Entrevista: advogada, escritora e feminista, Ruth Manus, 28, é nova colunista do CORREIO

Escritora tem mais de 140 mil seguidores nas redes sociais e bate forte em assuntos como o machismo nosso de cada dia

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  • Victor Villarpando

Publicado em 7 de março de 2017 às 09:41

- Atualizado há um ano

Ruth Manus, fenômeno da internet, é nova colunista do BAZAR/CORREIO (Foto: Divulgação)Ruth Manus, nova colunista do BAZAR/CORREIO, é como uma amiga que fala bem. Não é aquela que fala bonito ou difícil, como se esperaria de uma doutoranda em Direito Internacional na Universidade Clássica de Lisboa: ela fala bem. Com argumento, ponderação e sem perder a ternura. É feminista que bate forte no machismo nosso de cada dia. Mas dificilmente seria chamada de feminazi por algum troll na internet.

Advogada e professora universitária, a paulistana, 28 anos, assina um blog no Estadão desde 2014 e conta com mais de 140 mil seguidores nas redes sociais. Cerca de dois anos depois, ela ganhou uma coluna dominical no jornal paulista.Trecho de uma das colunas de Ruth no Estadão“Ruth foi uma das grandes descobertas dos últimos anos. O sucesso foi imediato, o mercado editorial estava precisando. Por diversas vezes, os textos dela foram a maior audiência do site do Estadão”, afirma Roberto Gazzi, diretor-executivo do CORREIO, que coordenou a reforma digital do veículo paulista. A repercussão do que ela escreveu foi tanta que teve até uma “Retrospectiva Ruth Manus” no fim do ano.Com a rapper Preta-Rara, a coach Thaís Amadei e a criadora do Instituto a Nossa Jornada, Renata Quintella: no TEDxSãoPaulo (Fotos: Reprodução/Instagram)Legítima millenial ou filha da Geração Y (pessoas nascidas entre 1980 e meados da década de 1990), ela é universal na linha (Leon) Tolstoi: pintando a própria aldeia. Olha os títulos de alguns textos: “A geração que encontrou o sucesso no pedido de demissão”, “Roupa de marca ou passagem aérea?”, “Somos todas vadias”, “Miga, sua loca”, “Carta aos pais de um filho gay” e “O quanto o machismo também reprime os homens”.

Formada em Direito na PUC-SP, Ruth fez pós-graduação em Direito Coletivo do Trabalho, na Università di Roma Tor Vergata (Itália) e em Direito Europeu na Universidade Clássica de Lisboa. Desde os 22, é professora universitária e já passou por instituições como a PUC, Faculdade Cantareira, Unimep e Escola Paulista de Direito. Vive em Portugal, onde cursa o doutorado.

Confira a entrevista com Ruth:

Pergunta: Como você classifica os textos que escreve? Quem é Ruth Manus?

Ruth Manus: Eu prometi para mim mesma que um dia ainda vou cursar uma pós-gradução em escrita criativa com duração de um ano que há em Lisboa. Lá, poderei aprender a escrever crônicas, contos, artigos, poesias, poemas e tudo mais, com mais técnica e conhecimento. Enquanto isso não acontece, limito-me a dizer que escrevo textos. Textos que escrevo com todo zelo e a melhor das intenções, mas ainda não me sinto à vontade para rotulá-los de uma forma ou de outra. Quanto a mim, sou uma pessoa totalmente normal, que trabalha duro, às vezes acerta e às vezes não. Vamos tentando né?Com o ator e escritor Gregório Duvivier: amigos cheios de purpurinaP: Em diversos textos, você fala de “nossa geração”. Pra quem você escreve? Acha que se encaixa na frase do russo Tolstoi: “Se queres ser universal começa por pintar a tua aldeia”?

RM: Geração é uma palavra muito difícil de substituir. Já tentei, sem sucesso, buscar sinônimos para ela, tentando não repetí-la em outros títulos. É muito engraçado como escrevo sobre a "minha geração" (tenho 28 anos) e vejo os textos sendo compartilhados por pessoas de 16 e de 50 e tantos anos. Isso do me faz achar ainda mais que preciso de uma nova palavra para tentar designar essas nossas angústias... enquanto não a encontro, fica geração mesmo. A frase do Tolstoi é perfeita. O meu desafio diário é tentar ampliar cada vez mais a amplitude dessa "minha aldeia".

P: O texto é o alívio de sua reflexão ou depois que você dá à luz ainda fica encucada? Quem/O que te deixa reflexiva? E quem/o que te deixa alegre?

