'Ele doou a vida para as filhas, e eles tiraram', diz amiga de empresário morto por PMs

Corpo de Márcio Perez, 41, foi velado em capela do Hospital Espanhol e será enterrado na Espanha

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  • Bruno Wendel

Publicado em 21 de setembro de 2018 às 14:59

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Bruno Wendel/CORREIO

O corpo do empresário Márcio Perez Santana, 41 anos, morto por policiais militares durante perseguição no bairro de Armação, foi velado no final da manhã desta sexta-feira (21) na capela do Hospital Espanhol, na Barra. Apesar da unidade médica estar fechada, a família de Márcio, que é de ascendência espanhola, conseguiu autorização para velar o corpo no local antes de ser transportado para o aeroporto, ainda nesta tarde. 

Após o velório, o corpo de Márcio seguirá para Espanha, onde vivem os pais. Lá, será sepultado. Amigos e parentes chegaram à capela do Hospital Espanhol por volta das 11h30 - meia hora antes da chegada do corpo. 

"Ele planejava ir morar na Espanha, com os pais, mas vivia no Brasil por amor às filhas. Ele doou a vida para as filhas, e eles [policiais] tiraram", declarou a comerciante Cláudia Oliveira, 31 anos, amiga da vítima.

A mãe dele chegou em Salvador às 8h30 desta sexta-feira (21) para tratar das questões do translado do corpo. O pai de Márcio ficou na Espanha por questões de saúde. 

Filho único e torcedor do Real Madrid, Márcio adorava jogar futebol. "Jogávamos no mesmo time do Clube Espanhol, em Salvador", declarou Roberto Presa, 48, marido de Cláudia e amigo de infância de Márcio. "Ele adorava futebol e a família. As paixões dele. Era um cara que a gente podia contar com tudo, sempre brincalhão, não era homem de discórdia, violência", completou Roberto. O casal falou da última vez que esteve com Márcio. "Foi no domingo. Jogamos bola no Espanhol e depois fomos lá pra casa e bebemos cerveja ", recordou Roberto."Ela era uma pessoa de nossa casa, fazia parte de nossas vidas. Não merecia o que fizeram com ele. A justiça será feita", emendou Cláudia.Em relação à circunstância da morte do empresário, amigos e parentes preferiram não falar sobre o assunto. "A família está tomando par dos detalhes agora e aguarda a investigação", pontuou Roberto.  

Colega de Márcio desde a universidade, o economista João Fortes, 43, estava bastante abalado e foi um dos presentes na cerimônia íntima. "Ele era um ótimo amigo, um ótimo pai, não fazia mal sequer a uma mosca. Conheço ele há 25 anos. Cursamos juntos Economia da Universidade Católica", declarou. 

Apuração  Um Inquérito Policial Militar (IPM) vai ser instaurado para apurar a situação. Segundo a Secretaria da Segurança Pública da Bahia (SSP-BA), dois policiais militares foram afastados das atividades após a morte do empresário. Imagens gravadas por testemunhas, logo após o carro parar no canteiro central, mostram ao menos seis PMs fardados levando Márcio do carro dele até uma viatura.

O CORREIO teve acesso a imagens que mostram os PMs retirando o empresário do carro, tentando reanimá-lo e levando para o posto de saúde do Marback; assista:

Por meio de nota, a SSP-BA informou que determinou, na quinta-feira (20), à tarde, que o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), da Polícia Civil, apure em conjunto com a Corregedoria da Polícia Militar a morte de Márcio.

“Vamos investigar com celeridade e esclarecer como o fato ocorreu”, afirmou o secretário da Segurança Pública, Maurício Teles Barbosa. Márcio deixa duas filhas (Foto: Reprodução) Ontem à noite, por volta de 18h, o carro do empresário continuava no canteiro central da Avenida Simon Bolívar.

Pela manhã, agentes do DHPP e policiais militares da 39ª CIPM (Boca do Rio) estavam reunidos no posto de combustível, defronte onde o carro foi parar depois dos disparos.

Um detalhe que chamou a atenção dos policiais da 39ª, responsáveis pela área, foi o fato de os tiros terem partido de policiais de uma CIPM de Cosme de Farias - a base da 58ª CIPM fica a cerca de nove quilômetros de distância do local dos tiros, fora da área de cobertura.

Um dos policiais do DHPP disse que esteve no local para colher provas para explicar de fato o que aconteceu, entre elas imagens das câmeras do posto, que funciona 24 horas. Funcionários do posto disseram não ter visto nada.

O delegado Líbio Braga, do DHPP, que esteve no local, disse que duas viaturas da PM participaram da perseguição ao carro conduzido pela vítima. Segundo o delegado, a PM solicitou perícia ao Departamento de Polícia Técnica (DPT).

“Foram coletadas imagens das câmeras do posto, mas não estão em boa qualidade. Mas acredito que serão coletadas também imagens da farmácia que fica ao lado do posto e de estabelecimentos que estão localizados no trajeto da perseguição”, disse.

A mulher que estava no carro de Márcio foi ouvida na Corregedoria da PM - onde chegou por volta das 8h30 de ontem. Ela chorava e estava acompanhada de um rapaz, sócio de Márcio. Eles não falaram com a imprensa. O depoimento dela durou pouco mais de quatro horas. 

Espanha Márcio Perez era formado em Economia e sócio de uma empresa que presta consultoria a uma operadora de telefonia. Ele tinha duas filhas - uma completou 9 anos no dia 18 e, por isso, uma festa de aniversário estava programada para esse domingo (23).

De acordo com vizinhos do empresário, ele morava no mesmo lugar - o 2º andar de uma casa na Rua Gáspar da Silva Cunha - há 40 anos. “Ele chegou [para morar na casa] com 1  ano de nascido e pretendia ir para Espanha, onde estão os pais. Ele era filho único”, disse uma vizinha, que não quis se identificar. Assim como outros moradores, ela disse que ouviu os tiros pouco depois das 23h.

Em relação à mulher que estava no banco de carona do carro, os vizinhos disseram que não a conheciam. “Nunca a vi com ele. Sabemos que ele tem uma ex-mulher e dois filhos. O parente mais próximo é um primo que morava aqui em Salvador”, disse outra vizinha.

Em entrevista à TV Bahia, a ex-mulher de Márcio, que não teve o nome divulgado, disse que ele pretendia levar as filhas para passar as férias na Espanha. Este final de semana, ele ficaria com as meninas: “Ele era um paizão, uma pessoa supertranquila. Foi a pior coisa que eu já fiz na minha vida, foi dar essa notícia pras minhas filhas”.