'Equilíbrio delicado': além dos portugueses, exército brasileiro enfrentou conflitos internos

Historiador Sérgio Guerra explica ao CORREIO sobre os movimentos populares

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  • Alexandre Lyrio

Publicado em 2 de julho de 2017 às 10:52

- Atualizado há um ano

Para expulsar definitivamente os portugueses da Bahia, em julho de 1822, foi preciso muita rebeldia por parte dos baianos. Mas, em alguns momentos, essa rebeldia se deu internamente. Com uma tropa formada por todo o tipo de gente – desde grandes proprietários de terra a escravos, escravos libertos, indígenas, vaqueiros, capoeiritas, etc – havia diferentes demandas de cada grupo.

O exército brasileiro era tão diverso e rebelde que isso se tornou um problema em alguns momentos. Nesta entrevista, o historiador Sérgio Guerra revela como se davam os conflitos internos, movimentos populares e os atos de insubordinação de nossos soldados pobres em relação às lideranças, formada por brancos da elite açucareira. E tudo isso aconteceu durante as batalhas pela independência. 

Como a nossa tropa se formou?No momento em que os portugueses ficam em Salvador para tentar retomar as rédeas da colônia, os que se consideram baianos e brasileiros deixam a cidade e se agrupam em locais como Cachoeira e outras vilas do Recôncavo. Ocorre uma espécie de êxodo. O nosso exército foi a reunião de algumas tropas que já existiam, de primeira e segunda linha com algumas tropas arregimentadas por lideranças locais nas diversas vilas.  Quando começaram as hostilidades portuguesas em Salvador, as pessoas que tinham relações familiares, propriedades e queriam voluntariamente se agregar ao exército rumaram para as vilas do Recôncavo. Além disso, houve também tropas vindas de outras províncias, essas trazidas pelo General Labatut.

Como essa tropa funcionava internamente?Essa tropa tentou imprimir uma percepção sobre os conflitos e de alguma forma visavam uma independência mais radical no sentido da ampliação de melhorias de certas condições, né?  De salários, de algumas liberdades civis. Por conta disso soldados se rebelaram durante a guerra por discordarem de certos encaminhamentos dos seus superiores. Enquanto havia o conflito contra os portugueses houve muitos episódios de insubordinação.

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Por exemplo?As vezes os soldados prendiam portugueses que eram considerados amigos da causa. Isso criava um conflito porque as autoridades não queriam que qualquer português fosse preso, porque alguns deles tinham seus patrimônios e suas relações familiares com outros brasileiros. Eu costumo dizer que esse processo era um equilíbrio delicado.

Mas o sentimento antilusitano prevaleceu, né?Prevaleceu, mas ele não era visto e sentido da mesma forma pelas autoridades, que tinham muita simpatia com o capital português e muitas relações de família e negócios. Já o povo em geral não gostava da ideia de que os portugueses deveriam permanecer no Brasil porque eles acreditavam que isso implicava numa disputa de mercado de trabalho desigual. Ou seja, os portugueses ocupariam espaços que deveriam ser dos brasileiros depois da independência. Isso criou os movimentos conhecidos como mata marotos. Eram movimentos de caráter popular que foram rigorosamente combatidos pelas autoridades.

Os portugueses, enfim, foram expulsos em sua totalidade?As tropas saíram. Muitos portugueses que não faziam parte do exército também saíram. Mas muitos ficaram também. Muitos saíram e depois voltaram. Mas no decorrer dos anos a imigração portuguesa continuou.