De Bell Marques a Alinne Rosa: folia tem axé para todos os gostos

Artistas e gerações falam da mudança no 'novo axé' e da força do axé raiz

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  • Vanessa Brunt

Publicado em 3 de março de 2019 às 05:50

- Atualizado há um ano

. Crédito: Betto Jr., Arisson Marinho e Evandro Veiga/CORREIO

Qual é o ritmo que consegue misturar o ijexá, samba-reggae, frevo, reggae, merengue, forró, samba duro, ritmos do candomblé, pop rock, bem como outros ritmos afro-brasileiros e afro-latinos? Ele é tão consolidado pelo próprio nome que muitos sequer lembram da total mistura que existe sempre que ele toca. Ele mesmo: o axé. Outros estilos musicais podem até conquistar o seu espaço e ganhar corações carnavalescos, afinal, é da mistura que se trata a maior festa de rua do mundo, mas o axé prossegue provando o quanto continua como o gênero mais forte para todas as gerações foliãs. 

Neste sábado (2) de Carnaval, da Barra à Ondina, Bell Marques e Banda Eva comprovaram o fervor para os mais velhos, enquanto atrações como Rafa e Pipo Marques e Alinne Rosa, ilustraram um novo público do ritmo. No meio circuito Dodô (Barra-Ondina), Bell foi uma das atrações que mais comprovou a empolgação do público. O estilo musical surgiu na década de 1980 e é impossível não citar um dos pioneiros em levar a alegria axezeira para o povo,com a carreira lá em 86. E não é somente da boca dos baianos que é berrada essa paixão: os blocos de Bell são alguns dos mais lotados de turistas. (Foto: Betto Jr./CORREIO) Turistas querem cantar mais do que dançar Há 15 anos, Mayara Ryanna, 30, vem de Fortaleza para Salvador em todos os carnavais. Motivo? Ir atrás de Bell. Para ela, ele é a verdadeira reapresentação do Carnaval."Não tem como ter curtido um Carnaval de verdade sem cantar pelo menos uma música dele. Axé sempre vai ser o ritmo real dessa festa e ele é o axé em pessoa”, diz a foliã: “É aquele axé que fala de amor, de sentimentos humanos bonitos, que toca na alma... e ele sempre tenta inovar, viu? Os repertórios nunca ficam iguais", garante a fã, que ainda arrasta as amigas para a folia com gosto. Mayara Ryanna e as amigas (Foto: Vanessa Brunt/CORREIO) Mas não era preciso nem conversar com uma turista como Mayara para sentir a energia causada pelo bloco Vumbora. Bell chegou puxando o trio com músicas próprias, além de canções da época do Chiclete e de outros títulos que marcaram as gerações do seu início de carreira, como foi o caso da música Erva Venenosa, de Rita Lee. Não importava qual música do repertório fosse cantada, todas as gerações ao redor faziam coro juntas, inclusive as galeras de outros blocos próximos, que ouviam e logo se uniam para gritar em conjunto as letras conhecidas. (Foto: Betto Jr./CORREIO) E é justamente isso que mais conta para os fãs do ‘axé raiz’: as letras cantadas por todos. Foi o que também afirmou o paulista Jow Tardim, 32, que trouxe toda a sua galera para Salvador pelo sexto ano."Sem Bell, não tem Carnaval", diz.A galera grande veio para curtir os blocos Vumbora e Camaleão, além das pipocas. "Nosso foco é esse axé que a galera canta junto, com uma letra bonita, fazendo aquele momento que emociona", completou Regiane Furlan, que completa 17 anos pulando atrás de Bell.

Assim como a galera de São Paulo, as cariocas Rafaela Zurita, 32, Isabela Silvino, 31, e Thaiza Azevedo, 31, afirmam que "quem é turista sabe que não dá pra vir pro Carnaval sem pelo menos tentar ir atrás de Bell”. E é também o que pensa André Brito, 29, de Belo Horizonte, que completa 10 anos atrás de Bell em Salvador e promete trazer 100 pessoas com ele. "O pessoal tá chegando aí. Somos todos fãs de Bell. Criamos uma equipe, chamada Equipe Lambança", contou, explicando o motivo de tanta paixão: "Bell é a criação e o coração do Carnaval. É o mito, é raiz. Quem quer história e letra boa pra cantar, vem pra ele". (Foto: Vanessa Brunt/CORREIO) Quem também veio de fora foram as cariocas Roberta Lisboa, 30, Taisa Lisboa, 26, e Karla Fajarido, 31, que chegaram em Salvador apenas para curtir axé. Mas não é qualquer axé que está na lista delas, a banda Eva é o nome principal. "As letras são as melhores do Carnaval, o clima é mais de conexão entre todos... são músicas cantadas por todas as idades. É lindo de ver, são hinos! Por isso preferimos".

