Dólar fecha a R$ 3,925

Disputa eleitoral, greve de caminhoneiros e economia norte-americana elevam moeda ao maior patamar desde janeiro de 2016

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  • Donaldson Gomes

Publicado em 8 de junho de 2018 às 02:00

- Atualizado há um ano

O pessimismo com o ambiente político fez o dólar atingir a maior cotação ontem desde 21 de janeiro de 2016. A moeda americna fechou a R$ 3,925, uma alta de 2,24% ante o real. Na máxima, a moeda atingiu R$ 3,968. Já o Ibovespa, principal indicador do mercado local, fechou com uma queda de 2,97%, aos 73.851 pontos. Em determinado momento do dia, a cotação chegou a cair 6,96%.

Nas principais casas de câmbio do país, a moeda americana passava dos R$ 4,30 no cartão. Já em papel-moeda, o dólar era comercializado, em média, a R$ 4,15. Por sua vez, a moeda europeia estava perto dos R$ 5.

Nos últimos dias, as consequências da greve dos caminhoneiros pressionaram. O acordo costurado pelo governo implica em gastos, o que piora as contas públicas. Além disso, pesquisas de opinião mostraram o apoio da população a algum tipo de controle no preço dos combustíveis e a rejeição a uma eventual privatização da Petrobras, o que foi interpretado como menor chance de vitória de uma candidatura que defenda as reformas na Previdência e na estrutura tributária, entre outras. 

Atualmente, lideram as pesquisas o deputado Jair Bolsonaro (PSL) e o ex-ministro Ciro Gomes (PDT).

Sem controle A escalada do dólar ocorreu mesmo com o reforço da autoridade monetária na oferta de contratos de “swap cambial”, que equilvalem a uma venda de moeda no mercado futuro. Foram US$ 2 bilhões em um leilão de swap anunciado pelo início da manhã mais US$ 750 milhões, feitos diariamente desde o mês passado. 

O presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, garantiu que continuará trabalhando com o governo para oferecer liquidez aos mercados de câmbio e de juros “enquanto for necessário”. Ele ressaltou, porém, que o regime de câmbio flutuante é a primeira linha de defesa do país e rechaçou o uso da taxa de juros Selic para controlar a cotação do câmbio.

O presidente do BC disse que a autoridade monetária tem atuado para prover liquidez e continuará oferecendo contratos de swap. Ele destacou que o BC conta hoje com uma munição maior e vai oferecer US$ 20 bilhões em swaps até o fim da semana que vem, “sem prejuízo de atuações adicionais”.

“Hoje, estamos usando esse seguro e podemos ir além dos máximos históricos do passado”, disse o presidente do BC. Além do swap, Goldfajn também citou outros instrumentos como leilões de linha.

Goldfajn buscou destacar os fundamentos sólidos da economia brasileira. “O balanço de pagamentos do Brasil é muito bom, nós temos uma conta-corrente equilibrada. Nós esperamos que esse fluxo de conta-corrente seja superavitário nos próximos 12 meses”, disse.

O presidente do BC iniciou a coletiva destacando que houve mudança relevante no cenário externo. Ele citou a elevação na taxa de juros nos Estados Unidos como um atrativo para investimentos em dólar. 

Apesar da valorização da moeda americana ser generalizada, há também um movimento de desvalorização do real. Este mês, a moeda brasileira é a segunda que mais perdeu valor, em comparação com o dólar (-4,2%), melhor apenas que o dólar da Libéria (-4,4%). 

Temer confiante O presidente Michel Temer disse ontem em entrevista exclusiva à jornalista Roseann Kennedy, no programa Nos Corredores do Poder, da TV Brasil, que o governo tem todas as condições para enfrentar a alta do dólar. “Não há risco de crise cambial no Brasil”, avaliou.

Segundo ele, o país dispõe de uma reserva de US$ 380 bilhões e uma dívida muito inferior a este valor, além de manter sob controle o ajuste fiscal e continuar recebendo investimentos de empresas estrangeiras.  Temer destacou ainda que não é apenas o Brasil que está sentindo os efeitos da valorização do dólar e dos juros nos Estados Unidos.

Bolsa de valores vive um dia de intensa volatilidade O pregão da Bolsa brasileira teve hoje momentos ainda mais tensos e de maior volatilidade que os vistos nos dias da greve dos caminhoneiros, levando em conta as incertezas dos cenários eleitoral, econômico e fiscal. Com um movimento expressivo de saída de recursos do mercado, o Índice Bovespa terminou o dia em queda de 2,98%, aos 73.851,46 pontos. No auge do nervosismo, o índice chegou a tombar 6,51%, oscilando no patamar dos 71 mil pontos. O volume de negócios somou R$ 20 bilhões, bem acima da média dos últimos dias, e foi outra evidência do movimento de fuga do risco.

