De Pojuca para o Porta dos Fundos: Conheça João 'Seu' Pimenta

Humorista leva baianidade para o time de humor de maior sucesso atualmente no Brasil

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  • Laura Fernades

Publicado em 31 de dezembro de 2020 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Divulgação

O Porta dos Fundos fez um concurso para selecionar novos humoristas, mas a pandemia suspendeu o processo em que o baiano João Pimenta, 30 anos, já tinha se inscrito antes de parar tudo. “Por causa da inscrição, me telefonaram pedindo um vídeo. Fiz um dizendo tudo o que não sabia fazer: não sei nadar, não sei dirigir, não sei andar de bicicleta (fiquei puto porque caí e não quis aprender mais), não sei dar cambalhota”, conta, bem-humorado. 

João, o Seu Pimenta ou Pé de Pranta, como também é conhecido, não esperava que o deboche fosse render algum fruto. Mas dois diretores do Porta dos Fundos gostaram do material e ligaram para ele. “Me pediram outro vídeo. Eu fiquei: ‘Oxente, véi. Qual foi?’, achando que era mentira. Recebi a grata surpresa, no dia do meu aniversário, pra trabalhar fixo”, comemora João Paulo de Oliveira, que há 15 anos trabalha com humor na Bahia.

Os quatro episódios do Cozinha com Pimenta já estão no ar e João também levou sua baianidade para o Especial de Natal Tender com Pimenta, todos com receitas apresentadas de uma forma bem inusitada. “É sempre assim, em momentos difíceis o povo sempre vai querer se distrair com pão e circo. Mas já que não pode aglomerar, vamos ensinar os palhaços a fazer pão”, diz a descrição de um de seus vídeos já disponíveis no YouTube.

No início de 2021, Seu Pimenta vai começar as gravações das esquetes que toda a equipe do Porta está fazendo de casa. E as novidades não param por aí, apesar de João manter segredo sobre o que virá nas primeiras semanas do ano. “Vão vir coisas boas que tô me coçando pra contar”, provoca. “E é de verdade, viu? Porque já vi artista dizendo isso e quando começa o ano não acontece nada”, gargalha. João Pimenta cresceu em Pojuca (Foto: Divulgação) Tímido Quem vê o humor irônico e escrachado de Seu Pimenta não imagina que ele era tímido quando era pequeno. “Sou até hoje, na verdade”, entrega. O artista de desenvolta baianidade só foi pisar os pés no palco pela primeira vez em 2005, em um projeto social de Pojuca. A sementinha, porém, foi plantada ainda na infância enquanto observava as coisas ao seu redor e gostava de escrever histórias em quadrinhos sobre o que entendia daquilo.

“O tráfico de drogas estava muito forte na minha cidade e lembro nitidamente de perder muitos amigos. Foi quando rolou um projeto social e eu me matriculei”, lembra. “Foi muito legal, porque começou a me destravar pra várias coisas. Fiquei três anos, comecei a fazer teatro, fazer comédia, escrever pra comédia e pensei: ‘Rapaz, posso tentar trabalhar com isso’”, conta Seu Pimenta.

Sem ter onde escoar sua produção, passou a colocar tudo no YouTube para guardar, mas acabou viralizando. Assim como o programa do qual passou a fazer parte, João entrou no mercado do humor pela porta dos fundos. Sem espaço nos veículos tradicionais, furou a bolha pela internet com seu personagem Pé de Pranta. Para Seu Pimenta, que ganhou o apelido por causa de um pingente, o humor virou ferramenta política.

Racista Fazer comédia se autodepreciando como negro? Nem pensar. “A piada racista não deve nem ser feita”, diz sem pestanejar. João lembra que, durante muito tempo, foi validado na comédia brasileira que tudo era piada. Nesse contexto, há quem faça piadas machistas, racistas, gordofóbicas e homofóbicas, seja do local do opressor ou mesmo do oprimido.

“Essa fórmula depreciativa usada por vários grupos de minoria foi um atestado para outras pessoas fazerem o mesmo. A indústria da comédia é só a pontinha de um quê maior, mas contribui bastante para normalizar esse comportamento. É perigoso a gente reproduzir certas coisas”, defende. “Acho problemático quando a pessoa se valida do humor para ser opressor”, completa.

Apesar da crítica, o humorista acredita ser uma utopia pensar que viveremos em um mundo equilibrado. “Acho que comediante que faz esse tipo de piada não vai perder espaço, infelizmente”, lamenta. Mesmo assim, segue otimista com sua geração que, em suas palavras, vê o humor como sinônimo de luta política.

“Eu, João, acredito que o humor tem um papel importante em relação à transformação social. Essas pessoas que fazem a comédia do olhar do opressor têm que mudar. As pessoas estão precisando de um choque de realidade. Precisa de alguém questionando os privilégios para sair do lugar de conforto. Por isso recebo tanta mensagem dizendo que faço muito ‘mimimi’ e que falo muito ‘dessas coisas de ser preto’”, diz, orgulhoso.