RM: Eu penso demais. Até me canso de viver dentro dessa minha cabeça tão agitada. (risos) Sempre foi assim, mas a necessidade de escrever muito potencializa tudo isso. Quando escrevo um texto, fico refletindo antes, durante e depois (até anos depois, confesso). Mas acho que isso é um bom sinal. Mau sinal seria ficar com as ideias congeladas. E ideias são coisas que me alegram. Novas ideias, mudar de ideia, velhas ideias resgatadas... uma das coisas das quais mais gosto na vida é conversar com gente que divide ideias. Conversas longas sobre tudo: relacionamentos, política, medos, comida, viagem, história. É essa troca de ideias que alimenta a caneta.Ruth e o marido na comemoração de 3 anos de namoro/casamentoP: Costuma ler os comentários/repercussão do que escreve?

RM: Leio pouco. É uma questão de autopreservação. Leio e respondo todos os e-mails que recebo e uma parte do que recebo na minha página de Facebook. Fora isso, não leio, senão a gente fica maluco. Sou sensível e aprendi a não ir além do que aguento.

P: Numa entrevista à época do lançamento de Pega Lá uma Chave de Fenda e Outras Divagações Sobre o Amor você disse que pediu à editora “um produto que homens pudessem ler no metrô sem vergonha”. Por que o pedido?

RM: Eu tenho consciência de que meu público é preponderantemente feminino. Ocorre que, cada vez mais, eu percebo que há um público masculino gigantesco extremamente carente de uma literatura sensível. E eu fico contente quando percebo que abarco os homens também com o meu trabalho. Como eu sei que parte do mercado editorial ainda gosta de trabalhar com materiais com gênero bastante determinado, pedi que não fizessem meu livro com uma capa cor de rosa ou lilás. Pedi um livro absolutamente neutro, embora eu passe longe da ideia de que o azul é exclusivamente masculino e o cor de rosa feminino. Eu apenas não queria que a capa do meu livro afastasse os homens do meu trabalho e acho que deu certo.Trecho de uma das colunas de Ruth no EstadãoP: Gostou da experiência com o livro? Pretende fazer outros? E poemas? (lí que você gosta de rimas...)

RM: Amei. Já tem coisa no forno. E por mim, escreveria livros sem parar... No momento estou organizando uma coletânea de textos já publicados misturados com alguns inéditos. Também estou escrevendo um livro de Direito do Trabalho e um livro em Portugal, sobre as qualidades da vida portuguesa (além da tese de doutorado, de Direito Internacional do Trabalho...). Muito trabalho, mas muito trabalho que me alegra e me realiza. Quanto a vlog ou coisas do gênero, eu não descarto. Gosto de falar tanto quanto gosto de escrever e acho que não tenho grandes problemas com vídeo... Mas por enquanto as prioridades são outras. Esse ano eu ainda vou casar e me mudar (se Deus quiser hahaha), além da escrita, do escritório, da docência e do doutorado. Se eu não me policiar, fico maluca. Mas quem sabe um dia...

P: O que é a vida pra você? Como se imagina daqui a 5 anos?

RM: Vivo minha vida buscando apenas seguir feliz, cercada por aqueles que amo, e fazendo coisas que contribuam um pouquinho pro mundo. Em doses homeopáticas, tem funcionado. Não sou de fazer grandes projeções para o futuro, faço um grande esforço para viver praticamente apenas no presente, já que sou uma pessoa ansiosa e sei do desgaste que isso me causa. O que sei é que quero seguir escrevendo, advogando, lecionando, construindo minha família e vivendo com equilíbrio (e se Deus quiser em 5 anos já terei terminado meu doutorado! (risos))Trecho de uma das colunas de Ruth no EstadãoP: Sobre o que gostaria de escrever, mas ainda não bateu inspiração? E arrependimento de algo publicado, já rolou?

RM: Quero escrever um romance. Na verdade dois. As histórias já estão na cabeça, mas ainda não é a hora. Preciso amadurecer na escrita antes de fazer isso. Quanto a arrependimento por algo que tenha escrito, por sorte não tenho. Há textos mais velhos que eu não escreveria hoje, ou escreveria de forma diferente. Mas olho para eles sem angústia. É como tatuagem (eu tenho 9): há algumas que eu tenho, mas que não faria hoje. E isso não me faz querer apagá-las. Gosto delas, fazem parte da minha história, ainda que sejam fruto de um outro momento.

P: Já veio alguma vez a Bahia?

RM: Sim, sou completamente apaixonada pela Bahia. Fiz viagens muito turísticas, mas deliciosamente inevitáveis. Ilhéus, Trancoso, Porto Seguro, Arraial, Caraíva, Praia do Espelho... Mas tenho muita vontade de descobrir a Bahia menos turística (estou aberta a sugestões e convites (risos)). E preciso voltar urgentemente a Salvador, pois passei mal na única vez em que estive lá (aí?) e não pude aproveitar a cidade como se deve... Sou alérgica a frutos do mar, por isso meu coração fica partido na Bahia. Mas a carne de sol e os doces baianos, compensam minha tristeza por não poder aproveitar o resto.