor faria a organização estabelecendo em definitivo a extinção da hierarquia que nubla o terceiro lugar a um posto sem sentido. Evitaria constrangimentos a todos. Ano que vem tem outra Copa América, em território dividido, Argentina e Colômbia, com fase final no país cafetero. Talvez viesse a decisão de interromper a ópera depressiva do embate bronze x latão.

Mas, sabem como é, um jogo a menos, uma receita a menos. E quem há de querer o bem do futebol, se o que importa mesmo, na óptica dos dirigentes, é o recorde de faturamento?

Foi triste ver este Argentina 2×1 Chile, por tudo que ele representa, renegado a um aprendizado de humildade que ninguém pediu.

*Gabriel Galo é escritor. Texto publicado originalmente no site Papo de Galo e reproduzido com autorização do autor.