Empresário diz que Governo Federal cobrou propina por vacina contra covid

Revelação do representante da Davati Medical Supply, que tentava vender 400 milhões de doses da vacina Oxford/Astrazeneca, foi feita ao jornal Folha de S.Paulo

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  • Da Redação

Publicado em 29 de junho de 2021 às 20:54

- Atualizado há um ano

. Crédito: Reprodução

O representante de uma empresa vendedora de vacinas contra a covid-19 acusa o diretor do Departamento de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Dias, de cobrar propina para fechar negócio na compra de imunizantes pelo Governo Federal. A revelação foi divulgada na noite desta terça-feira (29), pelo jornal Folha de S.Paulo, que entrevistou o empresário Luiz Paulo Dominguetti Pereira. Ele se apresenta como representante da empresa Davati Medical Supply.   Segundo o vendedor, Roberto Dias cobrou propina em um jantar realizado no restaurante Vasto, no Brasília Shopping, no Centro de Brasília, no dia 25 de fevereiro. A empresa Davati buscou o Ministério da Saúde para negociar a venda 400 milhões de doses da vacina Oxford/Astrazeneca com uma proposta feita de US$ 3,5 por cada. Depois o valor passou a US$ 15,5.     Ainda de acordo com  Luiz Paulo Dominguetti, o diretor do Ministério da Saúde teria pedido propina de US$ 1 por dose em troca de fechar contrato com o Ministério da Saúde. No dia do encontro, em 25 de fevereiro, o valor de  US$ 1 fechou o dia equivalente a R$ 5,43.    O vendedor detalhou à Folha como foi a conversa com o representante do Governo Federal. "Eu falei que nós tínhamos a vacina, que a empresa era uma empresa forte, a Davati. E aí ele falou: 'Olha, para trabalhar dentro do ministério, tem que compor com o grupo'. E eu falei: 'Mas como compor com o grupo? Que composição que seria essa?'", disse  Luiz Paulo Dominguetti.  Diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Dias é acusado de cobrar proprina de US$ 1 dólar por dose de vacina para fechar negócio  No relato feito à Folha, o empresário diz que o diretor afirmou ser necessário aumentar o valor da vacina em benefício do 'grupo' do Ministério. Roberto Dias foi indicado ao cargo pelo líder do governo de Jair Bolsonaro na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR). Sua nomeação ocorreu em 8 de janeiro de 2019, na gestão do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta (DEM). Barros foi citado na última semana, na CPI da Covid, como o deputado que teria sido apontado por Bolsonaro como responsável por irregularidades no Ministério da Saúde. O deputado nega envolvimento. Barros foi ministro da Saúde na gestão Michel Temer.   "Aí ele me disse que não avançava dentro do ministério se a gente não composse com o grupo, que existe um grupo que só trabalhava dentro do ministério, se a gente conseguisse algo a mais tinha que majorar o valor da vacina, que a vacina teria que ter um valor diferente do que a proposta que a gente estava propondo", afirmou à Folha o representante da empresa.   O representante da empresa diz que negou fazer negócio, mas que o diretor insistiu: ​"A eu falei que não tinha como, não fazia, mesmo porque a vacina vinha lá de fora e que eles não faziam, não operavam daquela forma. Ele me disse: 'Pensa direitinho, se você quiser vender vacina no ministério tem que ser dessa forma".   Perguntado pela jornalista Constança Rezende, da Folha, como funcionava o esquema de propina, o vendedor detalhou que o valor seria sobre cada dose. "Acrescentar 1 dólar. E, olha, foi uma coisa estranha porque não estava só eu, estavam ele (Dias) e mais dois. Era um militar do Exército e um empresário lá de Brasília", disse.   O relato ainda cita a visita feita ao Ministério para negociação, no dia seguinte ao jantar. O vendedor diz que foi mais uma vez procurado para fazer negócio com propina.   "Aí eu cheguei no ministério para encontrar com ele (Dias), ele me pediu as documentações. Eu disse para ele que teriam que colocar uma proposta de compra do ministério para enviar as documentações, as certificações da vacina, mas que algumas documentações da vacina eu conseguiria adiantar. Aí ele me disse: 'Fica numa sala ali'. E me colocou numa sala do lado ali. Ele me falou que tinha uma reunião. Disso, eu recebi uma ligação perguntando se ia ter o acerto. Aí eu falei que não, que não tinha como. Isso, dentro do ministério. Aí me chamaram, disseram que ia entrar em contato com a Davati para tentar fazer a vacina e depois nunca mais. Aí depois nós tentamos por outras vias, tentamos conversar com o Élcio Franco, explicamos para ele a situação também, não adiantou nada. Ninguém queria vacina", afirmou.   No período citado dos encontros, o Brasil havia atingido a marca de 250 mil mortos por covid. Questionado pela reportagem sobre quem seriam os integrantes do grupo citado por Roberto Dias, o vendedor afirmou desconhecer. "Não sei. Não sei quem que eram os personagens. Quando ele começou com essa conversa, eu já não dei mais seguimento porque eu já sabia que o trem não era bom".

Segundo a Folha, após publicação da denúncia, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga decidiu tirar Roberto Dias do cargo. A previsão é que ele seja exonerado nesta quarta-feira (29), em publicação no Diário Oficial da União.

Em uma rede social nesta terça, o deputado Ricardo Barros negou ter indicado Dias ao posto. “Em relação à matéria da Folha, reitero que Roberto Ferreira Dias teve sua nomeação no Ministério da Saúde no início da atual gestão presidencial, em 2019, quando não estava alinhado ao governo. Assim, repito, não é minha indicação. Desconheço totalmente a denúncia da Davati.”