'Ela só não morreu porque fugiu pra casa da vizinha', diz tia de jovem espancada por ex-marido

Manifestantes protestam contra agressões do filho de prefeito de Salinas da Margarida, Filipe Pedreira, conta sua ex-esposa, Clara Vieira

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  • Raquel Saraiva

Publicado em 19 de maio de 2018 às 17:32

- Atualizado há um ano

. Crédito: Raquel Saraiva e Reprodução

"Ele tem que responder por tentativa de assassinato. Ela só não morreu porque fugiu pra casa da vizinha", revela, emocionada, uma tia de Clara. A pedagoga Tatiane Floriano, 38 anos, foi uma das cerca de 50 pessoas que compareceram a um protesto, na região do Iguatemi, na tarde deste sábado (19) em repúdio à agressão contra a estudante de Direito Clara Emanuele Santos Vieira, 20 anos, que teria sido agredida  a socos, mordidas e ponta-pés pelo ex-marido, o também estudante de Direito Filipe Pedreira, 19. A agressão aconteceu no último dia 8 de maio, em Santo Antônio de Jesus, no Recôncavo baiano.  Clara também teve as unhas feridas e o cabelo cortado usando uma faca (Foto: Reprodução) Vestidos de vermelho, os manifestantes - a maioria mulheres - levaram cartazes e gritaram pedindo a prisão de Filipe. "Vestimos vermelho por conta do sangue de Clara que foi derramado em todas as agressões que ela sofreu de Filipe", explicou a recepcionista Jaque Ferreira, 20, amiga de Clara.

O protesto, iniciado às 13h, contou com familiares e amigos de Clara, e também pessoas que se solidarizaram com a jovem. "Isso acontece toda hora. Mas não deixa de deixar a gente triste e indignada", diz a estudante Isadora Karen, 21. "A gente tomou conhecimento do protesto e viemos. O que mais deixa triste é que o filho dela tava presente e foi agredido", diz Fernanda Cristina, 22. Protesto contou com amigos e familiares da vítima (Foto: Raquel Saraiva/CORREIO)   A jovem, que é filha do prefeito da cidade de Muniz Ferreira, Wéllington Sena Vieira (PSD), disse ter sido espancada por Filipe, filho do prefeito de Salinas das Margaridas, no dia 8, num apartamento alugado por ela em Santo Antônio de Jesus. Ela recebeu chutes, socos e teve o cabelo cortado com uma faca, usada também para fazer ferimentos nas unhas. A universitária Clara Vieira, 20, foi agredida no rosto e ficou com olho roxo (Foto: Reprodução) Justiça Os manifestantes se mostraram indignados com a atuação da justiça no caso. "A gente não pode aceitar. Se isso não se resolver aqui no Brasil, vamos acionar a corte internacional", conta a prima Isabel Copque, 35. Muitos motoristas buzinaram em apoio ao protesto. Por volta das 14h30, duas pistas no sentido Paralela foram interditadas pelos manifestantes. (Foto: Reprodução) A irmã de Clara, a fonoaudióloga Andressa Vieira, 25, foi quem fez a denúncia das agressões. Ela esteve presente no protesto e disse que a justiça tem que agir de forma enérgica para encorajar outras mulheres a fazerem denúncia contra agressão: “Se a justiça não fizer ele [Felipe] pagar o que fez, o que garante que a mulher que tomou um tapa vai querer denunciar?”. Irmã de Clara, Andressa Vieira fez as denúncias que a irmã sofreu (Foto: Raquel Saraiva/CORREIO) Segundo familiares, Clara não conseguiu ir à manifestação porque, além de estar com medo de sair de casa, continua muito machucada por causa das agressões do ex-marido. “Ela tá tentando ser forte, mas tem medo de entrar em casa sozinha, nem no quarto ela fica. Só sai de casa para ir na delegacia e no médico. Inclusive hoje ela não pôde vir porque tá com o ouvido muito inflamado, com dor, e com os dentes moles por causa das agressões”, conta Flávia Lima, 42, administradora e tia de Clara. Filipe também mordeu Clara em diversas partes do corpo (Foto: Reprodução) A Secretária Nacional de Combate ao Racismo, Olívia Santana, esteve presente no protesto. Lá, deu orientações, se colocou à disposição dos familiares de Clara e criticou a liberdade de Felipe. “Clara precisa de proteção, mas ela não tem que ficar encarcerada enquanto ele está livre. É preciso que o judiciário se atente pra isso. Não queremos cavar mais covas para as mulheres. Ela tá presa com medo e Felipe está solto tramando contra ela”, ressaltou. “Sei o que é essa luta. Não é fácil, mas temos que levantar e agir”, disse.

