'Eles estavam esperando por ele’, diz tio de empresário morto por PMs

Familiar afirma que Márcio Perez recebeu três tiros em ação policial

  • Foto do(a) author(a) Jorge Gauthier
  • Jorge Gauthier

Publicado em 27 de setembro de 2018 às 11:48

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Evandro Veiga/CORREIO

"A polícia matou seu filho". Foi com essa frase, recebida através de uma ligação feita por uma vizinha, que a família do empresário do ramo de consultoria, Márcio Perez Santana, 41 anos, soube da Espanha o que havia acontecido no bairro de Armação, em circunstâncias ainda não esclarecidas na noite de quarta-feira (19). Ele estava chegando em casa e foi baleado na nuca ainda dentro do seu carro, um Fiat Palio (JNT-8918) branco.

A explicação foi dada pelo tio do empresário, o espanhol José Antonio Santana em entrevista ao jornal La Voz de Galicia e cedida ao CORREIO.  "A vizinha, que conhece Márcio desde pequeno e é como membro da família dele mandou uma mensagem pelo WhastApp para minha irmã (mãe de Márcio) de madrugada dizendo que era para ela ligar urgente para o Brasil. Foi quando ela disse a frase ‘a polícia matou seu filho’”, afirmou. O espanhol José Antonio Santana, tio de empresário morto durante perseguição policial no bairro de Armação (Foto: Oscar Vázquez/La Voz de Galicia) Já os policiais militares definem a ação que resultou na morte do empresário como um engano. A TV Bahia e o CORREIO tiveram acesso ao registro feito pelos militares após a perseguição policial, onde eles explicam o que aconteceu naquela noite. Segundo o documento, os PMs da 58ª Companhia Independente de PM (CIPM/Cosme de Farias) foram abordados por pessoas próximo ao antigo Centro de Convenções, por volta das 23h.

Elas contaram que homens em um carro branco, modelo Fiat Palio, estavam realizando assaltos na região. Os policiais teriam identificado um veículo suspeito alguns metros à frente e ligaram a sirene da viatura, pedindo que o motorista parasse.

Ao jornal espanhol, o tio de Márcio falou que não acredita nessa versão. "Isso é impossível, ele conhecia a Bahia e o Brasil dia e noite. Ele conhecia a cidade como a palma da mão. Eles [PMs] estavam esperando por ele e foi baleado 3 vezes”, afirmou. 

O tio destacou que "está mais do que claro que Márcio foi assassinado". Ele afirma que, segundo informações e vídeos aos quais a família teve acesso, ao ver o carro suspeito (a viatura dos policiais) Márcio pensou que seria agredido. “Mas ele foi baleado. Mesmo quando ele foi ferido em um braço, ele virou para a rua tentando se salvar. Mas eles deram mais dois  tiros, um deles no pescoço”, ressalta José. O tio do empresário destaca que o primeiro relatório da autópsia que a família recebeu falava apenas em um acidente de trânsito.  

"Os policiais falaram que ele havia morrido por causa de um acidente. Isso é inadmissível”, destaca o espanhol. Ele informou que somente após a ajuda do Consulado da Espanha que a família conseguiu buscar auxílios nas investigações. 

Outra coisa que chama a atenção de José Antônio é o fato de a mulher que estava no carro com Márcio ter saído sem ferimentos. “As marcas dos tiros no carro estão todas no lado esquerdo [do motorista], para onde ele estava indo. Os amigos viram várias marcas do lado dele e nenhuma marca de tiro do lado em que ela estava. Não sabemos nada sobre essa mulher”, afirma o tio. Contrário A versão dos policiais é diferente do relato das testemunhas. Segundo os moradores, Márcio estava estacionando o carro na porta de sua casa, na Rua Gáspar da Silva Cunha, quando a viatura se aproximou, com faróis e giroflex apagados. O empresário teria ficado com medo de ser assaltado e arrastou com o carro, sendo perseguido e baleado na nuca."Eles chegaram armados dizendo: 'Desce, desce'. Mas acho que Márcio não viu que eles eram policiais e tentou escapar e os caras começaram atirar", disse uma mulher, amiga da vítima.Os policiais da 58ª CIPM não explicaram no relato o que estavam fazendo próximo ao antigo Centro de Convenções -  a base da 58ª CIPM fica a nove quilômetros de distância do local dos tiros, fora da área de cobertura.  Márcio Perez era filho único e deixou duas filhas (Foto: Evandro Veiga/ CORREIO) Na segunda-feira (24), o advogado Alcindo Anunciação Júnior, que representa a família de Márcio, conversou com a TV Bahia e disse que a versão da mulher que estava com o empresário no momento do crime é a mesma das testemunhas que presenciaram a ação.

“A versão apresentada (pela mulher) é de que eles chegaram em casa, pararam o carro, e que um outro carro parou logo atrás, só com os faróis ligados, sem giroflex (sirene). Eles ouviram os gritos ‘sai, sai, sai’. Márcio Perez pensou que fosse uma ação de bandidos e saiu com o carro. Foi quando começaram os tiros”, contou o advogado.

Durante a perseguição, o carro de Márcio subiu o meio-fio e bateu em uma árvore. Foi nesse momento que a mulher percebeu que Márcio Perez estava baleado. O advogado disse que também teve acesso a versão apresentada pelos policiais e que as duas histórias estão sendo apuradas pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) e pela Corregedoria da PM. Movimentação na casa da vítima após o crime (Foto: Evandro Veiga/ CORREIO) Nesta segunda, o Ministério Público da Bahia (MPE-BA) designou dois promotores para acompanhar o caso. O assassinato de Márcio Perez ganhou as manchetes dos jornais espanhóis e o cônsul da Espanha no Brasil enviou uma carta para o governador Rui Costa cobrando empenho da polícia baiana para esclarecer o crime.

Dois policiais militares foram afastados das atividades, mas não tiveram os nomes divulgados. O corpo do empresário foi velado na capela do Hospital Espanhol na sexta-feira (21) e encaminhado para a Espanha, onde os pais dele moram. Márcio era filho único e deixa duas filhas.

Procurada, a Secretaria de Segurança Pública da Bahia (SSP-BA) segue sem comentar a investigação.