Com explosão de cores e serpentinas no céu, a banda começou a puxar o trio na tarde deste sábado, também no Farol da Barra. A música Pequena Eva fez com que a galera que aguarda Léo Santana se misturasse com os foliões para o canto em coro do axé conhecido por todas as gerações.

Axé inovando O vocalista do grupo, Felipe Pezzoni, diz ao CORREIO que o segredo para inovar no axé e continuar atingindo todas as gerações é tentar sempre misturar os ritmos atuais de maior sucesso."O axé é essa mistura total do que está no auge no momento. Hoje em dia, misturamos muito o pop e até a eletrônica, mas tudo isso tem que ser feito sem perder a raiz já construída", explica o artista. (Foto: Betto Jr./CORREIO) Para ele, as letras mais românticas continuam sendo o ponto alto de quem trabalha com essa mistura do novo axé e do axé raiz. "Lançaremos uma nova música em breve com essa pegada mais romântica na letra. Rede é uma canção que traz essa pegada também, apesar de Baiana ser mais dançante", pontua, ainda concluindo que são essas as principais letras que continuam trazendo as gerações mais antigas para o meio da folia.

E no meio de tantos turistas, exemplificando o quanto o axé raiz prossegue entrando nos novos corações, estavam as soteropolitanas Luciana Tavares, 15, Sofia Lopes, 16, e Beatriz Muzi, 16. As jovens foram curtir a banda Eva e explicaram que “são músicas eternizadas e que o clima nesses blocos de axé é sempre mais de respeito e conexão”, por isso fizeram a escolha.

Nova geração Além das meninas que escolheram a banda Eva pra curtir o clima, diversos jovens também se aglomeraram com abadás e na pipoca, mas para encontrar um novo tipo de axé. A dupla Rafa e Pipo, filhos de Bell Marques é que consegue reunir o maior público teen para a folia. (Foto: Evandro Veiga/CORREIO) A foliã Lorena Parreira, 20 anos, vem de Belém do Pará todos os anos para acompanhar a dupla. "Meu primeiro Carnaval foi com eles e o que mais acho bacana é que eles sempre atendem o público de uma forma bacana. É uma geração mais próxima dos fãs, por conta das redes sociais", afirma. Lorena ainda diz que o axé dos meninos é algo mais animado e isso atrai mais os jovens. Lorena vem todo ano curtir Rafa e Pipo (Foto: Vanessa Brunt/CORREIO) As letras da dupla brincam com duplos sentidos e vão para além da pegada romântica, utilizando mais de aspectos do funk, por exemplo. O casal Demétrio Nascimento, 24, e Brenda Andrade, 18 veio para pular atrás de Rafa e Pipo e explicam que curtem a mistura musical. "Eles tocam um novo axé. É tipo um 'axé universitário', tem uma pegada mais dançante. O negócio aqui é mais fazer coreografia do que cantar mesmo, mas eles também tocam o axé raiz e nos lembram das letras mais leves. E aí, no meio, eles ainda misturam com outras músicas, tocam funk puro... isso que é massa", explica Demétrio, que justifica a escolha do trio por “sempre ser o mais cheio de jovens”.

A raiz em Alinne Rosa Mas não é só de mistura com funk e de letras mais ambíguas que é feito o axé da nova geração. Com pegada eletrônica e roupa prateada, Alinne Rosa prossegue com letras empoderadas e fez assim a abertura do seu trio no circuito Dodô (Barra-Ondina) vestida de super-heroína. 

A música Vamos Ativar é a aposta da cantora no Carnaval e levou os foliões aos gritos, enquanto os abadás com capas de super-heróis enfeitavam o bloco. "Fui abraçada pelo público LGBTQIA+ e estarei sempre com eles! A gente sempre brincou que eu tinha o maior Vale do mundo ao meu lado. É lógico que eu ia homenageá-los!”, declarou a cantora.

Lá debaixo, era fácil perceber a mistura de idades. O negócio, para a galera de Rosa, ainda é cantar enquanto dança. O folião Ariel Melo, 30 anos, por exemplo, veio de Teresina pra curtir o bloco de Alinne e afirmou que o que mais chamou a sua atenção para escolher o trio foi o tema: Super-heróis. "Adoro o axé dela, é uma galera mais tranquila do que rola no pagodão", disse.  (Foto: Betto Jr/CORREIO) Também no bloco Fissura/O Vale, a foliã Ana Julieta Garcia, 29, curte o Carnaval no circuito Dodô (Barra-Ondina) neste sábado.“Pra o público LGBT a diva do Carnaval é ela. As letras são representativas. É a diva da empoderação”, analisa. Ana Julieta no bloco O Vale (Foto: Vanessa Brunt/CORREIO) No meio das inovações e das misturas de faixas etárias, só uma coisa é certa: axé que é axé, tem a ver com mesclar ritmos e unir pessoas. É por isso que, sem ele, não tem Carnaval.