Delegado é transferido após prender PMs e ser ameaçado de morte na Bahia

Ele relatou que os policiais estavam interferindo em investigações

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  • Mario Bitencourt

Publicado em 12 de fevereiro de 2019 às 11:45

- Atualizado há um ano

Um delegado da Polícia Civil que atuava em Muquém do São Francisco, cidade de 11 mil habitantes, no oeste da Bahia, acabou transferido de cidade depois de prender policiais militares que ele investigava e sofrer ameaças de morte.

Segundo a Polícia Civil, os policiais militares são suspeitos de homicídio num caso registrado como auto de resistência que resultou na morte de um suposto traficante, identificado como Marcus Vinícius, em 15 de agosto de 2018.

O delegado Geraldo Sergio Silva de Almeida abriu investigação sobre o caso e realizou reconstituições e reproduções simuladas do suposto crime, quando percebeu que os PMs estariam interferindo nas apurações e pediu a prisão dos mesmos, o que ocorreu dia 6 de fevereiro de 2019.

Os policiais presos são Erivelton Silva Pereira de Queiroz e Claudio Silva, que foi preso em Juazeiro, no norte da Bahia, para onde foi transferido pouco tempo depois do fato investigado pela Polícia Civil.

O policial Erivelton, por sua vez, foi preso em Ibotirama. Ambos estão detidos preventivamente nos batalhões da PM das respectivas cidades de atuação. A reportagem não localizou a defesa do policial Claudio Silva.

De acordo com a Polícia Civil, os policiais alegam legítima defesa no caso. A advogada Ericarla Silva de Queiroz, que está na defesa do policial Erivelton, disse que “os policias agiram em estrito cumprimento de dever legal, repelindo injusta ameaça.”

O que pautou a prisão foi representação do próprio delegado, justificando ameaça de testemunhas, ameaças essas recebidas apenas por ele em seu número de celular pessoal”, disse a advogada.

Segundo ela, “os áudios nada comprovam qualquer tipo de ameaça, o áudio é entre a testemunha e a servidora da secretaria criminal que inclusive é suspeita por inimizade pessoal com o meu cliente, e encaminhados para o numero pessoal do delegado”.

Para a advogada, a “prisão [do policial] foi eivada de vícios e abusos na forma de sua execução, descumprindo vários preceitos legais bem como com latente abuso pelos envolvidos”.

“Houve abuso e arbitrariedade com o intuito de exposição vexatória do investigado”, afirma Ericarla Silva de Queiroz, segundo a qual “verifica-se já um perfil de abuso do referido delegado, com postagens contra PM em suas redes sociais”.

Ameaças Depois da prisão, ainda de acordo com a Polícia Civil, o delegado relatou ter recebido ameaças anônimas de morte por meio das redes sociais e em seu telefone pessoal e, no dia 9 de fevereiro, foi transferido para a delegacia de Bom Jesus da Lapa.

A prisão dos policiais, ainda segundo a Polícia Civil, foi concedida pelo juiz da Vara Crime de Ibotirama Fábio Marx Saramago Pinheiro depois de parecer do Ministério Público da Bahia (MP-BA) analisando o pedido do delegado Geraldo.

Procurado, o MP-BA informou que “não se pronunciará, pois aguarda a conclusão do inquérito policial”, mas a Polícia Civil informou que a investigação já foi concluída e encaminhada para a Justiça.

O CORREIO tentou contato com o delegado Geraldo Sérgio Silva de Almeida, mas ele não atendeu as chamadas ao celular. Almeida era lotado na delegacia de Ibotirama, onde atuava desde 2017 e fazia plantões em Muquém do São Francisco.     

O delegado Jackson Neves, coordenador da 24ª Coordenadoria de Polícia do Interior, sediada em Bom Jesus da Lapa, confirmou os relatos de ameaça do delegado, “mas ainda não tem nada oficial”.

Sobre a transferência para outra unidade policial, Neves disse que o delegado Almeida já tinha feito o pedido antes de relatar as supostas ameaças, em 4 de janeiro de 2018. “Tenho um ofício dele que mostra isso”, afirmou o delegado.

“[O delegado] teve o entendimento de que os policiais em liberdade estavam atrapalhando as investigações, solicitou a prisão, o MP deu parecer favorável, o poder judiciário decretou. O inquérito já foi remetido à Justiça. Agora é com o MP e a Justiça, a polícia já fez a parte dela”, declarou o delegado Jackson Neves, coordenador da 24ª Coopin.

Sem respostas Questionada sobre o assunto, a Secretaria da Segurança Pública do Estado da Bahia (SSP-BA) não se manifestou, bem como a Polícia Militar da Bahia, segundo a qual as perguntas enviadas pelo CORREIO seriam respondias quando houvesse retorno da Corregedoria da PM.

Comandante da PM em Ibotirama, o capitão Josinaldo dos Santos Silva disse que os policiais presos têm condutas exemplares na corporação, mas não questionou a prisão em si. “Decisão judicial é para se cumprir, isso não se discute”, declarou.

“O problema foi como ocorreu a prisão do policial Erivelton, que foi detido e algemado pelo delegado, sendo que pelas prerrogativas do policial ele deveria ser preso pela PM, acompanhado da Civil, como ocorreu com a prisão de Claudio Silva em Juazeiro”, disse.

Segundo o capitão, havia um acordo com a Polícia Civil para que a prisão fosse realizada em conjunto entre as duas polícias. “Esse acordo foi descumprido, o delegado levou 12 policiais civis para prender um PM”, afirmou.

Com relação às ameaças de morte relatadas pelo delegado, o capitão Silva disse que para ele “isso é novidade”. “O delegado tem de apontar de onde saíram essas ameaças e denunciar quem as fez”, comentou.

“Quero destacar que a relação entre as polícias aqui na região sempre foi muito boa e queremos que fique assim sempre. Contudo, essa prisão do policial, da forma como ocorreu, gerou desconforto nos policiais”, acrescentou.

Em contato com o CORREIO, o presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia Civil do Estado da Bahia, Fábio Lordello, disse que estava em viagem e não poderia comentar sobre o assunto.