Apesar da ausência de notícia específica que justificasse mais uma rodada de estresse no mercado, a alta do dólar alimentou o clima de especulação.

Moeda elevada impacta em custo de vida Os impactos do dólar mais alto – a cotação ultrapassou os R$ 3,92 ontem, frente à média de R$ 3,63 de maio –  sobre os preços devem começar a ser sentidos ao longo do mês, apontam os economistas. No caso da gasolina, o impacto é imediato. Em junho, a inflação oficial medida pelo IPCA pode chegar a 1% em relação ao mês anterior, nas contas do Ibre/FGV. Se esse resultado se confirmar, será a maior variação desde janeiro de 2016. Os itens mais impactados, além da gasolina, são os alimentos derivados de trigo, soja e milho, aves, suínos e eletroeletrônicos.

“No caso dos alimentos, os repasses são graduais, por conta dos estoques. Os preços dos eletroeletrônicos são os que mais demoram a ser afetados porque os estoques são ainda maiores e a demanda segue contida, represando reajustes”, explica André Braz, economistas do Ibre-FGV.

O resultado da inflação de maio, que será divulgado pela IBGE hoje, deve ser mais impactado pela greve dos caminhoneiros, iniciada no dia 25 e que durou cerca de dez dias. Mas nada que tenha alterado significativamente as previsões, que estão em 0,29% na comparação mensal e em 2,74% para o acumulado em 12 meses, frente aos 2,76% registrados em março. As projeções são baseadas na mediana de 33 analistas ouvidos pela Bloomberg. Em março, a inflação ficou em 0,22%, na margem.

“O que preocupa mais do que o dólar são os efeitos prolongados sobre os preços daqui para frente, por conta do preço do frete. Já trabalhamos com um dólar que deve chegar aos R$ 4 este ano e, como isso não pode ser considerado uma explosão, e temos reservas e um saldo comercial grande, não teremos tanto impacto”, analisa André Perfeito, economista-chefe da Spinelli Corretora.

Em junho, a pressão no custo de vida virá sobretudo nos preços administrados: além da gasolina, a bandeira vermelha, patamar 2, em vigor desde o dia 1°  deve elevar as contas de luz.

Mercado sonha com Alckmin, mas acredita em vitória de Bolsonaro Uma sondagem da XP Investimentos com 204 investidores, em 4 e 5 de junho, mostra que a candidatura de Geraldo Alckmin (PSDB) à Presidência é vista como a mais atraente para o mercado. O problema é que a eleição do tucano é considerada pelos analistas como inviável. Alckmin trocou de lugar com Jair Bolsonaro (PSL): em abril, 48% achavam que o tucano venceria a eleição presidencial, parcela que caiu a 31%. Já o deputado era a aposta de vitória de 29% e agora lidera, com 48%. 

O ex-governador cearense Ciro Gomes (PDT) saiu de 1% para 13% de chances de vitória. Marina Silva (Rede) foi de 3% para 5%. 

Entre esses investidores, 45% acham que o segundo turno será entre Bolsonaro e Ciro – a mesma fatia apostava que seria o capitão da reserva contra Alckmin em abril. “A amostra contou com as principais instituições do mercado financeiro brasileiro, com uma representação equivalente a mais de 50% dos recursos sob gestão dentro do setor”, diz a XP. 

O resultado reflete a opinião de formadores de opinião do mercado financeiro, que expressam confiança na eventual gestão de Alckmin, que tem o economista Persio Arida à frente de seu programa de governo, mas desconfiam de sua viabilidade.

Segundo a pesquisa da XP, a vitória de Alckmin provocaria uma melhora do Ibovespa para 97% dos entrevistados e um câmbio abaixo de R$ 3,40 para 73%.

O juro básico ficaria em no máximo 7% até o final de 2019 para 41% dos entrevistados; 22% apostam que a Selic seria superior a 8%.

Por outro lado, uma eventual eleição de Bolsonaro não causa pânico a esses investidores. Em abril, 41% achavam que o Ibovespa avançaria do patamar atual. Hoje, 49% pensam assim e 21% preveem estabilidade.

Os juros, sob Bolsonaro, aumentariam em 2019, creem 77% dos quais 44% apontam uma Selic de ao menos 8%.

A taxa de juro básico está hoje em 6,5% ao ano.

Já com Ciro, 99% desses investidores acham que o Ibovespa recuaria, 80% dizem que o câmbio brasileiro se desvalorizaria para um patamar superior a R$ 4 frente ao dólar. A Selic ficaria acima de 8% para 63%.