Lesões Os manifestantes reclamaram também do trabalho da perícia, que classificou as lesões da jovem como leves. “O que mais me deixa triste é essa lesão ser classificada como leve. O que vai acontecer agora?”, questiona a enfermeira Maiara Almeida, 29. 

Diariamente todas as mulheres são agredidas, psicológica, moral ou fisicamente, lembrou a estudante Fernanda Cristina, 22. ”Em qualquer lugar a gente sofre por ser mulher no dia a dia. A gente se sente menosprezada e inferiorizada”, ressalta ela, que não conhece Clara, mas aderiu ao protesto.

“O apoio da mídia foi essencial para o caso ter repercussão.. E motivou a gente a sair na rua e abrir a boca. A força da mulher tá na voz, não podemos nos calar de jeito nenhum”, disse a irmã de Clara. 

Clara denunciou as agressões na 4ª Coordenadoria Regional de Polícia do Interior (Coorpin) de Santo Antônio de Jesus. A jovem também passou por exames no Departamento de Polícia Técnica (DPT).

Relacionamento A delegada Patrícia Jackes, responsável pelo Núcleo de Proteção à Mulher na cidade de Santo Antônio de Jesus, acompanha o caso e afirma que o inquérito deve ser concluído na próxima semana. O pedido de prisão preventiva de Filipe ao final do inquérito não está previsto.

Desde o dia 11 de maio, Filipe está impedido de estar a menos de 100 metros de Clara e do filho de um ano que eles têm. Caso faça isso, será preso.

Clara e Filipe tinham três anos juntos. Começaram a se relacionar no São João de 2015, em Santo Antônio de Jesus, e um ano e meio depois se casaram, em 10 de dezembro de 2016, numa cerimônia na Igreja Matriz de Muniz Ferreira, onde a família da jovem mora.  Clara, de 20 anos, e Filipe, de 19, se casaram em dezembro de 2016. O filho do casal tem apenas um ano (Foto: Reprodução) Clara entrou para a lista de mulheres que já sofreram violência doméstica no estado. Segundo a Secretaria da Pública da Bahia (SSP-BA), até abril deste ano houve 1.456 registros de ameaça contra mulheres, 888 casos de lesão corporal dolosa, sete tentativas de homicídio e 26 feminicídios. Ano passado, houve 53.360 queixas de ameaça, 578 estupros, 56 feminicídios, 4.391 homicídios dolosos, 24.344 lesões corporais dolosas e 2.183 tentativas de homicídio.

Veja onde buscar ajuda em casos de violência doméstica

Cedap (Centro Estadual Especializado em Diagnóstico, Assistência e Pesquisa) – Atendimento médico, odontológico, farmacêutico e psicossocial a pessoas vivendo com HIV/AIDS. Endereço: Rua Comendador José Alves Ferreira, nº240 – Fazenda Garcia. Telefone: 3116-8888.

Cedeca (Centro de Defesa da Criança e do Adolescente Yves de Roussan) – Oferece atendimento jurídico e psicossocial a crianças e adolescentes vítimas de violência. Endereço: Rua Gregório de Matos, nº 51, 2º andar – Pelourinho. Telefone: 3321-1543/5196.

Cras (Centro de Referência de Assistência Social) – Atende famílias em situação de vulnerabilidade social. Telefone: 3115-9917 (Coordenação estadual) e 3202-2300 (Coordenação municipal)

Creas (Centro de Referência Especializada de Assistência Social) – Atende pessoas em situação de violência ou de violação de direitos. Telefone: 3115-1568 (Coordenação Estadual) e 3176-4754 (Coordenação Municipal)

Creasi (Centro de Referência Estadual de Atenção à Saúde do Idoso) – Oferece atendimento psicoterapêutico e de reabilitação a idosos. Endereço: Avenida ACM, s/n, Centro de Atenção à Saúde (Cas), Edifício Professor Doutor José Maria de Magalhães Neto – Iguatemi. Telefone: 3270-5730/5750.

CRLV (Centro de Referência Loreta Valadares) – Promove atenção à mulher em situação de violenta, com atendimento jurídico, psicológico e social. Endereço: Praça Almirante Coelho Neto, nº1 – Barris, em frente a Delegacia do Idoso. Telefone: 3235-4268.

Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher) – Em Salvador, são duas: uma em Brotas, outra em Periperi. São delegacias que recebem denúncias de violência contra a mulher, a partir da Lei Marinha da Penha.

Deam Brotas – Rua Padre José Filgueiras, s/n – Engenho Velho de Brotas. Telefone: 3116-7000.

Deam Periperi – Rua Doutor José de Almeida, Praça do Sol, s/n – Periperi. Telefone: 3117-8217.

Deati (Delegacia Especializada no Atendimento ao Idoso) – Responsável por apurar denúncias de violência contra pessoas idosas. Endereço: Rua do Salete, nº 19 – Barris. Telefone: 3117-6080.

Derca (Delegacia de Repressão a Crimes Contra a Criança e o Adolescente) Endereço: Rua Agripino Dórea, nº26 – Pitangueiras de Brotas. Telefone: 3116-2153.

Delegacias Territoriais – São as delegacias de cada Área Integrada de Segurança Pública. Segundo a Polícia Civil, os estupros que não são cometidos em contextos domésticos devem ser registrados nessas unidades. Em Salvador, existem 16 (http://www.policiacivil.ba.gov.br/capital.html).

Disque Denúncia – Serviços de denúncia que funcionam 24 horas por dia. No caso de crianças e adolescentes, o Departamento de Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos oferece o Disque 100. Já as mulheres são atendidas pelo Disque 180, da Secretaria de Políticas Para Mulheres da Presidência da República. Fundação Cidade Mãe – Órgão municipal, presta assistência a crianças em situação de risco. Endereço: Rua Prof. Aloísio de Carvalho – Engenho Velho de Brotas.

Gedem (Grupo de Atuação Especial em Defesa da Mulher do Ministério Público do Estado da Bahia) – Atua na proteção e na defesa dos direitos das mulheres em situação de violência doméstica, familiar e de gênero. Endereço: Avenida Joana Angélica, nº 1312, sala 309 – Nazaré. Telefone: 3103-6407/6406/6424.

Iperba (Instituto de Perinatologia da Bahia) – Maternidade localizada em Salvador que é referência no serviço de aborto legal no estado. Endereço: Rua Teixeira Barros, nº 72 – Brotas. Telefone: 3116-5215/5216.

Nudem (Núcleo Especializado na Defesa das Mulheres em Situação de Violência Doméstica e Familiar da Defensoria Pública do Estado) – Atendimento especializado para orientação jurídica, interposição e acompanhamento de medidas de proteção à mulher. Endereço: Rua Pedro Lessa, nº123 – Canela. Telefone: 3117-6935.

Secretaria Estadual de Políticas Para Mulheres Endereço: Alameda dos Eucaliptos, nº 137 – Caminho das Árvores. Telefone: 3117-2815/2816.

SPM (Superintendência Especial de Políticas para as Mulheres de Salvador) – Endereço: Avenida Sete de Setembro, Edifício Adolpho Basbaum, nº 202, 4º andar, Ladeira de São Bento. Telefone: 2108-7300.

Serviço Viver – Serviço de atenção a pessoas em situação de violência sexual. Oferece atendimento social, médico, psicológico e acompanhamento jurídico às vítimas de violência sexual e às famílias. Endereço: Avenida Centenário, s/n, térreo do prédio do Instituto Médico Legal (IML) Telefone: 3117-6700.

1ª Vara de Violência Doméstica e Familiar – Unidade judiciária especializada no julgamento dos processos envolvendo situações de violência doméstica e familiar contra a mulher, de acordo com a Lei Maria da Penha. Endereço: Rua Conselheiro Spínola, nº 77 – Barris. Telefone: 3328-1195/3329-5038.

*sob orientação do editor Donaldson Gomes